Jochen Flasbarth, Secretário de Estado do Ministério Federal para a Cooperação Econômica e Desenvolvimento da Alemanha, conversou com a Mongabay sobre novas cooperações com o governo brasileiro.
Segundo ele, a COP28, que acontece agora em Dubai, será a oportunidade para estreitar as relações entre os dois países e estipular metas para a redução do desmatamento na Amazônia.
“Uma vez que o governo esteja comprometido com a política florestal e ambiental, é claro que estaremos prontos para apoiar”, diz Flasbarth.
Após a retomada das doações via Fundo Amazônia, a Alemanha espera fortalecer a cooperação com o Brasil para o meio ambiente na COP28. É o que afirma Jochen Flasbarth, que ocupa o cargo de Secretário de Estado do Ministério Federal para a Cooperação Econômica e Desenvolvimento da Alemanha.
Experiente negociador para a política climática global, Flasbarth se encontrará com a delegação brasileira em Dubai para estreitar as relações com o governo Lula. Em entrevista exclusiva à Mongabay, ele afirma que o mundo todo aprecia a meta de um Brasil sem desmatamento, sendo o respeito aos povos indígenas fundamental para manter a cooperação.
Na visão do secretário, o presidente Lula precisa dar uma perspectiva econômica aos brasileiros que se sentem abandonados e alinhá-la a ambiciosas políticas climáticas. Já os países ricos devem recompensar o Brasil por seus serviços ecossistêmicos dentro de uma reformada estrutura de doadores, com mais contribuições de países emergentes, como a China, e menos práticas coloniais do Norte Global.
O senhor vai se reunir com o Brasil na COP28? Se sim, quais serão os temas para cooperação?
Sim, tenho certeza de que vamos nos reunir. Já me encontrei, na última COP em Sharm el-Sheikh, com a minha boa e velha amiga Marina Silva, antes de ela assumir o cargo (de Ministra do Meio Ambiente). Tudo já estava pronto para começar a transição, então fizemos uma retrospectiva da nossa cooperação formal e avançamos sobre como revitalizar a colaboração com o Brasil.
Nunca paramos a cooperação completamente. Mas, dada a situação sob o governo anterior, o apoio ao Fundo Amazônia foi suspenso. Foi isso que reiniciamos diretamente após as eleições porque, à época, o presidente eleito Lula anunciou que estabeleceria o Fundo Amazônia de modo apropriado. Então nos organizamos para disponibilizar os fundos remanescentes porque queríamos mandar um sinal claro. Uma vez que o governo esteja comprometido com a política florestal e ambiental, é claro que estaremos prontos para apoiar.
Então, voltando à sua pergunta, a conversa sempre abrange dois aspectos. Um é que se aproveita a oportunidade para olhar para a nossa cooperação bilateral. Mas, claro, na COP28, verificaremos também se podemos alargar pontos de vista comuns sobre as questões em jogo: o fundo para perdas e danos, a dinâmica do Balanço Global, o apelo global por adaptação e financiamento futuro.
Quais são os compromissos esperados do Brasil na COP?
Não temos expectativas para parceiros. Nós os convidamos a colaborar e já apreciamos muito isso. Acho que esse será um assunto na COP28 porque o atual governo não estava em vigor na última COP, então, de certa forma, todos os anúncios são novos. Por exemplo, a meta de um Brasil livre de desmatamento é apreciada por todos no mundo. A Amazônia passou de sumidouro para fonte [de carbono] nos últimos anos e está retomando a outra direção. Já vimos desenvolvimentos positivos nos últimos meses. Faz muito, muito tempo que colaboro com o Brasil e sei que a quantidade de desmatamento está muito ligada à aplicação e à implementação [da legislação ambienta]. Uma vez que você estabilize e reforce autoridades como o Ibama, imediatamente verá resultados. Se deixar passar ou até incentivar as pessoas indiretamente a continuar o desmatamento, ele acontecerá.
Políticas domésticas perigosas para os direitos indígenas e pela exploração de petróleo na Amazônia podem impactar a cooperação?
O respeito aos povos indígenas é absolutamente chave e parte integral da política do Ministério Federal para a Cooperação Econômica e Desenvolvimento [da Alemanha]. Normalmente, os direitos dos povos indígenas e o interesse, por exemplo, na silvicultura sustentável e na integridade ambiental estão absolutamente alinhados. Mas, por vezes, há conflito se, por exemplo, áreas protegidas são muito rigorosas na regulamentação e comunidades locais se sentem negativamente afetadas. Estamos discutindo isso também com o governo brasileiro.
Felizmente, não estamos numa fase da cooperação para o desenvolvimento em que doadores dizem “é pegar ou largar”. Há sempre uma espécie de discussão sobre aonde precisamos ir. A tarefa do presidente Lula é dar perspectiva aos que se sentem abandonados – também uma perspectiva econômica – e alinhá-la com políticas ambientais e climáticas ambiciosas. Isto é realmente um desafio. Eu acredito nele, nós confiamos nele, mas ao mesmo tempo é claro que não é fácil porque o presidente Lula desafia parceiros ocidentais tradicionais. Em muitos casos, estamos nos olhando num espelho para superar nossos velhos padrões colonialistas. Ele sabe como apontar isso.
Como vê o desejo do Brasil de virar líder na agenda climática, especialmente no Sul Global, e pressionar países ricos por mais financiamento?
O Brasil sempre foi fundamental. Infelizmente, no último governo, sob a gestão do presidente Bolsonaro, não foi de forma construtiva e positiva. Todo mundo respirou após as eleições [presidenciais de 2022] porque abriram-se as portas a uma nova fase. Olhando para a agenda política do presidente Lula e de seu governo, fica muito claro que ele tem a ambição de ser um líder global. Isso é apreciado e não se limita à Amazônia. O Brasil tem uma agricultura enorme que pode fornecer muitos alimentos de forma mais ou menos sustentável e a ambição de ser um país altamente industrializado com o aço e a manufatura.
Também precisamos de uma nova estrutura de doadores. Quando discutimos sobre o fundo de perdas e danos, para mim é inimaginável que a China, o maior emissor de hoje e, em poucos anos, o maior emissor em termos históricos, não esteja a bordo. Não estamos em 1992, no Rio de Janeiro. Estamos em 2023 e antigos países em desenvolvimento agora são imensamente ricos ou, pelo menos, estão em situação muito melhor do que outros países.
O Brasil se encaixa ao lado dos países que deveriam fazer mais ou dos que deveriam receber mais financiamento?
Um pouco dos dois. As necessidades de financiamento transformador no Brasil são enormes, e é por isso que o Brasil é um dos nossos maiores parceiros. Também temos bancos regionais de desenvolvimento, como o BID e o Banco Mundial. Precisamos usar todos estes instrumentos. Ao mesmo tempo, gradualmente, o Brasil chega a uma posição em que pode haver quem deseje que ele também esteja a bordo desses instrumentos para ajudar outros.
O Brasil chama nações de grande biodiversidade de “prestadores de serviços” para o mundo. Esta terminologia é bem recebida pela Alemanha?
É justo olhar desse jeito. Porque reflete exatamente os serviços de ecossistema que esses países fornecem, e eles precisam de apoio para isso. Mas, assim como um país tradicionalmente industrializado como a Alemanha não tem o direito de poluir o mundo, também [estas nações] não têm o direito de desmatar.
Se apenas olharmos para o passado, [dizendo] “olhem o que vocês e a Europa fizeram com suas florestas, e vocês as desmataram”, sim, isso é justo. É por isso que sentimos responsabilidade adicional e especial de apoiar outros. Mas, considerando a necessidade do mundo inteiro, todos temos a obrigação de fazer o possível, e um país com muitas florestas pode protegê-las. Não é que eu, como representante do governo alemão, possa formular uma demanda para o Brasil. Não é uma exigência, é apenas um convite. Vamos analisar isso mutuamente.
Se o Brasil aceitar este convite, doações via Fundo Amazônia podem aumentar?
Sim, vamos fazer mais.
Imagem do banner: Jochen Flasbarth. Foto: BPA/Steffen Kugler