São 156 barragens críticas de todos os tipos em 22 estados, segundo a Agência Nacional de Águas. Em 2018, eram 68 estruturas nessa condição.
O estado de Minas Gerais responde por mais da metade dessas barragens, boa parte delas de mineradoras.
Em 2019, ano do rompimento da barragem da Vale em Brumadinho, o Brasil teve 12 relatos de acidentes e 58 incidentes com barragens em 15 estados, recorde histórico.
1.096 barragens são classificadas simultaneamente com Dano Potencial Associado (DPA) e Categoria de Risco (CRI) altos – um aumento de 20% em relação a 2018.
Relatório da Agência Nacional de Águas (ANA) mostra que o Brasil registrou aumento de 129% no número de barragens em funcionamento no país consideradas críticas. São 156 barragens críticas de todos os tipos em 22 estados. Entre essas, as barragens de rejeitos de mineração são destaque negativo.
A principal causa é o estado de conservação ruim das barragens, observado em 114 estruturas. Outras 38 barragens não têm estabilidade comprovada ou não apresentaram documentos essenciais.
Em 2019, ano do rompimento da barragem da Vale em Brumadinho, que matou 272 pessoas, o Brasil teve 12 relatos de acidentes e 58 incidentes com barragens em 15 estados, recorde histórico. 31% deles foram em Minas Gerais. Para comparação, em 2018 foram três acidentes e dois incidentes.
Tecnicamente, os órgãos consideram “acidente” o comprometimento da estrutura da barragem que leva ao colapso parcial ou total. Já “incidente” é qualquer ocorrência de menor gravidade que deve ser contida para não gerar um rompimento.
Os números, péssimos, mostram que praticamente nada foi feito desde que a barragem de Mariana se rompeu em novembro de 2015, causando o maior desastre ambiental da história do Brasil. A situação, pelo contrário, piorou nestes 5 anos.
Prova disso é que 1.096 barragens são classificadas simultaneamente com Dano Potencial Associado (DPA) e Categoria de Risco (CRI) altos, aumento de 20% em relação a 2018. Isso significa que mais de mil barragens correm risco de rompimento e tem potencial de causar enormes danos – inclusive mortes – às populações que vivem abaixo dessas estruturas.
A paralisia do Executivo e do Legislativo sobre a segurança de barragens é total. 4 projetos de lei criados após o rompimento de Brumadinho estão parados há mais de 1 ano no Senado e outros 2 projetos sofreram mudanças drásticas que favorecem mineradoras, inclusive com a participação de deputados que receberam financiamento de mineradoras nas eleições de 2014.
Minas Gerais responde por mais da metade das barragens críticas
81 das 156 barragens críticas de acordo com a ANA estão em Minas Gerais.
Isso inclui barragens administradas pela Vale que causaram a expulsão de moradores de suas casas e tiveram o nível de emergência elevado, como foram os casos de Macacos, em Nova Lima, na Grande BH, Barão de Cocais, Ouro Preto e Itabirito. No total, são 21 barragens da Vale entre as mais críticas.
Dos 70 incidentes e acidentes registrados no Brasil em 2019 (a listagem detalhada pode ser vista nas páginas 58 a 63 do relatório), 22 ocorrências foram em Minas Gerais.
Para Júlio Grillo, ex-superintendente do Ibama em MG que alertou sobre o risco de rompimento da barragem de Brumadinho e foi exonerado logo no início do governo Bolsonaro, houve uma cortina de fumaça nos anos anteriores em que tentaram passar para a sociedade a ideia de que apenas as barragens com alteamento a montante – o método mais barato, menos seguro, usado em Mariana e Brumadinho e na maioria das barragens da Vale com problemas em MG – corriam o risco de se romper.
“Isso foi bem orquestrado por parte das mineradoras para diminuir o custo que teriam com a desativação de todas as barragens. Que é o que eu acho que tem que ocorrer ao longo do tempo. Não acredito nesse negócio de pegar uma barragem instável, que pode cair, tirar a água dela amanhã e dizer que é segura. Todas as barragens com alto potencial de dano, independentemente do tipo de alteamento, deveriam ser descaracterizadas”, analisa Grillo.
De acordo com o ex-superintendente do Ibama, que participava da tomada de decisão sobre projetos de mineração em Minas Gerais em instâncias como a Câmara de Atividades Minerárias, as mineradoras conseguiram tudo que desejaram desde o rompimento de Mariana, em 2015.
E a pandemia agravou a dependência dos governos federal e de MG, do governador Romeu Zema (Novo), do setor mineral. Do ponto de vista dos governos, lembra Grillo, a mineração, considerada essencial, é um dos poucos setores da economia que estão gerando recurso.
“Os governos estão cada vez mais dependente das mineradoras. Em Minas, temos um governo submisso às mineradoras e à Fiemg (Federação das Indústrias de MG). As empresas irão tentar promover alterações nas legislações a favor delas, como já podemos observar. No caso das barragens, a prevenção e a precaução não têm sido levadas em conta. Ninguém está preocupado com nada disso, apenas com o lucro”, critica Grillo.
A maioria dos acidentes listados no relatório (páginas 103 a 107) inclui o rompimento de pequenas barragens de terra que se romperam em época de chuvas. Dois rompimentos, no entanto, foram de barragens de rejeitos de mineração, incluindo a de Brumadinho.
61% das barragens não possuem informações básicas
Outro dado preocupante do relatório é que 61% das 19.388 barragens cadastradas não possuem sequer informações suficientes para definir se são ou não submetidas à Política Nacional de Segurança de Barragens (PNSB), criada em 2010.
Ou seja: mais de 60% das barragens do país não fornecem informações mínimas como altura e tipo de outorga, licenciamento ou autorização concedida. A situação é especialmente grave no caso de barragens de água, maioria no país, com 91% do total.
A ANA reconhece que, diante disso, a segurança das barragens, no geral, “requer aperfeiçoamento”. 63% das 156 barragens críticas são de empreendedores privados, uma mudança em relação ao levantamento de 2018. As empresas são, agora, as maiores responsáveis pelas estruturas em risco no Brasil.
Fiscalização, segundo a ANA, aumentou 135%
Um contraponto apresentado pelo relatório da ANA é que as ações de fiscalização de segurança de barragens aumentaram 135% entre 2018 e 2019.
Segundo o RSB, as ações realizadas no local dos empreendimentos passaram de 920 para 2.168 iniciativas, sendo 1.287 por órgãos estaduais e 881 por três órgãos federais: ANA, Agência Nacional de Mineração e Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL). No total, o Brasil possui 33 órgãos fiscalizadores de segurança de barragens.
Em 2019, foram emitidas 1.716 autuações a 500 diferentes empreendedores por descumprimento dos regulamentos de segurança de barragens. O orçamento para essas fiscalizações, porém, permanece praticamente o mesmo em relação a 2018.
O poder público investiu R$ 94 milhões em ações de segurança de barragens em 2019, mais da metade recursos dos estados e o restante do governo federal. Segundo a própria ANA, “os valores são baixos frente à necessidade de adequada manutenção e atendimento a requisitos de segurança das barragens”.
Imagem do banner: Efeitos do rompimento da barragem de rejeitos da mineradora Samarco em Mariana (MG), em 2015. Foto: Rogério Alves/TV Senado.
Matéria originalmente publicada no Observatório da Mineração.