Jair Bolsonaro está prestes a vencer o segundo turno das eleições presidenciais brasileiras em 28 de outubro, com 58% dos votos até o momento. Ele suporta posições políticas vigorosas em oposição ao meio ambiente, direitos indígenas e reivindicações tradicionais de terras.
Bolsonaro se comprometeu a abrir a Amazônia para exploração econômica, expandir a produção de energia, abolir o Ministério do Meio Ambiente, afrouxar os regulamentos e licenciamento ambiental, abrir reservas indígenas à mineração e sair do Acordo de Paris sobre o clima.
Além disso, o outrora minúsculo partido a que pertence Bolsonaro, o PSL, elegeu 52 novos deputados federais e quatro senadores nas eleições de 7 de outubro. É muito provável que esses representantes ultradireitistas do PSL se reúnam com o bloco de direita do agronegócio e mineração da bancada ruralista no Congresso, compondo uma maioria.
Como resultado, analistas dizem que, se Bolsonaro for eleito presidente, é provável que terá o apoio total do Congresso no cumprimento de sua agenda, com apenas o Supremo Tribunal Federal possivelmente no caminho do significativo desmatamento da Amazônia e outros danos ambientais.
Faltando pouco mais de uma semana para o segundo turno, o candidato presidencial de extrema direita Jair Bolsonaro, que afirmou sua intenção de retirar o Brasil do Acordo de Paris sobre o clima, continua sendo a estrela política em ascensão na oitava maior economia do mundo e na nação que permanece como guardiã de uma grande porção da Amazônia, a maior floresta tropical remanescente do globo.
Bolsonaro não só conseguiu 46% dos votos no primeiro turno eleitoral em 7 de outubro, contra 29% para o segundo colocado do PT, Fernando Haddad, mas o partido a que pertence Bolsonaro, o PSL, antes com força insignificante, disparou de um único membro eleito em 2014 para 52 novos deputados federais e quatro senadores. Esses representantes de direita do PSL, combinados com os membros da bancada ruralista (o lobby do agronegócio e da mineração no Congresso), provavelmente darão ao novo presidente amplo apoio na legislatura.
Bolsonaro recebeu o maior número de votos em 17 estados brasileiros, incluindo oito dentro da Amazônia Legal, enquanto Haddad venceu em nove estados, oito no nordeste e apenas um na Amazônia (no estado do Pará).
Analistas dizem que as chances de Haddad derrotar Bolsonaro são remotas. Desde a redemocratização do Brasil em 1985, nenhum candidato presidencial conseguiu vencer um segundo turno depois de ter sido deixado para trás no primeiro. As projeções das pesquisas na semana passada colocaram Bolsonaro à frente com 58% dos votos, uma vantagem de 16 pontos sobre Haddad. A divulgação do resultado de uma nova pesquisa está prevista para hoje.
Especialistas dizem que a ascensão de Bolsonaro se deu em grande parte devido ao sentimento antipetista da maioria da população brasileira votante, muito provavelmente causado pela corrupção sistêmica praticada dentro do Partido dos Trabalhadores e revelada nos últimos anos pela extensa investigação de corrupção, a Lava Jato.
Agronegócio, o grande vencedor
Bolsonaro, falando primeiro como deputado e depois como candidato à presidência, mostrou-se profundamente avesso ao meio ambiente. Ele menciona o assunto apenas uma vez em sua plataforma política – apenas para dizer que, se ele for eleito, o Ministério do Meio Ambiente será absorvido pelo Ministério da Agricultura.
Em uma reunião com líderes da bancada ruralista para formalizar o apoio ao candidato, ex-capitão do Exército, Bolsonaro declarou: “Eu me considero um agregado para a bancada produtiva em Brasília e queremos ajudar esse setor [de agronegócios e mineração] que ajudou muito o Brasil [economicamente]. Os problemas, em grande medida, serão extinguidos ao fundir os Ministérios da Agricultura e do Meio Ambiente”.
Após as eleições de 7 de outubro, autoridades de dois departamentos ambientais federais (IBAMA e ICMBio) se manifestaram, opondo-se à dissolução do Ministério do Meio Ambiente (MMA) e negaram as alegações de aliados de Bolsonaro de que o MMA promoveu uma “boa indústria [ambiental]“, tirando proveito dos esforços para evitar o desmatamento e a poluição.
É importante ressaltar que Bolsonaro propôs a abertura da região amazônica para a exploração econômica, especialmente a mineração. Isso inclui territórios indígenas e terras quilombolas (comunidades formadas por descendentes de escravos fugitivos). Em um discurso no ano passado, Bolsonaro declarou: “Você pode ter certeza de que, se eu chegar lá [à Presidência], não terei dinheiro para as ONGs. Se depender de mim, todo cidadão terá uma arma de fogo em casa [para defender sua propriedade, e] não haverá um centímetro demarcado para reservas indígenas ou quilombolas”.
O candidato foi ainda mais explícito em um evento de campanha de rua: “Vamos fazer o Brasil para as maiorias. As minorias têm que se curvar às maiorias. As minorias se adequam ou simplesmente desaparecem!”.
Tal retórica é quase certamente para endurecer a resistência e a resolução de grupos indígenas, como os Mundurukus com 15.000 homens, conhecidos por suas ferozes tradições guerreiras, resultando potencialmente em um maior conflito na Amazônia, uma região onde a violência já aumentou sob a gestão do presidente Michel Temer.
Desregulamentação ambiental
Como presidente, Bolsonaro também planeja “descentralizar” e retirar os fundos de programas científicos federais, transformando o setor produtor de energia em “um dos principais vetores de crescimento do Brasil. As pequenas usinas hidrelétricas, por exemplo, enfrentam barreiras quase intransponíveis ao licenciamento ambiental. Há casos que excedem dez anos e veremos que o licenciamento de [infraestrutura] será avaliado em no máximo três meses”, segundo a plataforma do PSL. Se o novo presidente vai relançar ou não o programa de construção da megabarragem da Amazônia, agora parado, não se sabe.
As nomeações políticas para o governo de Bolsonaro devem incluir vários oficiais militares, que muitas vezes rejeitam a regulamentação federal como interferência indevida no progresso. O general Oswaldo Ferreira, responsável pela infraestrutura e pelo planejamento ambiental de Bolsonaro, confirmou que os órgãos e regulamentos ambientais provavelmente serão reestruturados por completo para eliminar “atrasos”. Ele é um provável candidato a ministro dos Transportes.
“Eu era um tenente feliz [no passado]. Quando construí estradas, não havia Ministério Público nem IBAMA. A primeira árvore que nós derrubamos [na abertura da rodovia BR-163 na Amazônia], eu estava ali… Derrubei todas as árvores que tinha à frente, sem ninguém encher o saco. Hoje, o cara, para derrubar uma árvore, vem um punhado de gente para encher o saco”, disse Ferreira.
Se Bolsonaro for eleito presidente, a democracia brasileira também poderá sofrer. Conforme observado pelo Colunista da Folha de S.Paulo, Hélio Schwartsman:: “[Ele] já fez inúmeras declarações que revelam seu desprendimento da democracia e dos direitos humanos. Não é absurdo, portanto, imaginar que, uma vez elevado ao poder, inicie uma escalada de autoritarismo… Quanto a Haddad e o PT, se o passado vale alguma coisa, eles já passaram no teste da democracia. O partido teve um presidente destituído e seu grande líder foi preso, [mas] em nenhum momento não cumpriu a regra [da lei]”.
O Presidente e o Congresso
Próximo presidente ou não, Bolsonaro já é parcialmente responsável pela reformulação do novo Congresso.
Dos 513 deputados federais escolhidos por voto no dia 7 de outubro, 52 são do PSL, a que pertence Bolsonaro, fazendo desse partido o segundo maior bloco de votação da Câmara dos Deputados, logo atrás do PT, com 56 membros. Muitos dos candidatos eleitos do PSL são do Exército e da Polícia Militar – outro risco potencial para a democracia brasileira, dizem os críticos. Entre os partidos mais reduzidos está o MDB, do presidente Temer que deixa o governo.
A onda eleitoral que levou Bolsonaro à beira da presidência também ajudou a eleger dois deputados da Câmara que receberam o maior número de votos na história do país: Eduardo, filho de Bolsonaro, ganhou um segundo mandato representando São Paulo na Câmara Federal, com 1,8 milhão de votos, e Janaína Paschoal ganhou como deputada estadual, com dois milhões de votos. Foi Janaína quem apresentou a petição que iniciou o processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff em setembro de 2015, destituída em 2016 e substituída por Temer.
As tentativas de reeleição entre a bancada ruralista no Congresso tiveram derrotas significativas, provavelmente porque muitos de seus candidatos foram contaminados por escândalos de corrupção. Os ruralistas viram apenas 98 dos seus 218 deputados federais reeleitos – o menor número desde 2002. Entre os perdedores estavam políticos de peso, incluindo Osmar Serraglio, ex-ministro da Justiça no governo de Temer e crítico ferrenho das reivindicações territoriais indígenas, e Valdir Colatto, dono de propriedades na Amazônia, incluindo algumas em terras públicas, e que perdeu em sua candidatura ao sétimo mandato na Câmara.
No Senado, o lobby do agronegócio perdeu dez senadores e reelegeu dois, e terá um total de 18 membros em 2019. Entre os principais perdedores estavam Romero Jucá, do estado de Roraima, e Eunício Oliveira, atual presidente do Senado e importante ruralista do estado do Ceará.
Novas alianças
“O fato de que mais da metade da bancada ruralista perdeu seus assentos não significa que seu poder tenha enfraquecido”, disse Sergio Abranches, cientista político e comentarista do programa de rádio Ecopolítica em uma entrevista à Mongabay. “Eles perderam terreno devido à rejeição dos brasileiros às práticas de patronato e corrupção, mas precisamos observar, após a posse oficial, os recém-eleitos [legisladores] que se identificam com os ruralistas”.
A jornalista Ana Magalhães, do site de notícias Repórter Brasil, disse à Mongabay que “devido à aliança de Bolsonaro com o lobby do agronegócio, é provável que um grande número de novos deputados do PSL se juntem formalmente à bancada ruralista, o que os ajudaria a manter o poder político”.
Como resultado, Ana espera que Bolsonaro tenha o apoio de mais de 50% da nova legislatura, permitindo que ele consiga facilmente a aprovação de projetos prioritários, cumprindo sua agenda, que inclui a aprovação regulatória de novos pesticidas, a suspensão das demarcações de terras indígenas garantidas pela Constituição brasileira de 1988 e autorização de posse e uso de armas de fogo por produtores rurais do agronegócio.
Abranches, do Ecopolítica, acredita que Bolsonaro, se eleito, terá apoio suficiente do Congresso para levar a cabo suas ameaças contra o meio ambiente e os direitos humanos. “De [Fernando] Collor [presidente de 1990 a 1992] a Dilma [Rousseff, presidente de 2011 a 2016], todos os presidentes brasileiros foram apoiados durante os primeiros oito meses de governo para aprovar sua agenda prioritária. O principal obstáculo virá do Supremo Tribunal Federal, que firmou jurisprudência sobre vários desses assuntos”.
O caminho à frente
Abafada pela notícia da ascendência de Bolsonaro e pela mudança da legislatura para a direita, houve uma boa notícia para os conservacionistas e ativistas indígenas que veio direto do estado de Roraima. Joenia Wapichana, uma líder indígena de 45 anos, advogada e defensora da demarcação da Reserva Indígena Raposa Serra do Sol, tornou-se a primeira indígena a ser eleita deputada federal brasileira. No Congresso, Wapichana disse que defenderá o Estatuto dos Povos Indígenas, que foi “arquivado por vários anos”.
No entanto, esse pequeno raio de esperança para a Amazônia indígena ocorreu na mesma semana em que o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) da ONU emitiu um novo relatório alertando os governos mundiais de que há provavelmente um pouco mais de uma década para limitar alguns impactos altamente destrutivos do aquecimento global.
Se Bolsonaro prosseguir com suas promessas de campanha, especialmente retirando o Brasil do Acordo de Paris sobre o clima, seus danos aos esforços para conter o aquecimento global podem se tornar seu legado mais significativo.
Um grupo de cientistas preocupados conduziu um novo estudo analisando o quanto aumentaria o desmatamento e a liberação de carbono com as políticas de Bolsonaro, e constataram que a quantia “poderia representar até 20% do orçamento de carbono ‘livre’ restante para atingir a meta de 1,5 graus Celsius” estabelecida pelo IPCC para evitar o desastroso aquecimento global.
Agora, a decisão sobre quem deve ser o próximo presidente fica a cargo dos 147 milhões de eleitores do Brasil.
Imagem do banner: Jair Bolsonaro. Foto por Fabio Rodrigues Pozzebom / Agência Brasil.