A Mongabay está lançando uma nova edição do livro “Uma Tempestade Perfeita na Amazônia”; a obra está sendo publicada em versão online, por partes e em três idiomas: espanhol, inglês e português.
O autor, Timothy J. Killeen, é um acadêmico e especialista que estuda desde a década de 1980 as florestas tropicais do Brasil e da Bolívia, onde viveu por mais de 35 anos.
Narrando os esforços de nove países amazônicos para conter o desmatamento, esta edição oferece uma visão geral dos temas mais relevantes para a conservação da biodiversidade da região, serviços ecossistêmicos e culturas indígenas, bem como uma descrição dos modelos de desenvolvimento convencional e sustentável que estão competindo por espaço na economia regional.
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As duas últimas décadas viram um aumento massivo da energia hidrelétrica na Pan-Amazônia. O governo brasileiro reduziu o investimento em projetos hidrelétricos de megaescala, mas continua a buscar o desenvolvimento de projetos de média e grande escala. Os custos excessivos das barragens hidrelétricas em todo o mundo as expuseram como investimentos insatisfatórios, e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) reduziu os investimentos porque não tem recursos financeiros suficientes para megaprojetos.
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Outro fator que pode afetar o desenvolvimento futuro é a privatização pendente da Eletrobras, a empresa estatal que foi a incentivadora da maioria dos projetos hidrelétricos. Uma empresa administrada para o lucro de seus acionistas pode estar menos disposta a destinar capital privado para investimentos em infraestrutura de grande escala com retornos econômicos duvidosos, principalmente se a tendência global de energia solar e eólica diminuir a necessidade de energia hidrelétrica de grande escala nos planos nacionais de desenvolvimento.
Normas que dependam de considerações econômicas e políticas podem ser revertidas usando critérios semelhantes, e a resistência à norma para acabar com a energia hidrelétrica de megaescala na Amazônia surgiu poucos dias após seu anúncio. O governo de Jair Bolsonaro enviou sinais claros de que a energia hidrelétrica de grande escala fazia parte de sua agenda de desenvolvimento, incluindo uma prorrogação do prazo para concluir as revisões ambientais para barragens no Rio Tapajós e o reinício dos estudos de viabilidade para uma barragem de grande escala no Rio Trombetas que havia sido abandonada em 2014.
A estratégia da Bolívia para exportar eletricidade enfrentará a forte concorrência de empresas que investem em parques de energia solar industriais de última geração na costa do Pacífico. O governo é motivado pela crença de que uma política macroeconômica baseada em investimentos em infraestrutura impulsionará o crescimento econômico, mas o modelo proposto depende do capital de investimento estrangeiro. Não está claro, entretanto, se os investidores chineses arriscarão seu capital no modelo de negócios altamente incerto da Bolívia. Critérios geopolíticos podem convencer o Brasil a comprar a energia das represas de megaescala no Rio Madeira, onde o Brasil tem consistentes ativos de energia.
No Peru, o setor metalúrgico continuará a impulsionar o investimento em infraestrutura de energia, um fenômeno que se acelerará à medida que as economias avançadas aumentarem a demanda por cobre com a sua transição para veículos elétricos. O crescimento da energia solar e eólica limitará a demanda por energia hidrelétrica de alto impacto, mas sua natureza intermitente pode motivar investimentos em energia hidrelétrica para garantir a estabilidade da rede. Esse modelo de energia favoreceria as instalações de D&R porque elas são mais hábeis em gerenciar variações no fornecimento. O Equador continuará sua expansão da energia hidrelétrica e poderá experimentar uma mudança radical na demanda se o governo levar adiante o sistema ferroviário elétrico proposto.
A Colômbia continuará a desenvolver seus recursos hidrelétricos, mas a maioria deles se concentrará em bacias hidrográficas não amazônicas; é improvável que a Venezuela invista em energia hidrelétrica a médio prazo devido à sua atual crise econômica. Nem o Suriname nem a Guiana precisarão investir em energia hidrelétrica porque podem gerar eletricidade a um custo muito baixo usando gás natural que logo será abundante em plataformas offshore. No entanto, em 2020, o governo recém-eleito da Guiana expressou o desejo de ressuscitar o projeto hidrelétrico abandonado das Cataratas de Amaila, que teve morte natural em 2013 devido a considerações financeiras.
O papel da China acrescenta um elemento de indefinição à trajetória do setor hidrelétrico na Pan-Amazônia. Suas empresas de engenharia têm um histórico de construção de instalações dentro do prazo e do orçamento, o que poderia mudar o cálculo econômico que atualmente torna a energia hidrelétrica de megaescala pouco atraente. Da mesma forma, suas instituições financeiras estatais têm a capacidade de mobilizar o capital necessário para projetos de grande escala e podem alavancar seu status com o Estado chinês para mitigar o risco de inadimplência. Por fim, elas demonstraram flexibilidade para operar em vários ambientes regulatórios: atuaram tanto como investidores comprando ativos em dificuldades no Brasil e no Peru quanto como empreiteiras fornecendo soluções prontas para o projeto e a construção de ativos hidrelétricos no Equador e na Bolívia.
“Uma tempestade perfeita na Amazônia” é um livro de Timothy Killeen que contém as opiniões e análises do autor. A segunda edição foi publicada pela editora britânica The White Horse em 2021, sob os termos de uma licença Creative Commons (licença CC BY 4.0).