Um tribunal federal suspendeu a licença de instalação da megabarragem de Belo Monte no estado do Pará, Brasil. Prevista para ter a terceira maior capacidade de geração de energia do mundo, a barragem entrou em operação em 2015, mas sua construção só será concluída em 2019.
O tribunal ordenou que as obras fossem paralisadas até que a Norte Energia cumpra os compromissos que assumiu em 2011 de proporcionar moradia adequada às pessoas desalojadas pela barragem, incluindo povos indígenas e tradicionais que viviam próximo ao Rio Xingu.
Dentre as violações de compromissos citadas estão casas construídas sem espaço para famílias maiores, casas construídas com materiais diferentes dos prometidos e casas construídas muito longe do trabalho, de escolas e do comércio em Altamira, uma cidade que carece de um sistema de transporte público eficiente.
O consórcio continua operando a barragem, uma vez que sua licença de operação não foi suspensa.
Um tribunal federal em Brasília encontrou falhas no reassentamento feito pela Norte Energia de pessoas desalojadas pela barragem de Belo Monte no estado do Pará. O tribunal decidiu a favor do Ministério Público Federal (MPF), órgão de procuradores independentes, que alegou que os projetos de reassentamento urbano para os milhares de pessoas desalojadas pela barragem eram inadequados.
A nova decisão suspende a licença de instalação da Norte Energia, impedindo o consórcio de continuar com construções na barragem, prevista para ser concluída em 2019. A usina hidrelétrica de Belo Monte tem funcionado desde o início de 2015.
De acordo com a ação, a Norte Energia prometeu em 2011 construir casas com três tamanhos diferentes para as famílias desalojadas (60, 69 e 78 metros quadrados), alocando-as de acordo com o seu tamanho. Porém, em 2013, a empresa voltou atrás, dizendo que construiria somente casas de 63 metros quadrados. Essa decisão, de acordo com a decisão do tribunal, foi tomada sem que as pessoas afetadas fossem consultadas, muitas delas povos indígenas e tradicionais que viviam próximo ao Rio Xingu.
Outra mudança envolveu a construção de casas com blocos de concreto em vez de alvenaria, conforme originalmente prometido. Embora possa parecer uma alteração irrelevante, isso significa que as paredes de concreto não conseguem sustentar as redes, tradicionais na Amazônia.
Um outro problema citado é que as comunidades foram reassentadas a mais de 2 quilômetros de suas casas originais, um problema grave, uma vez que o transporte público disponível na cidade de Altamira é escasso. Durante a visita da jornalista desta matéria às comunidades reassentadas em Altamira em 2016, os mototáxis eram o único meio confiável de transporte para o trabalho, para a escola e para o comércio. Entretanto, esses táxis cobram tarifas maiores que a maioria dos ônibus municipais no Brasil, causando uma dificuldade financeira para muitas pessoas desalojadas que estão sem trabalho. Os táxis também restringem as pessoas que podem viajar — uma vez que não há subsídios para os deficientes — bem como os itens que um passageiro pode carregar.
Além disso, o MPF descobriu que as casas propostas pela Norte Energia violavam o Código de Construção do município de Altamira. Entretanto, ao invés de exigir que o consórcio cumprisse o código existente, a câmara municipal aprovou uma alteração do código para adaptá-lo aos projetos da Norte Energia. O MPF alegou que a alteração repentina feita pela câmara municipal foi inconstitucional.
A barragem de Belo Monte foi construída para ter a terceira maior capacidade de geração hidrelétrica do mundo. Ela está localizada no Rio Xingu, próximo à cidade de Altamira. O consórcio Norte Energia, que construiu a barragem, assinou um acordo com o governo brasileiro em 2011 prometendo pagar US$ 1 bilhão em indenização às pessoas afetadas pela construção, incluindo povos indígenas e tradicionais desalojados. A ONG Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) estima que algo em torno de 40.000 pessoas foram desalojadas pela barragem. Entretanto, o Estudo de Impacto Ambiental da Norte Energia estimou que apenas metade desse número representa as pessoas afetadas.
A construção da barragem fez com que desempregados e empresários de todo o Brasil corressem para a cidade. À medida que as obras de construção da barragem continuam desacelerando, o desemprego tem aumentado rapidamente. Altamira ocupa hoje a posição de cidade mais violenta do Brasil, de acordo com o Mapa da Violência 2017.
Ano passado a licença da Norte Energia foi suspensa devido ao não cumprimento dos termos do contrato operacional, especialmente a construção de um sistema de esgoto e água adequado na cidade de Altamira, para onde a maior parte dos desalojados foi realocada.
A redução do fluxo do rio resultante da instalação da barragem também prejudicou povos indígenas e comunidades tradicionais de pescadores, que dependiam da abundância de peixes do Rio Xingu para sua renda e subsistência. Toneladas de peixes têm morrido desde a construção da barragem, motivo pelo qual a Norte Energia foi multada em US$ 10,8 milhões. Em 2015, o MPF denunciou o consórcio e o governo federal por etnocídio, a destruição da cultura indígena, devido ao não cumprimento de seus compromissos para com a população indígena desalojada pelo projeto.
Embora a nova decisão impeça a Norte Energia de continuar com as obras de expansão da hidrelétrica, a barragem tem funcionado desde o início de 2015. Em um comunicado à imprensa, a Norte Energia disse que ainda não havia sido notificada sobre a decisão. O programa de notícias Jornal Nacional, da Rede Globo, informou em 15 de setembro que a barragem continua em operação. A declaração da Norte Energia sustenta que ela possui uma licença de operação que substitui a licença de instalação que o tribunal suspendeu, portanto não há impactos práticos para a empresa resultantes da suspensão. O comunicado informa ainda que a Norte Energia recorrerá da decisão.
A advogada Biviany Rojas Garzon ficou indignada com o fato de que a empresa ignoraria a decisão dessa maneira. A Dra. Biviany trabalha com o Programa Xingu do Instituto Socioambiental “A ideia de que essa decisão é inócua é falsa”, disse a advogada à Mongabay. “Os direitos das pessoas que foram afetadas pela barragem ainda são válidos, e eles não têm prazo de validade. A obrigação [do consórcio] perante as pessoas que foram expulsas de suas casas permanece.”
A Dra. Biviany também demonstrou a preocupação de que a barragem poderá ser comprada por investidores chineses, dada a fraca reputação da China em questões relacionadas a direitos humanos. A agência de notícias Reuters informou em abril que acionistas da barragem de Belo Monte estavam em negociações com a empresa chinesa Zhejiang Electric Power Construction (ZEPC). As notícias de uma possível venda surgiram após a viagem do presidente do Brasil Michel Temer à China. Em julho, porém, a Reuters informou que as negociações em torno da venda esfriaram em parte por causa dos problemas legais da barragem.
Os atuais acionistas de Belo Monte incluem a Eletrobras, empresa de energia estatal; a Vale, gigante brasileira da mineração; a Neoenergia SA, a Cemig e a Light SA, e os fundos de pensão Petros e Funcef. A operação é avaliada em R$ 35 bilhões, mas uma fonte contou à Reuters que os riscos e incertezas envolvidos no projeto poderiam impedir a concretização da venda. A barragem hidrelétrica também está envolvida em um processo administrativo instaurado pela ANEEL, Agência Nacional de Energia Elétrica, devido ao atraso na produção de energia.
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