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Mesas-redondas e esquemas de certificação

Um mosaico de reservas florestais legais, pastagens e fazendas de soja na Amazônia brasileira. Crédito: Rhett A. Butler.

  • A Mongabay está lançando uma nova edição do livro “Uma Tempestade Perfeita na Amazônia”; a obra está sendo publicada em versão online, por partes e em três idiomas: espanhol, inglês e português.

  • O autor, Timothy J. Killeen, é um acadêmico e especialista que estuda desde a década de 1980 as florestas tropicais do Brasil e da Bolívia, onde viveu por mais de 35 anos.

  • Narrando os esforços de nove países amazônicos para conter o desmatamento, esta edição oferece uma visão geral dos temas mais relevantes para a conservação da biodiversidade da região, serviços ecossistêmicos e culturas indígenas, bem como uma descrição dos modelos de desenvolvimento convencional e sustentável que estão competindo por espaço na economia regional.

Foram organizadas iniciativas de sustentabilidade para a maioria das commodities agrícolas da Pan-Amazônia, incluindo óleo de palma, soja e carne bovina, mas também para café e cacau. Várias dessas iniciativas adotaram o termo “mesa redonda” em seus nomes porque ele transmite a noção de inclusão que é um conceito central nessas iniciativas de múltiplas partes interessadas. Normalmente, as partes interessadas incluem todos os participantes de uma cadeia de suprimentos, desde o agricultor até o varejista, mas também comerciantes de commodities, fabricantes de bens de consumo, bancos e prestadores de serviços, bem como grupos da sociedade civil.

Seu objetivo comum é identificar soluções eficazes para os desafios sociais e ambientais associados aos sistemas de produção convencionais. O mecanismo usado para reformar as cadeias de suprimentos geralmente é um sistema de certificação voluntário que verifica se a produção, o comércio e a transformação de uma mercadoria estão em conformidade com um conjunto de práticas recomendadas que foram acordadas por todas as partes. A busca de consenso é importante, pois significa que todas as partes interessadas concordaram em aceitar esse pacote de soluções e se comprometeram a apoiar a comercialização dos produtos que foram certificados como “sustentáveis”.

Alguns ativistas ambientais veem essas iniciativas como uma forma de “lavagem verde” e questionam sua eficácia. As empresas participantes certificam a produção em sua própria cadeia de suprimentos, mas as iniciativas de mesa redonda não conseguiram transformar seus respectivos setores. Além disso, a demanda por commodities certificadas não conseguiu atrair uma massa crítica de produtores que realmente transformasse o mercado e mudasse os fatores econômicos do desmatamento.

A adoção é maior para o café (40%) e o cacau (22%), enquanto as commodities ligadas a plantações industriais tendem a ser menores: óleo de palma (20%), açúcar (3%), soja (2%) e carne bovina (<1%). Parte da explicação para a lenta adoção dos padrões voluntários é a falta de demanda; normalmente, apenas cerca de cinquenta por cento da produção certificada é de fato vendida como um produto certificado.

Estrada através de campos de soja e florestas na Bolívia. Crédito: Rhett A. Butler.

A falta de adesão é mais uma manifestação do dilema de alocar o custo da proteção ambiental e da justiça social. Os protocolos de sustentabilidade custam dinheiro, o que aumenta o preço de um bem de consumo ou reduz a margem de lucro dos produtores de commodities. Embora os consumidores norte-americanos e europeus estejam preocupados com o desmatamento, a maioria ainda escolhe um produto de custo mais baixo, enquanto os consumidores da Ásia, da América Latina e do Oriente Médio se concentram primordialmente no preço. Além disso, os mercados globais de commodities são dominados por produtores em paisagens que foram transformadas pela agricultura décadas ou séculos atrás, e esses agricultores operam sem medo de serem acusados de crimes ambientais. Consequentemente, os comerciantes não se sentem motivados a pagar um prêmio aos agricultores da fronteira agrícola.

Alguns produtores buscam diferenciar seus produtos como orgânicos, livres de desmatamento, de comércio justo ou livres de antibióticos porque estão vendendo seus produtos em um mercado diferenciado e recebem um prêmio por sua produção como compensação pelo custo extra e pela redução de produtividade que esses sistemas [supostamente] acarretam. Outros participam porque isso lhes garante acesso ao mercado. A maioria dos produtores opta por contornar as diretrizes voluntárias, vender para comerciantes não preocupados com a sustentabilidade ou simplesmente ignorar todo o processo.

Os defensores sociais têm questionado os benefícios econômicos da certificação porque eles tendem a discriminar os pequenos produtores que não conseguem atender às exigências logísticas e de manutenção de registros de um processo de certificação. Esses protocolos são negociados por produtores de grande escala que dominam as iniciativas de mesa redonda e adaptam os critérios de certificação às suas cadeias de suprimentos À medida que a formalização se espalha pelos mercados nacionais e internacionais, os pequenos produtores podem ser cada vez mais marginalizados nos mercados regionais e até mesmo locais, em contradição com os objetivos sociais declarados desses esquemas de certificação.

“Uma tempestade perfeita na Amazônia” é um livro de Timothy Killeen que contém as opiniões e análises do autor. A segunda edição foi publicada pela editora britânica The White Horse em 2021, sob os termos de uma licença Creative Commons (licença CC BY 4.0). 

Leia as outras partes extraídas do capítulo 3 aqui:

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