Nesta seção, o autor de “Uma tempestade perfeita na Amazônia” faz um breve relato de como funciona a justiça quando se trata de aplicar as leis ambientais.
No caso do Peru, Equador e Bolívia, os códigos civis e penais incluem os crimes ambientais; enquanto os demais países criaram códigos específicos que abordam cada tema separadamente: florestas, água, poluição, etc.
De fato, no Brasil, os promotores públicos conseguiram usar o direito civil para promover mudanças nas políticas dos governos estaduais e federais.
Todas as nações da Pan-Amazônia têm sistemas jurídicos baseados no Direito Civil (napoleônico), em que os tribunais seguem regras estabelecidas por “códigos”, que são livros de regras estatutárias que descrevem infrações específicas e suas penalidades correspondentes. Cada país tem um “código penal” em que o Estado assume o papel de autor e processa um caso criminal contra um réu, bem como um “código civil” que julga disputas entre partes, que podem incluir o Estado como autor, réu ou nenhum dos dois. Há também códigos especializados com um foco específico que são chamados de “direito administrativo”, pois regem as funções regulatórias do Estado.
A Bolívia, o Peru e o Equador incorporaram os crimes ambientais em seus códigos civis e penais, enquanto os outros países criaram códigos especializados que tratam de infrações ambientais organizadas por tema: floresta, água, contaminação etc. Em cada caso, os códigos fornecem orientação para definir a natureza da infração, mas também a gravidade das penalidades associadas a cada crime, que podem ser instrutivas (reparar danos), monetárias (pagar indenização) ou penais (ir para a prisão).
As ações administrativas e regulatórias (por exemplo, multas) representam a primeira linha de aplicação legal da lei ambiental, mas em situações em que a influência política supera a autoridade reguladora, ou em que os infratores ignoram descaradamente tanto a lei quanto o órgão regulador, o direito civil e o direito penal fornecem mecanismos para lidar com os danos ambientais por meio do sistema judicial.

O direito civil oferece aos cidadãos, às ONGs e aos promotores públicos inúmeros caminhos para responsabilizar indivíduos e instituições, tanto públicas quanto privadas, por violações das normas ambientais. No Brasil, os promotores públicos utilizaram o direito civil para forçar uma mudança na política dos governos estadual e federal. Em 2012, o Ministério Público Federal (MPF) obteve uma ordem judicial para suspender o plano estadual de macrozoneamento (ZEE) de Mato Grosso, que havia sido aprovado pela Assembleia Estadual. Os advogados argumentaram que a versão aprovada, que era materialmente diferente do documento técnico elaborado por servidores públicos, era incompatível com o Código Florestal e com a Constituição, pois não previa status legal para quatorze territórios indígenas.
Em outro caso, o MPF processou o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) em 2010 pela distribuição inadequada (ilegal) de terras no Acre, onde áreas de assentamento foram criadas sem a demarcação de reservas florestais comunitárias exigidas pelo Código Florestal. O fato de o Incra não ter cumprido essas normas aumentou o desmatamento e, inadvertidamente, comprometeu a situação legal das propriedades dos assentados. O tribunal ordenou que o Incra revisasse seu programa de assentamento e iniciasse os pedidos de licenciamento ambiental no prazo de sessenta dias ou pagasse uma multa de R$ 200 mil por cada caso de descumprimento.
A lei penal leva a ação judicial a um patamar mais avançado, embora normalmente exija a intervenção de um promotor público e seja limitada a indivíduos, já que a conduta criminosa é normalmente codificada como um ato pessoal. O direito penal serve como um componente essencial na luta contra o desmatamento, fornecendo sanções penais para infrações ambientais. A Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/1998) estabelece a estrutura legal para penalizar aqueles que se envolvem em atividades como extração de madeira não autorizada, queimadas e abertura de clareiras. A legislação brasileira classifica várias formas de desmatamento e degradação ambiental como crimes, sujeitos a penalidades que incluem o confisco de bens usados nas atividades ilegais e prisão.
Imagem do banner: Punir as práticas ambientais inadequadas que causam incêndios é uma das tarefas pendentes na Bolívia. Foto: Cejis.