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Suínos e aves: Agregando valor à produção agrícola

O preço acessível dos grãos para ração no Mato Grosso (soja + milho) e em Santa Cruz da Bolívia (soja + sorgo) permitiu o crescimento do setor de suínos e aves. Crédito:© Rafael Tomazi / Shutterstock.com

  • A Mongabay está lançando uma nova edição do livro “Uma Tempestade Perfeita na Amazônia”; a obra está sendo publicada em versão online, por partes e em três idiomas: espanhol, inglês e português.

  • O autor, Timothy J. Killeen, é um acadêmico e especialista que estuda desde a década de 1980 as florestas tropicais do Brasil e da Bolívia, onde viveu por mais de 35 anos.

  • Narrando os esforços de nove países amazônicos para conter o desmatamento, esta edição oferece uma visão geral dos temas mais relevantes para a conservação da biodiversidade da região, serviços ecossistêmicos e culturas indígenas, bem como uma descrição dos modelos de desenvolvimento convencional e sustentável que estão competindo por espaço na economia regional.

O cultivo de soja e milho trouxe benefícios adicionais para a economia agrícola de Mato Grosso porque aumentou o fornecimento e a acessibilidade de rações para os criadores de gado. Embora exista um mercado internacional robusto para ambas as commodities, o retorno potencial para os agricultores de Mato Grosso não é tão lucrativo para o milho em comparação com a soja. Isso se deve principalmente à diferença substancial entre os rendimentos do milho obtidos pelos agricultores nos Estados Unidos em comparação com os produtores no Brasil, mas também aos altos custos de transporte que limitam a lucratividade dos produtores mato-grossenses. Consequentemente, o setor agropecuário tem um forte incentivo para criar sistemas de produção de gado que convertam as commodities agrícolas em um produto com maior valor de mercado.

Os setores de aves e suínos se expandiram aproximadamente na mesma proporção que o complexo soja/milho em Mato Grosso. Em contraste, a produção avícola em Rondônia e no Pará, que (ainda) não cultivam áreas significativas de soja, diminuiu no mesmo período em ambos os estados. O Brasil é o segundo maior produtor avícola do mundo e o maior exportador de carne de frango processada. Os maiores estados produtores são Paraná, São Paulo, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, que estão mais próximos dos mercados urbanos e dos portos.

O boom da soja em Mato Grosso foi acompanhado por um aumento no cultivo de milho, que catalisou o desenvolvimento do setor pecuário, especialmente suínos e aves, ambos com crescimento anual de aproximadamente 7% por mais de duas décadas. Fonte de dados: IBGE/SIDRA.

No entanto, o Mato Grosso apresenta a taxa de crescimento mais rápida da produção de aves no Brasil: entre 2000 e 2020, a população total de frangos no Mato Grosso cresceu em média 7% ao ano, de 10 milhões para 60 milhões de aves. Cerca de 75% deles são frangos de corte (frangos criados para carne) que têm uma vida útil de seis a sete semanas, o que significa que Mato Grosso produziu cerca de 330 milhões de frangos para abate em 2020. Isso se traduz em aproximadamente 700.000 toneladas de carne, cerca de cinco por cento da produção anual de aves do Brasil.

A quantidade de milho e soja consumida pela produção de frangos de corte depende de dois fatores: a composição da ração para frangos e a taxa de conversão alimentar (FCO – feed conversion ratio), que é a métrica que os cientistas animais usam para calcular a quantidade de ração necessária para produzir um quilo de carne. A ração para frangos é composta por cerca de sessenta por cento de grãos e vinte por cento de torta de soja: a FCO para frangos de corte é de cerca de 1,67, enquanto as galinhas têm uma FCO de 2,0 por quilo de ovo. Isso sugere que a indústria avícola de Mato Grosso estava consumindo cerca de 0,8% da produção de soja do estado e cerca de 1,9% de sua colheita de milho em 2015.

A produção em escala industrial de suínos e frangos cresceu cerca de 400% nos últimos trinta anos. Credito: Rafael Tomazi/Shutterstock.com

A situação do setor de suínos é semelhante, exceto pelo fato de que os suínos de corte vivem entre seis e oito meses e têm um FCO de cerca de 2,5. Considerando o consumo de ração das porcas, um rebanho suíno de aproximadamente três milhões de porcos consumiria cerca de um milhão de toneladas de ração, o que representa cerca de 1% da produção anual de soja e 1,7% da produção de milho do Mato Grosso.

Embora o consumo local de soja e milho pelo setor pecuário não seja enorme, ele é significativo quando visto de uma perspectiva econômica. As indústrias de suínos e aves geraram cerca de US$ 1 bilhão em vendas brutas em 2020, um valor cerca de três vezes maior do que o milho e a soja não processados fornecidos a esses animais. É por isso que o setor pecuário pode ser visto como um componente de valor agregado dentro do sistema de produção de soja/milho. O setor pecuário injeta um capital significativo na economia rural, a maior parte do qual será reinvestido para expandir a produção.

Instalações industriais de produção de gado perto de Sorriso, no Mato Grosso: (a) Os estábulos de suínos são acompanhados por lagoas de tratamento de águas residuais; (b) Os galpões de aves são separados por plantações de eucalipto e um trecho de floresta remanescente. Fonte: Google Earth

O crescimento do setor pecuário foi acompanhado pela criação da infraestrutura industrial ligada a esse setor, especificamente instalações dedicadas a diferentes estágios do ciclo de vida do gado: reprodução, criação, crescimento, plantas de processamento e logística associada. O crescimento desses segmentos aumenta a demanda por soja e milho, que será atendida pela expansão por meio da extensificação ou da intensificação.

No primeiro caso, isso levará a novos desmatamentos ou, mais provavelmente, à conversão do habitat remanescente do Cerrado. A intensificação também traz o risco de degradação ambiental, seja pela conversão de remanescentes florestais dentro das fronteiras agrícolas ou pelo deslocamento de operações de pecuária de corte para a fronteira florestal. Os setores de aves e suínos podem ser vistos como impulsionadores indiretos do desmatamento porque contribuem para a expansão do setor agrícola e de carne bovina.

“Uma tempestade perfeita na Amazônia” é um livro de Timothy Killeen que contém as opiniões e análises do autor. A segunda edição foi publicada pela editora britânica The White Horse em 2021, sob os termos de uma licença Creative Commons (licença CC BY 4.0). 

Leia as outras partes extraídas do capítulo 3 aqui:

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