Nesta seção, Killeen faz um recuo dos sistemas legais que permitem que um grupo de pessoas se reúna com o objetivo de obter reparação judicial contra outra entidade por danos ao meio ambiente e à saúde dos habitantes.
Embora admita que os resultados nos países da Pan-Amazônia são irregulares, alguns exemplos no Equador, Peru, Brasil e outros estão gerando jurisprudência internacional para futuras negligências tanto das empresas extrativas quanto do Estado.
Apesar do potencial das ações civis para modificar comportamentos, dezenas de milhares de infratores das regulamentações ambientais operam fora ou à margem da economia formal.
Alguns sistemas jurídicos têm um procedimento civil que permite que um grupo de pessoas junte forças para criar uma entidade temporária (classe), que eles usam para buscar reparação judicial de outra entidade, normalmente uma corporação, por danos causados por um incidente, produto ou serviço. Conhecido como “ação coletiva”, esse tipo de litígio foi pioneiro nos Estados Unidos durante o século 20 para tratar de várias formas de má conduta corporativa e negligência grave.
Por exemplo, eles desempenharam um papel fundamental ao forçar as empresas de energia a melhorar seus procedimentos operacionais e a indenizar indivíduos por danos causados por derramamentos de óleo e despejos de resíduos tóxicos. Considerando o legado das indústrias extrativas na Pan-Amazônia, as ações coletivas representam uma estratégia em potencial para financiar a remediação das calamidades ambientais que se acumularam nas últimas cinco décadas.
Todos os países da Pan-Amazônia incorporaram aspectos desse conceito judicial em seus códigos civis; no entanto, ele foi implantado com resultados mistos, em parte devido à fraca governança judicial da região.

Em um dos casos de maior destaque, os habitantes da Província de Sucumbíos, no Equador, processaram a Texaco, posteriormente adquirida pela Chevron, pedindo indenização por danos causados por práticas que poluíram o solo e a água da região entre 1965 e 1992. Em uma complexa série de decisões judiciais envolvendo várias jurisdições, em 2009 um tribunal equatoriano decidiu contra a empresa e aplicou uma multa de US$ 9,5 bilhões. A Chevron rejeitou a decisão do tribunal, alegando práticas de corrupção por parte do juiz presidente, e recorreu da decisão em um tribunal dos EUA. A empresa não nega que suas ações prejudicaram o meio ambiente, mas afirma que obedeceu a todas as exigências legais existentes na época de suas operações e cumpriu suas obrigações com o povo do Equador. A Chevron prevaleceu em várias jurisdições, incluindo Nova York, Brasil e a Corte Permanente de Arbitragem em Haia.
O litígio civil também não conseguiu sancionar a negligência na mina de ouro de Omai, na Guiana, onde uma falha na barragem de rejeitos liberou mais de três milhões de metros cúbicos de efluentes com cianeto e metais pesados no rio Essequibo, em 1995. Um tribunal no Canadá, onde o proprietário da empresa estava domiciliado, recusou-se a considerar o caso por motivos jurisdicionais, enquanto a Suprema Corte da Guiana indeferiu o caso por falta de provas.
As tentativas de atribuir responsabilidade financeira ao complexo metalúrgico de La Oroya, no Peru, foram complicadas pela falta de clareza nos contratos entre as partes, entre elas a entidade estatal que vendeu a instalação para a Doe Run Corporation em 1993, bem como a estratégia jurídica da empresa sediada nos EUA de criar uma subsidiária e usar as leis de falência para limitar suas responsabilidades legais. Como o Estado peruano (órgãos reguladores e sistema judicial) não conseguiu resolver o conflito, em 2006 uma coalizão internacional apresentou uma queixa à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, que encaminhou o caso à Corte Interamericana de Direitos Humanos.
Em abril de 2024, essa corte decidiu que o Peru havia violado os direitos de seus cidadãos ao não lhes fornecer a proteção judicial adequada, conforme definido pela lei peruana. A decisão, após 25 anos de litígio, finalmente fez justiça aos habitantes de La Oroya, mas também estabeleceu um precedente na jurisprudência internacional ao reconhecer a responsabilidade legal e fiscal de um estado quando ele, conscientemente, deixa de tomar medidas para mitigar ou remediar um crime ambiental que viola o direito de seus cidadãos a um ambiente saudável, o que no Peru é garantido pela constituição.

O Brasil foi pioneiro em um procedimento civil comparável, porém distinto, conhecido como Ação Civil Pública (ACP), que difere das ações coletivas por se concentrar na proteção de direitos coletivos, em vez de oferecer indenização a um grupo de indivíduos cujos direitos foram violados. Em vez de depender da auto-organização dos autores da ação (geralmente catalisada por advogados em busca de honorários), a abordagem da ACP estipula que somente as instituições podem iniciar uma ação judicial; essas instituições podem incluir governos (federal, estadual e municipal), autarquias (entidades governamentais autônomas) e promotores e defensores públicos, bem como determinadas organizações da sociedade civil que tenham atuado no setor pertinente há pelo menos um ano.
A estratégia jurídica é comumente usada para proteger consumidores e funcionários, mas também tem sido usada para litigar irregularidades ambientais, culturais e financeiras. A grande maioria das ações ACP ligadas a questões ambientais foi proposta por promotores públicos, que usaram o mecanismo legal para obter compensação monetária por atos ilegais, como extração ilegal de madeira, violações do código florestal e mineração ilegal de ouro. Em um exemplo recente, o Ministério Público Federal negociou um acordo com uma empresa madeireira em nome de uma comunidade Ashaninka no Acre, resultado de vinte anos de litígio e mais de quarenta anos após a infração.
A empresa concordou com o pagamento de R$ 12 milhões para compensar a comunidade indígena pela extração não sustentável de mogno em suas terras ancestrais na década de 1980, embora os atos ilegais tenham sido cometidos antes do reconhecimento formal de seu território na década de 1990.
Nos últimos 30 anos, milhares de processos ambientais de ACP foram instaurados, muitos deles por promotores federais que trabalham em colaboração com o Ibama, para impor penalidades econômicas que têm como base um cálculo dos danos causados pelo infrator. A estratégia, que geralmente termina com um acordo negociado, gerou a maior parte das multas ambientais aplicadas pelo Estado brasileiro para impor a obediência ao Código Florestal.
Os promotores também usaram o mecanismo da ACP para interromper, pelo menos temporariamente, ações governamentais questionáveis. Por exemplo, os promotores públicos usaram a ACP para forçar os governos a cumprirem as leis aprovadas por administrações anteriores ou jurisdições superiores. O MPF usou um procedimento de ACP em 2012 para obter uma ordem judicial suspendendo o ZEE aprovado pela Assembleia Estadual do Mato Grosso, argumentando que: (a) o texto era materialmente diferente do documento técnico apresentado à legislatura; (b) a versão modificada não era compatível com o Código Florestal; e (c) não fornecia status legal para quatorze territórios indígenas. O governo estadual recorreu da decisão, e o caso ainda não foi resolvido; no entanto, o estado reiniciou o processo do ZEE em 2016 e iniciou outra rodada de consulta em 2021.

Em outro caso, o MPF processou o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) em 2010 pela distribuição inadequada (ilegal) de terras no Acre. As áreas de assentamento haviam sido criadas sem a demarcação de reservas florestais comunitárias, conforme determina o Código Florestal, ignorando a exigência de obtenção de licença ambiental. A Justiça determinou que o Incra iniciasse os pedidos de licenciamento ambiental no prazo de sessenta dias ou pagasse uma multa de R$ 200 mil por cada caso de descumprimento. Mais recentemente, o MPF usou a ACP para questionar a tentativa do governo Bolsonaro de construir uma rodovia entre Cruzeiro do Sul e a fronteira com o Peru. No entanto, os promotores nem sempre são bem-sucedidos, como evidenciado pela reversão de uma petição semelhante realizada por um juiz, o que permitiu a pavimentação em andamento da BR-319.
Até recentemente, havia poucos exemplos relatados de organizações da sociedade civil usando uma ação judicial ACP para questionar a ação do governo. Aparentemente, isso mudou durante o governo de Jair Bolsonaro, quando as ONGs se mobilizaram para se opor às suas políticas, que foram projetadas para desfazer muitas das diretrizes ambientais promulgadas nas últimas três décadas, especialmente a aplicação do Código Florestal.
Muito raramente os autores combinam uma ACP e uma ação coletiva, como no litígio em andamento contra a Norsk Hydro após a falha catastrófica de sua instalação de tratamento de resíduos em 2018 (consulte o Capítulo 5). A causa imediata do desastre foi uma forte tempestade que sobrecarregou a capacidade de armazenamento dos tanques de rejeitos da empresa, enviando uma onda de lama tóxica para treze comunidades no município de Barcarena (Pará). O monitoramento subsequente do solo e da água revelou níveis perigosamente altos de metais pesados, o que levou as autoridades ambientais estaduais a ordenar que a empresa interrompesse as operações em uma de suas três instalações industriais.
O litígio levou a uma decisão que condenou a empresa a pagar R$ 150 milhões (US$ 28 milhões) em indenizações; sem surpresa, a empresa recorreu, mas também entrou em um processo de resolução de conflitos conhecido como Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta (TAC), que a comprometeu a remediar os danos e pagar uma indenização (limitada). As comunidades não ficaram satisfeitas com o acordo e entraram com uma ação coletiva na Holanda, onde um escritório de advocacia holandês uniu as petições de 11.000 famílias que vivem perto de três operações industriais da empresa no Pará: a mina em Paragominas, a refinaria Alunorte e a fundição Albras.

A Colômbia promulgou uma lei semelhante em 1998, que estabeleceu dois procedimentos semelhantes destinados a proteger os direitos coletivos da sociedade. Um deles facilita as ações civis coletivas de maneira semelhante à pioneira no Brasil, denominadas Acciones Populares, que oferecem à sociedade um instrumento para “prevenir” danos causados por ações mal planejadas ou inadequadas; e Acciones Grupales, que permitem que grupos de indivíduos busquem indenização por danos decorrentes de uma ampla gama de atos ilícitos e negligência. A Bolívia também promulgou uma lei que permite Acciones Populares; assim como o litígio colombiano, essa medida busca apenas evitar danos, em vez de compensar eventos passados.
O Equador adotou o conceito de ação coletiva, que é implicitamente reconhecido na constituição de 2008. Ironicamente, o mecanismo de ação popular pré-existente usado para processar a Texaco/Chevron foi eliminado em uma lei de reforma processual em 2015. Em vez disso, a nova lei possibilita processar o infrator em nome da própria Mãe Natureza, já que ela foi dotada de certos direitos e proteção na Constituição de 2008. No Peru, somente as ações coletivas que tratam da proteção ao consumidor são permitidas nos tribunais civis, enquanto as reclamações ambientais devem passar pelo sistema de justiça administrativa ou criminal.
Independentemente da existência ou ausência de um procedimento legal, o uso de ações coletivas para combater a má conduta ambiental não é uma opção prática nas Repúblicas Andinas. Teoricamente, a sociedade civil poderia usar a ação coletiva para melhorar a governança, mas há muitos obstáculos, inclusive o custo de uma longa batalha legal em um sistema judicial ineficiente. Mais importante ainda, o sistema de direito civil não foi projetado para um litígio civil eficaz, pelo menos quando comparado aos sistemas de direito comum que predominam em países com tradições jurídicas anglo-saxônicas. Os sistemas judiciais latino-americanos não têm julgamentos com júri, o que elimina a capacidade da parte lesada de apelar para cidadãos com a mesma opinião, nem permitem danos punitivos, o que pode criar um poderoso incentivo econômico para mudar as práticas comerciais.
Apesar do potencial das ações civis para mudar o comportamento, dezenas de milhares de infratores das normas ambientais operam fora da economia formal (ou adjacentes a ela). Garimpeiros, piratas da madeira e grileiros não têm motivação alguma para cumprir as leis ambientais e, devido ao seu status informal, são relativamente imunes a processos civis. A única maneira realista de mudar seu comportamento é usar o sistema de justiça criminal para desativar suas atividades, confiscar seus bens e, se necessário, mandá-los para a prisão.
Imagem do banner: A diretora da escola José Pardo, localizada em Loreto (Peru), observa o piso esportivo da escola, em ruínas e sem reparos. O terreno registra vazamentos de petróleo há 20 anos. Foto: Sebastián Castañeda para Mongabay Latam.