A tendência atual de desenvolvimento da Pan-Amazônia é incerta. O investimento contínuo em áreas protegidas e territórios indígenas criou uma base sólida para a conservação da biodiversidade da região. A drástica redução do desmatamento no Brasil provavelmente evitou uma catástrofe ecológica e identificou políticas públicas essenciais com potencial para alavancar o desenvolvimento da Amazônia.
No entanto, o ritmo de cinquenta anos de crescimento econômico caótico, o desrespeito à lei e o poder econômico dos interesses instalados continuam a impedir os esforços para frear a degradação ambiental que ameaça a integridade da Pan-Amazônia a longo prazo.
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Olhando para o futuro, múltiplos fenômenos inter-relacionados determinarão o futuro da região: alguns apoiariam o desenvolvimento de uma economia sustentável, enquanto outros reforçariam os comportamentos ligados aos modelos comerciais convencionais. Alguns são de natureza neutra e têm impactos que poderiam ser mitigados em uma economia regional bem administrada e diversificada. Podem ser organizados nas quatro categorias seguintes, com base em sua probabilidade de ocorrência e seu potencial para contribuir para um futuro sustentável.
O que indubitavelmente vai acontecer
As redes rodoviárias continuarão a se expandir; as estradas existentes serão modernizadas; é apenas uma questão de tempo. As empresas agrícolas com mercados de exportação para o exterior se expandirão; isso deslocará alguns produtores rumo à fronteira florestal (fazendeiros) e motivará outros a expandir os modelos de produção existentes (pequenos proprietários). As indústrias extrativas dominarão as economias das regiões ricas em recursos minerais; seu desempenho ambiental melhorará, mas ainda assim criarão passivos ambientais de longo prazo. Tecnologias de produção sustentável, como a aquicultura, proporcionarão novas oportunidades econômicas, enquanto produtos florestais selecionados, como o açaí, se tornarão novas commodities de exportação. Iniciativas para descentralizar as funções administrativas do Estado vão empoderar tanto as elites locais, que desejam expandir modelos convencionais de produção, quanto os ativistas de base que defendem a conservação ambiental e a justiça social. A urbanização continuará a aumentar as oportunidades e a melhorar as condições de vida dos habitantes da região.
O que pode vir a acontecer
A gestão de áreas protegidas deve melhorar à medida que suas operações são incorporadas aos orçamentos estatais; no entanto, a oposição política pode desclassificar ou eliminar do sistema algumas dessas operações.
As comunidades indígenas enfrentarão desafios para proteger suas terras; algumas poderão ser tentadas a vender o acesso aos recursos naturais em troca de dinheiro. O não cumprimento generalizado dos regulamentos de zoneamento do uso da terra (p. ex., o Código Florestal) e a perda de remanescentes florestais podem diminuir os sistemas convectivos que mantêm regimes de alta precipitação.
A demanda dos consumidores por commodities livres de desmatamento deve levar à intensificação da produção em áreas agrícolas, enquanto modelos comerciais com base em comunidades poderiam melhorar o manejo da pesca selvagem e diminuir os níveis de informalidade (ilegalidade) na indústria madeireira. O turismo natural e cultural poderia melhorar a subsistência das comunidades florestais tradicionais, mas exigiria investimentos significativos em infraestrutura, capacidade humana e comercialização.
A reforma democrática e a supervisão reguladora podem melhorar a qualidade e a objetividade da avaliação ambiental e social, mas é pouco provável que eliminem os investimentos imprudentes em infraestrutura ou no setor extrativista. Os recursos financeiros dos esquemas de PSE poderiam fornecer apoio crucial para os orçamentos operacionais para áreas protegidas e terras indígenas, mas talvez não forneçam capital de investimento suficiente para reformar modelos comerciais não sustentáveis.
O que jamais deveria acontecer
Não deve ser construída nenhuma nova rodovia principal através de qualquer área silvestre; não há justificativas para isso com base em critérios econômicos do setor de transporte. Instalações hidrelétricas de grande escala em grandes rios devem ser excluídas de consideração devido aos impactos irremediáveis nos fluxos de sedimentos e migração de peixes; elas raramente são economicamente viáveis usando critérios financeiros padrão. O aquecimento global não deve exceder 2° Celsius devido aos impactos na fisiologia vegetal, na dinâmica do carbono florestal e nas modificações dos regimes de precipitação em escala continental.
O que imperativamente precisa acontecer
As atividades mais perniciosas e destrutivas na Pan-Amazônia são todas flagrantemente ilegais, e os poderes públicos devem tomar providências para colocá-las sob controle. Algumas são subprodutos óbvios de uma tolerância cultural à corrupção: o corte ilegal de madeira e a apropriação de terras. Outras são o produto da desigualdade e da natureza lucrativa da atividade ilícita: a mineração artesanal de ouro e o cultivo da coca. Erradicar a mineração exigirá uma reforma institucional e uma ação sustentada de aplicação da lei; erradicar o cultivo de coca exigirá uma abordagem mais integrada devido ao número de pessoas envolvidas e sua vontade de confrontar o Estado com a violência.
“Uma tempestade perfeita na Amazônia” é um livro de Timothy Killeen que contém as opiniões e análises do autor. A segunda edição foi publicada pela editora britânica The White Horse em 2021, sob os termos de uma licença Creative Commons (licença CC BY 4.0).