Floresta secundária da Amazônia brasileira absorve apenas o dobro da taxa de carbono da floresta primária, em comparação com o acúmulo de até 11 vezes em outras partes do mundo; isso pode ser uma má notícia se descobertas semelhantes forem confirmadas em outros lugares da Amazônia e dos trópicos, apontam cientistas.
A Zona Bragantina, no Pará, onde o estudo ocorreu, tem sido utilizada para produção agrícola há centenas de anos; hoje, não resta quase nenhuma floresta primária. É pouco provável que essas florestas degradadas retornem aos seus níveis originais de sequestro de carbono e biodiversidade em “escalas de tempo politicamente significativas”, afirmam pesquisadores.
Resultados do estudo indicam que futuros pesquisadores devem ser mais cautelosos ao estimar a capacidade de absorção do carbono atmosférico por regeneração de florestas tropicais para mitigar os impactos das mudanças climáticas, pois essa capacidade varia segundo diversos fatores e pode ser superestimada.
As descobertas também podem colocar em dúvida o plano do Brasil de reflorestar regiões para cumprir a redução na emissão de carbono prevista no Acordo de Paris. O país promete restaurar 12 milhões de hectares de floresta até 2030. Porém, o valor real de sequestro de carbono dessas novas florestas secundárias, incluindo plantações de árvores, pode ser muito menor que o esperado.
As florestas sequestram carbono do ar e o armazenam à medida que crescem, fornecendo um serviço essencial para um mundo onde a humanidade está aumentando rapidamente os níveis de CO2 na atmosfera e escalando a crise climática. Sabe-se que florestas secundárias — florestas que foram derrubadas ou perturbadas — têm um alto potencial de sequestro de carbono, com alguns estudos sugerindo que a captação de carbono dessas florestas em regeneração pode ser até 11 vezes maior que a de florestas primárias.
No entanto, isso nem sempre é verdade — o que pode ser uma má notícia para a humanidade. Em estudo recente publicado pela revista Ecology, pesquisadores revelaram que a floresta secundária da Zona Bragantina, no nordeste do Pará, possui um índice de sequestro de carbono apenas duas vezes maior que a floresta primária — muito menos do que o esperado.
“Nossos resultados apresentam uma imagem muito menos otimista em comparação com outros estudos, incluindo nossas próprias pesquisas realizadas em outras regiões do Pará”, afirma o autor principal do artigo, Fernando Elias, doutorando da Universidade Federal do Pará. “Nós não podemos assumir que florestas secundárias sempre se desenvolverão rápida e completamente.”
A Zona Bragantina tem sido usada para a produção agrícola há centenas de anos. Hoje, quase não há floresta primária na região. E, de acordo com o estudo, é pouco provável que essas florestas voltem a atingir o nível original de acúmulo de carbono e biodiversidade em uma “escala de tempo politicamente significativa”.
Os pesquisadores investigaram a recuperação de espécies de árvores e a influência do clima e da paisagem na dinâmica do carbono na floresta da Zona Bragantina, que tem entre 6 e 60 anos. Eles descobriram que as florestas secundárias possuem apenas 41,1% da média de carbono e 56% da diversidade de árvores da floresta primária da região.
“Nossos resultados indicam que devemos ter mais cautela em relação ao sucesso de soluções para mitigar os impactos das mudança climáticas pela regeneração de florestas secundárias”, disse Elias, “já que a capacidade de absorção de carbono dessas florestas pode estar superestimada.”
As conclusões do estudo podem ter um impacto negativo em uma das principais propostas do Brasil para reduzir suas emissões de gases de efeito estufa no âmbito do Acordo de Paris, assinado em 2015. O país se comprometeu a restaurar 12 milhões de hectares até 2030. Porém, o carbono sequestrado por essas novas florestas secundárias pode estar bem longe do esperado, especialmente porque o Brasil tem forçado uma regeneração por meio de plantações de eucalipto e outras culturas.
Enquanto os Estados Unidos atualmente consideram cultivo de árvores uma forma de regeneração, numerosos estudos mostram que esse tipo de plantação — incluindo o eucalipto usado para produzir papel higiênico, o óleo de palma e o pinheiro usados na produção de biocombustível sólido de madeira — muitas vezes apresenta um valor consideravelmente menor no sequestro de carbono em compração com florestas originais, em parte porque esse tipo de plantação tem um ciclo curto de colheita, o que faz com que seu sequestro de carbono volte a zero com frequência.
As taxas de rebrota — e o carbono que essas florestas são capazes de armazenar — podem variar muito de um lugar para outro e dependem das propriedade do solo, das condições do clima e do uso anterior da terra, dentre outros fatores. Muito do que sabemos sobre rebrota de florestas secundárias tropicais vem de estudos sobre lugares com maior cobertura vegetal que a Zona Bragantina e com uso menos intenso da terra ao longo do tempo — melhores condições para o crescimento das árvores e recuperação da biodiversidade. O novo estudo oferece uma visão mais clara sobre como a recuperação das florestas ocorre em condições menos favoráveis.
Esse estudo “mostra que mesmo a Floresta Amazônica, que se acredita ser muito resistente a distúrbios externos, pode levar mais de um século para recuperar seu estoque de carbono e nível de biodiversidade originais”, comenta Catarina Jacovac, que estuda florestas secundárias na Wageningen University & Research. “Preservar as florestas antigas é, portanto, crucial para garantir a resiliência do ecossistema amazônico como um todo”.
Na última década, secas intensas associadas ao fenômeno El Niño também prejudicaram a recuperação de florestas secundárias. Os pesquisadores registraram um aumento de 0,1°C, por década, na temperatura da Zona Bragantina e uma redução no crescimento de plantas durante os períodos mais secos.
De acordo com Elias, a ligação com o clima foi surpreendente. A equipe observou uma menor absorção de carbono durante os períodos de seca, “uma descoberta alarmante visto que grandes áreas do Arco do Desmatamento da Amazônia vêm sofrendo com longos períodos de seca e se tornando mais quentes”.
“Se florestas secundárias desempenharem um papel chave na mitigação da mudança climática, então nós precisamos primeiro garantir a proteção das florestas primárias que fornecem as sementes e regulam o clima regional”, destaca o coautor do estudo Jos Barlow, da Universidade de Lancaster. “Também precisamos garantir que as mudanças climáticas tenham um limite, reforçando as reduções nas emissões de gases em todo o mundo. Se a mudança climática continuar, poderemos perder umas das ferramentas mais eficazes que temos para absorver o dióxido de carbono.”
Imagem do banner: Tucano-toco (Ramphastos toco) na Floresta Amazônica brasileira. Foto Rhett A. Butler/Mongabay.
Referências:
Elias F, Ferreira J, Lennox GD, et al. (2020) Assessing the growth and climate sensitivity of secondary forests in highly deforested Amazonian landscapes. Ecology. doi: 10.1002/ecy.2954.