Em cartaz até 24 de setembro no Museu Afro Brasil Emanoel Araújo, a mostra Roça é Vida conta os modos de vida e o conhecimento tradicional da comunidade Quilombo São Pedro.
São Pedro é um dos 26 quilombos reconhecidos no Vale do Ribeira, região de São Paulo que detém a maior concentração dessas comunidades no estado.
Um dos destaques da exposição é o Sistema Agrícola Tradicional do Vale do Ribeira, modelo de cultivo itinerante que alia produção e conservação da natureza, reconhecido como Patrimônio Imaterial do Brasil pelo Iphan.
“Todo quilombola que planta a semente na terra é também uma semente que está plantada no território, e no tempo livre da natureza vira ancestral e a terra o recebe. É por isso que celebramos a vida no território que a todos alimenta e acolhe.” Essa é uma das frases de destaque em uma das instalações do Museu Afro Brasil Emanoel Araújo, em São Paulo, onde está em cartaz a Roça é Vida.
Resultado de uma curadoria compartilhada junto à Associação dos Remanescentes do Quilombo de São Pedro, situado no Vale do Ribeira (SP), a mostra é inspirada nos livros Roça é Vida (2020) e Na companhia de Dona Fartura: uma história sobre cultura alimentar quilombola (2022), escritos e ilustrados por pesquisadores e educadores quilombolas e aquilombados locais.
Os visitantes podem conferir originais e ampliações das aquarelas que ilustram as publicações, além de ver e ler fotografias, poesia, sementes crioulas, objetos do cotidiano da lida roceira, e um vídeo produzido especialmente para a ocasião.
“Esta exposição compõe o rol de ações de salvaguarda do Sistema Agrícola Tradicional do Vale do Ribeira, bem como possibilita a descolonização de mentes sobre preconceitos carregados sobre nós, povo que construiu esse país, povo negro, povo quilombola”, conta Luís Marcos de França Dias, integrante da associação.
O Quilombo São Pedro compreende uma área de 4.692 hectares no município de Eldorado, em uma região onde há o maior trecho contínuo de Mata Atlântica do Brasil e a maior concentração de remanescentes de quilombos de São Paulo: das 36 comunidades reconhecidas no estado, 26 estão no Vale do Ribeira. Apenas seis delas, porém, detêm o título coletivo do território.
Praticado tanto no Quilombo São Pedro como em outras comunidades da região, o Sistema Agrícola Tradicional do Vale do Ribeira, também conhecido como coivara, é uma forma de agricultura itinerante que se baseia no rodízio das áreas de plantio. Uma área é cultivada por três a quatro anos e então é abandonada, dando espaço para que a natureza ali se regenere.
Em 2018, o Sistema Agrícola Tradicional dos quilombolas do Vale do Ribeira foi reconhecido como Patrimônio Imaterial do Brasil pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
Para o historiador David Ribeiro, que assina um dos textos expostos, a riqueza da mostra está justamente no fato de ser possível conhecer, “por meio das aquarelas de Amanda Nainá e de Vanderlei Ribeiro, dos objetos relacionados ao modo de fazer roça, bem como pelos registros do cotidiano, algumas das expressões escolhidas pela própria comunidade para comunicar aquilo que a sustenta”.
No dia da abertura da exposição, em 24 de junho, integrantes do Quilombo São Pedro estiveram no Museu Afro, onde trouxeram a importância de ocupar aquele espaço com a tradição secular que mantêm viva.
Elvira Morato, de 75 anos, nascida no quilombo onde até hoje reside, disse: “o Brasil inteiro precisa dessa apresentação para conhecer a história do nosso passado”. No vídeo veiculado no Museu, uma de suas falas é sobre legado e continuidade: “nossa identidade é a raiz dos nossos antepassados, o que deixaram para nós e estamos passando aos jovens. Não podemos acabar com isso daqui”.
Serviço
Exposição “Roça é Vida”
Período: De 24 de junho a 24 de setembro de 2023
De terça a domingo, das 10h às 17h
Local: Museu Afro Brasil Emanoel Araujo | Parque Ibirapuera, Portão 10
Avenida Pedro Álvares Cabral, s/n – Vila Mariana, São Paulo – SP
Roças quilombolas do Vale do Ribeira conciliam produção e conservação
Imagem do banner: roça de cultivo do Sistema Agrícola Tradicional do Vale do Ribeira no quilombo Nhunguara (SP). Foto: Fellipe Abreu