A controversa mega-hidrelétrica de Belo Monte, no Pará, causou danos socioambientais significativos ao Rio Xingu e aos povos indígenas e tradicionais que viviam às suas margens. Agora, parece que a hidrelétrica pode não ser capaz de produzir a quantidade total de eletricidade prometida por seus idealizadores – uma situação para a qual os críticos há muito tempo alertavam.
Os engenheiros parecem ter se equivocado seriamente ao estimar as taxas de vazão do Rio Xingu e as variações entre as estações seca e chuvosa, além de não contarem com a redução da vazão devido ao desmatamento causado pela rápida expansão das fazendas de gado e das plantações de soja em Mato Grosso, onde fica a nascente do rio.
As secas induzidas pelas mudanças climáticas também estão diminuindo a vazão do Rio Xingu e sua capacidade de geração de energia. Em 2013, um importante relatório do Painel de Mudanças Climáticas alertou que o aquecimento global pode reduzir os níveis d’água em toda a Bacia Amazônica, colocando a energia hidrelétrica em sério risco.
À medida que o desmatamento decorrente do agronegócio e da mineração se espalha pela bacia, agora estimulado pelas políticas desenvolvimentistas do presidente Jair Bolsonaro, o futuro das hidrelétricas da Amazônia, sua capacidade de geração de energia e potencial de investimento parecem cada vez mais desanimadores.
Tecnicamente, as turbinas da Usina Hidrelétrica de Belo Monte podem produzir 11.233 MW de energia por mês – isso se não existisse essa entidade orgânica chamada rio, com seus próprios ritmos sazonais, enchendo, esvaziando, espalhando-se. Acrescente-se ainda a redução da vazão do Rio Xingu devido ao desmatamento e à seca e temos um projeto que tem tudo para se tornar o maior elefante branco da Amazônia brasileira. Inaugurada em 2016 no Pará, Belo Monte deveria operar num nível em que geraria 4.571 MW por mês ao longo de 12 meses. Isto é o que se chama de “energia firme”, uma aproximação da eletricidade que de fato é produzida (diferentemente da potência instalada). Mas hoje até essa quantidade parece alta.
Em 2019, a vazão do Xingu caiu drasticamente durante a estação seca, de julho a novembro, e mesmo com apenas uma turbina parada entre as 18 existentes, a hidrelétrica produziu uma média mensal de apenas 568 MW em agosto, 361 MW em setembro, 276 MW em outubro e 583 MW em novembro, de acordo com as autoridades. A Norte Energia, operadora da hidrelétrica, foi obrigada a desligar as turbinas várias vezes para impedir que fossem danificadas.
Mas mesmo na estação das cheias, a hidrelétrica nunca chegou perto de produzir os 11.233 MW mensais de sua capacidade instalada, que o press release da Norte Energia alardeia aos investidores. O valor mais alto no ano passado foi de 6.882 MW, produzidos em fevereiro.
Apesar de todas as promessas de eficiência hidrelétrica apresentadas durante o planejamento e construção da hidrelétrica, entre 2011 e 2016, Belo Monte tem se mostrado o exato oposto da eficácia – um projeto que não só causou imensos prejuízos socioambientais, mas que agora parece também incapaz de gerar lucro. Atualmente, alguns moradores locais não a chamam mais de Belo Monte, mas de Belo Monstro.
Termoelétricas poluentes para compensar Belo Monte
Tanto foi assim que, em 11 de outubro, a Norte Energia enviou uma carta oficial ao governo federal pedindo, paradoxalmente, permissão para produzir ainda menos energia.
Na carta, a companhia declara sua própria “emergência hídrica”, dizendo que os níveis em um reservatório tinham caído tanto que a base de terra e argila de uma das barragens ficaria exposta à erosão causada pelas ondas e, portanto, sujeita a “danos estruturais”. Para evitar esse problema, a Norte Energia disse que precisava reduzir ainda mais a vazão das águas vindas da barragem a montante, Xingu acima.
A imprensa reagiu rapidamente com críticas à incapacidade da Norte Energia de planejar a operação de uma hidrelétrica na qual R$ 40 bilhões foram investidos – em grande parte financiados pelos contribuintes por meio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Em novembro, a Norte Energia pediu formalmente à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) autorização para construir usinas termelétricas ao longo das barragens de Belo Monte – usinas que provavelmente usariam combustíveis fósseis. A empresa negou que estivesse tentando compensar a baixa produção de energia do projeto hidrelétrico, como a imprensa inferiu, afirmando apenas que as companhias de eletricidade costumam diversificar seus portfólios.
Se autorizada a construir essas termelétricas, a Norte Energia poderia fazer melhor uso das duas linhas de transmissão que levam energia ao Rio de Janeiro e a Minas Gerais, construídas pela companhia chinesa State Grid ao custo de R$ 15 bilhões. Em razão das grandes variações sazonais do Rio Xingu, essa linhas permanecem subaproveitadas durante cinco meses do ano.
Construir Belo Monte foi mais lucrativo do que fazê-la funcionar
Especialistas hoje atribuem a surpreendente ineficiência de Belo Monte a uma série de fatores, entre eles o mau planejamento, a localização equivocada em um rio que varia sazonalmente, o aumento dramático do desmatamento na região (que está reduzindo o nível das águas do Rio Xingu) e, por fim, as mudanças climáticas globais, que aumentam os períodos de seca. Todos esses fatores foram reconhecidos tanto pelos opositores da hidrelétrica quanto por analistas de negócios durante os estágios de planejamento.
Além disso, análises de várias fontes diferentes avaliaram que a controversa Belo Monte nunca produziria a quantidade de eletricidade prevista, nem jamais seria economicamente viável – previsões ignoradas pela Norte Energia, pelo governo e pelo BNDES.
Então, por que a companhia deu continuidade ao megaprojeto de R$ 40 bilhões? A resposta é simples: o lucro gigantesco resultante dos dólares dos contribuintes durante a construção.
“Acho que o que motivou foi basicamente a imensa quantidade de dinheiro que flui nesses projetos na fase de construção”, diz Brent Millikan, da ONG ambiental International Rivers. “Havia grandes empreiteiras e interesses políticos ligados a elas através de redes de favorecimentos, esquemas de propina e assim por diante, que se organizaram para ganhar imensas quantias de dinheiro com isso [a construção]. Acho que parte da prova disso é que todas essas grandes empreiteiras se afastaram dos investidores [de geração de energia] de Belo Monte.”
Empresas menores como a Queiroz Galvão e a Galvão Engenharia, por exemplo, investiram originalmente em menor escala na companhia de eletricidade Norte Energia, mas depois retiraram seu dinheiro, preferindo investir no Consórcio de Construção de Belo Monte (CCBM).
Enquanto isso, algumas das maiores construtoras do Brasil, incluindo a Odebrecht e a Camargo Corrêa, nunca se juntaram à Norte Energia e preferiram investir seu dinheiro apenas no consórcio de construção de Belo Monte. Através de suas ações, essas firmas se protegeram do risco especulativo que a companhia elétrica representava, enquanto lucravam com o grande afluxo de capital de construção do BNDES, que teve pouca fiscalização pública.
Como resultado, apenas investimentos de entidades do setor público – vindos de fundos de pensão e da estatal Eletrobras – foram para a Norte Energia. E são exatamente essas entidades públicas que podem ficar de mãos vazias se Belo Monte nunca produzir uma quantidade significativa de energia.
Foi dessa forma que os sócios do consórcio de construção de Belo Monte lucraram absurdamente. Mas a Norte Energia, a companhia elétrica responsável pela operação, está com problemas cada vez maiores. Hoje, deve R$ 25,4 milhões ao BNDES.
A Norte Energia não respondeu aos pedidos para comentar esta reportagem.
Desmatamento põe em risco projetos hidrelétricos na Amazônia
O pedido de licenciamento de termelétricas da Norte Energia, que compensaria a falta de capacidade de gerar energia hidrelétrica, não é apenas uma tendência local. Nesta simples ação, pode estar escrito o destino de hidrelétricas em toda a Amazônia, dado que o desmatamento provocado pela pecuária e pelo cultivo de soja vem aumentando dramaticamente, e ainda somado às alterações climáticas no planeta – ambos, juntos, reduzem as chuvas na Amazônia e, como consequência, fazem o nível dos rios baixar.
“O problema é que não há água suficiente no Rio Xingu”, diz Millikan, algo que acontece também com outros cursos d’água da Bacia Amazônica. O Xingu “é um rio sazonal. Já sabíamos disso a partir de dados históricos, e a tendência é que só piore.”
O problema está se agravando por dois motivos: “Número um: há um [grande] desmatamento na bacia do Rio Xingu, e isso está afetando [negativamente] a hidrologia da mesma.” A desflorestação na área cresceu 81% de 2018 para 2019.
“Número dois: as mudanças climáticas, tanto regionais quanto globais, estão reduzindo as chuvas”, diz Millikan. “Temos, portanto, menos água e menos capacidade de capturar água na bacia e liberá-la na estação chuvosa. Como resultado, eles são obrigados a desligar as turbinas completamente por vários meses do ano.” Na bacia, a queima da vegetação e a emissão de gases de efeito estufa na atmosfera estão se combinando para secar a Floresta Amazônica, levando a um agravamento da estiagem, de acordo com um estudo da Nasa.
André Oliveira Sawakuchi, professor do Instituto de Geociências da Universidade de São Paulo, concorda que o desmatamento, causado especialmente pelo agronegócio, está tornando a energia hidrelétrica na Amazônia inviável. “A expansão do gado e da soja no sudeste da Amazônia é a maior inimiga de Belo Monte nas décadas que virão”, diz ele.
Mas nenhum desses efeitos deve ser uma surpresa para a Norte Energia, o BNDES ou o governo brasileiro, segundo Millikan e Sawakuchi. Desde 9 de setembro de 2013, o importante Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas divulgou um relatório alertando que o aquecimento global poderia baixar o nível das águas na Amazônia, colocando em risco a geração de energia hidrelétrica.
Origens imediatas da “emergência hídrica”
Além do problema da queda do nível das águas, a “emergência hídrica” declarada pela Norte Energia aponta para deficiências escondidas na construção de Belo Monte.
De acordo com a carta enviada à Agência Nacional das Águas (ANA) pelo diretor-presidente da Norte Energia, Paulo Roberto Ribeiro Pinto, a estiagem de outubro de 2019 baixou tanto o nível em um dos dois reservatórios de Belo Monte, o Reservatório Xingu, que causou risco de danos estruturais à barragem de Pimental. Segundo ele, ventos fortes no reservatório poderiam criar ondas que erodiriam a base da barragem, feita de terra e argila, sem reforço de rochas.
A situação era tão grave, segundo a companhia, que ela também pediu ao Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) para desobrigá-la temporariamente de seu compromisso de fornecer energia para os consumidores brasileiros.
Millikan especula que o prejuízo econômico que a Norte Energia terá quando não for capaz de cumprir os acordos de geração de energia com a Aneel explica o motivo pelo qual a companhia quer construir usinas termelétricas próximas a Belo Monte. “Acho que essa coisa da emergência financeira é o seguinte: ‘Ah, vamos construir algumas usinas termelétricas e isso nos salvará’”, diz Millikan. Se a Norte Energia não conseguir fornecer energia suficiente, seu contrato com o governo diz que ela deve comprar eletricidade no mercado para compensar a diferença, o que é caro. As usinas termelétricas poderiam ajudar a reduzir esses prejuízos.
Em 8 de novembro, a jornalista Eliane Brum escreveu no El País sobre a declaração de emergência da Norte Energia, dizendo que ela revelava um erro na construção da hidrelétrica. No mesmo dia, a Norte Energia respondeu que não havia erro nem risco à estrutura da barragem, embora sua própria carta dissesse que ondas provocadas por ventos fortes poderiam causar “danos estruturais”.
O problema fundamental que levou à “emergência hídrica” de outubro é que a Norte Energia precisa de um total de 1.000 metros cúbicos por segundo (m3/s) de vazão no Rio Xingu para cumprir com as exigências do governo, fornecendo água suficiente para os reservatórios e para a Volta Grande – uma curva imensa no Xingu deixada de lado pelo projeto de Belo Monte, com a margem povoada por pescadores que dependem dessa curva em formato de ferradura para subsistir por meio da pesca.
Mas devido à seca de 2019 e ao desmatamento dos últimos anos, “o rio não foi capaz de fornecer 300 m3/s para o reservatório intermediário e os [obrigatórios] 700 m3/s para a Volta Grande”, explica o professor Sawakuchi.
Com a vazão do Rio Xingu caindo para apenas 750 m3/s, a companhia redigiu sua carta de emergência e reduziu para 100 m3/s a vazão no canal que conecta o Reservatório do Xingu ao reservatório intermediário, numa tentativa de evitar o risco de “danos estruturais” à barragem.
Ao fazer isso, a companhia também escolheu fornecer de modo aproximado a vazão exigida para cumprir suas obrigações com a Volta Grande, uma quantidade que a companhia e o governo determinaram como o mínimo para garantir a vida e a navegabilidade (embora moradores locais digam que até isso é insuficiente).
Norte Energia contesta vazão necessária em reservatório
Críticos argumentam que a decisão da Norte Energia quanto à estiagem de outubro é um risco para o meio ambiente. Acordos prévios com o Ibama estabeleciam que pelo menos 300 m3/s deveriam ser mantidos no reservatório intermediário para evitar prejudicar a qualidade da água. Mas a Norte Energia contratou a EnvEx Engenharia para aplicar modelos matemáticos e concluiu que com até 100 m3/s – o nível drasticamente baixo estabelecido em outubro – não haveria prejuízo na qualidade da água.
Sawakuchi questiona esse argumento: “Pode haver problemas com os modelos matemáticos” diante das amostras de qualidade da água da vida real. Quando a vazão d’água fica tão baixa, algas podem proliferar no ambiente, impactando o sistema todo, argumenta o professor da USP.
O problema não é apenas teórico e local. Sawakuchi alerta que um declínio na qualidade da água no reservatório intermediário não ficaria apenas lá, mas poderia se estender ao Rio Xingu, atingindo a Volta Grande, onde os povos indígenas Juruna e Arara bebem água, tomam banho e pescam. A carta da Norte Energia prometia fazer testes de qualidade da água três vezes por dia para tratar essa “situação excepcional”.
“A expansão da soja e das pastagens é inimiga de Belo Monte”
A notícia ruim: outubro de 2019 não será uma exceção. “Estudos preveem que nos próximos 30 anos, a água da bacia do Xingu diminuirá em 20% a 30%”, diz Sawakuchi. “Alguns estudos até preveem uma redução de mais de 40% na água da bacia em 50 anos”, trazendo resultados ainda piores para o Rio Xingu e Belo Monte.
O professor – que investiga as interações entre as mudanças climáticas e os sistemas fluviais – aponta que, quando a indústria e o governo formularam a regra original da vazão, “consideraram a quantidade de água nos últimos 60 ou 70 anos. Mas agora isso está mudando”. E é provável que continue mudando no futuro.
Ele conclui que o aumento do desmatamento e as mudanças climáticas farão com que a “empresa tenha de modificar sua forma de operar a hidrelétrica” para atender às exigências de vazão mínima para gerar eletricidade, protegendo a integridade estrutural enquanto atende às necessidades da Volta Grande. A redução da vazão no Xingu, dividida entre Belo Monte e a Volta Grande, pode ser um desastre ambiental iminente.
Sawakuchi explica ainda que o Rio Xingu e seus afluentes têm suas nascentes em Mato Grosso e dependem da cobertura florestal para ter uma vazão confiável. Mas a maior parte da Floresta Amazônica e do Cerrado de Mato Grosso teve sua vegetação original transformada em plantações de soja sedentas por água.
As florestas da Amazônia, com sua alta umidade, ajudam a gerar chuva e reabastecem localmente a bacia do Xingu. “Quando há mais chuva, a vazão nos rios é mais regular ao longo do ano. Quando há menos chuva, isso torna o nível dos rios mais variável”, acrescenta Sawakuchi. Simplificando, o efeito da seca provocada pelas vastas plantações de soja a montante dificulta a operação de uma hidrelétrica a jusante, que promete gerar energia a partir de níveis constantemente altos.
Com a esperada expansão da agropecuária, isso “intensifica e concentra a chuva em algumas épocas do ano, mas, ao todo, reduz a chuva ao longo do ano.” No geral, “o agronegócio e a criação de gado no Mato Grosso tiram água de todos os afluentes”, secando o sistema do rio antes mesmo que ele alcance a bacia do Baixo Xingu, de forma que a água não chega à hidrelétrica de Belo Monte, explica Sawakuchi. “A expansão da soja e das pastagens significa menos água na bacia do Alto Xingu. A expansão da soja e das pastagens é inimiga de Belo Monte.”
Mais projetos de usinas, menos água chegando
Belo Monte muito provavelmente não será a última grande hidrelétrica brasileira. O governo está planejando mais usinas nos rios Tapajós, Trombetas e em outros da Bacia Amazônica.
Esses projetos ignoram os alertas de cientistas, inclusive de Carlos Nobre e Tom Lovejoy, que, em dezembro de 2019, declararam que o ponto de inflexão da Amazônia, que passaria de floresta tropical a savana degradada, “é aqui e agora”. Se esses pesquisadores estiverem corretos, as perspectivas para as chuvas na Amazônia, as vazões fluviais e as hidrelétricas existentes e futuras serão cada vez mais desanimadoras.
Sawakuchi coloca em dúvida a viabilidade dos projetos de usinas na Amazônia: “As companhias hidrelétricas sempre esperam produzir o máximo de energia na estação das chuvas, de janeiro até julho”, diz ele. “Mas elas terão menos água em julho”, à medida que as mudanças climáticas se intensificarem e a estação chuvosa diminuir. “Isso não está sendo calculado.” O governo federal, por sua vez, coloca mais projetos de hidrelétricas na Amazônia na fila.
“Isso pode intensificar os conflitos por água”, diz ele, uma vez que ribeirinhos, povos tradicionais e indígenas competem pela vazão cada vez menor de água com hidrelétricas novas e antigas, indústrias de mineração, agronegócio e cidades com necessidade de água potável.
Olhando especificamente para Belo Monte, Sawakuchi diz, “80% a 90% da água do Rio Xingu será usada para produzir energia”. E quem vai sofrer é a população e os animais aquáticos da Volta Grande.
Um futuro sem água na Amazônia
Em 27 de novembro, o presidente Jair Bolsonaro, com muita pompa e cobertura midiática, inaugurou uma placa quando a 18ª e última turbina de Belo Monte entrou em operação. O evento também marcou a redução da vazão da Norte Energia para a Volta Grande, provavelmente com impactos imensos sobre os peixes e a segurança alimentar local. É um regime de vazão ainda mais baixo do que o inicialmente negociado entre a companhia e o governo. Moradores locais vêm lutando há anos para impedir que esse novo regime mais baixo entre em vigor na Volta Grande.
“As coisas já estão muito ruins, mas vão piorar”, prevê Millikan.
Se a Norte Energia conseguir aprovar a construção de usinas termelétricas ao lado de suas barragens, bem como ao lado da mina Belo Sun – a maior mina de ouro a céu aberto do mundo, projetada por uma companhia canadense –, então os níveis de água que sustentam a vida na Volta Grande, que a Norte Energia prometeu manter, provavelmente serão reduzidos a um gotejar.
E se o Brasil continuar adotando políticas como estas, implementadas para alimentar Belo Monte enquanto esvazia o Rio Xingu, então não é difícil prever quem serão os futuros perdedores: “Até agora, foram sempre as companhias hidrelétricas que ganharam. Não as pessoas”, diz Sawakuchi.
Imagem do banner: O barragem principal de Belo Monte, em 27 de dezembro de 2019. Cada tubo que desce marca uma das 18 turbinas que produzem eletricidade. Foto: Palácio do Planalto / CC BY
Atualização: A Norte Energia, empresa responsável pela operação de Belo Monte, respondeu a esta matéria com um email enviado à Mongabay em 28/02/2020. Os documentos anexados ao email com os esclarecimentos e comentários da empresa podem ser lidos aqui e aqui.