Antes berçário de vida marinha, a Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro, hoje agoniza com o despejo de milhares de litros de esgoto lançados em suas águas; pescadores artesanais agora sobrevivem da catação do lixo que boia na baía.
Diante de promessas fracassadas de despoluição por parte do governo, a sociedade civil se organizou, criou áreas de proteção ambiental e passou a pressionar as empresas responsáveis pelo saneamento básico no estado, ainda hoje deficiente.
Às margens da Lagoa Rodrigo de Freitas, um biólogo começou a replantar os manguezais; a vida voltou e se tornou um modelo do que pode ser aplicado em toda a Baía de Guanabara.
Às oito da manhã, o sol já queima as avenidas e os shoppings da Barra da Tijuca, bairro de classe média alta da zona oeste do Rio de Janeiro. Da pista escaldante de um aeroporto privado, helicópteros transportam turistas e executivos ao longo de um dos litorais mais bonitos e reconhecidos do mundo.
Um desses helicópteros se preparam para decolar enquanto Mario Moscatelli se acomoda no banco do passageiro e verifica seu equipamento de fotografia. Não haverá imagens do Cristo Redentor; os olhos do biólogo estão treinados para ver coisas que a maioria dos turistas prefere ignorar.
Por trás dos edifícios, revela-se uma ampla planície costeira, abraçada em três lados por montanhas de perfil dramático. Entre as brancas fileiras de torres de condomínios de luxo e as avenidas cheias de carros, estendem-se lagoas compridas, cada uma cercada por uma borda fina de manguezal. O Complexo Lagunar de Jacarepaguá é o que resta de um outrora intocado ecossistema tropical que conectava a Mata Atlântica ao redor com o oceano.
Instintivamente, o biólogo aponta sua lente para baixo, tirando fotos das lagoas num ponto onde o azul da água se mescla a um verde brilhante. A cor estranha é evidência de altos níveis de cianobactérias que prosperam em material orgânico — neste caso, milhares de litros de esgoto. Aparentemente despreocupados, jet skis cruzam a mistura tóxica em frente a mansões de estilo ibérico com quadras de tênis e piscinas. Degradada ao longo de décadas de expansão urbana febril, a chamada Veneza Carioca, em seu estado atual, é apenas o sintoma de um problema muito maior.
Uma baía morta
Da cidade partida aos pés do Maciço da Tijuca, passando pelos bairros populares da Baixada Fluminense, até as enseadas de Niterói, a paisagem revela toda a extensão da tragédia: a Baía de Guanabara, porta de entrada histórica para o Rio de Janeiro, é parte de um Patrimônio Mundial da Unesco e um dos ecossistemas costeiros mais poluídos do mundo.
Ao longo de toda a borda oeste da baía, uma lama doente jorra de uma dúzia de canais poluídos. A maré está baixa e do alto avista-se o leito da baía, coberto por uma espessa camada de lodo negro. Décadas de esgoto sem tratamento produziram sedimentos em alguns lugares com até alguns metros de profundidade. Dos manguezais nativos que cobriram o litoral carioca, restam poucos aqui. O que existe no entorno do câmpus da Universidade Federal do Rio de Janeiro e da Ilha do Governador se deve, em parte, aos esforços do biólogo Moscatelli para reativar esse ecossistema.
Há décadas, Moscatelli luta para preservar o que resta dos manguezais nativos do Rio. Seu renascimento é mais uma frente na guerra global contra as mudanças climáticas causadas pela espécie humana.
“Quando você sobrevoa os manguezais, você vê eles cheio de lixo”, lamenta Moscatelli. “O que eu levo 20 anos [para construir], um cara destrói em uma semana. E não há reação do governo, apesar da lei ser clara na proteção desses ecossistemas.”
Moscatelli, que também ensina as crianças sobre a importância dos manguezais, resume o valor desse ecossistema de uma forma que qualquer um possa entender: “Eu vejo uma maternidade, uma área de reprodução da vida marinha. Tem um supermercado aqui, tem comida de graça. Você tem toda essa flora e fauna, direta ou indiretamente, relacionada a isso aqui. Se você cortar a árvore, não tem a folha. Se você não tem a folha, não tem como alimentar toda essa teia da vida.”
Os manguezais são incrivelmente eficientes no sequestro de dióxido de carbono, até quatro vezes mais do que a Floresta Amazônica. Além de filtrar as toxinas do solo e da água, suas raízes profundas fornecem uma barreira natural e eficaz contra a erosão costeira causada pelo aumento do nível do mar. “Isso aqui é a primeira linha de defesa”, afirma Moscatelli.
Mas essa não é, infelizmente, a visão da maioria. “No Rio de Janeiro, as pessoas associam a palavra mangue a algo fedorento, degradado”, diz o biólogo, lembrando que o Canal do Mangue, no centro da cidade, foi onde a corte real portuguesa desembarcou no Rio após fugir da invasão de Napoleão, em 1808. Então conhecido como Mangue de São Diogo, o canal foi posteriormente aterrado, tornando-se uma vala e área de prostituição.
“O manguezal era visto como algo podre, enquanto o aterramento lembra o Aterro do Flamengo, que é aquela coisa bonita e organizada”, diz Moscatelli, referindo-se a um popular parque à beira-mar do centro da cidade, construído com terra retirada de morros próximos para expandir o patrimônio edificável do capital.
Em língua tupi, Guanabara é “seio do mar”. Muito antes da chegada dos europeus, inúmeras gerações se beneficiaram da generosidade deste porto natural protegido por montanhas circundantes e densas florestas. Os exploradores portugueses maravilharam-se com suas flores perfumadas e os inúmeros peixes, crustáceos, tartarugas-marinhas, baleias e golfinhos. Acreditando que a baía fosse um estuário, foi batizada como Rio de Janeiro em 1502 e a colônia ali fundada logo se tornou porta de entrada para um Brasil nascente.
Cinco séculos depois, a baía que hoje banha a cidade é outra, muito diferente: hoje a Baía de Guanabara vê 18 mil litros de esgoto< lançados em suas águas a cada segundo. Quase metade de todas as águas residuais na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, com sua população de mais de 13 milhões de habitantes, não é tratada. Lixo doméstico, resíduos industriais, eletrodomésticos, móveis e até cadáveres podem ser encontrados boiando nas águas turvas da Guanabara — que ainda hoje também se recuperam dos impactos de um derramamento de 1 milhão de litros de petróleo bruto em 2000.
Quase todas praias da Guanabara, tanto no Rio quanto em Niterói, estão impróprias para banho, enquanto um verdadeiro cemitério de navios abandonados despeja quantidades desconhecidas de produtos químicos perigosos na baía. Os nativos botos-cinza (Sotalia guianensis), que decoram o brasão da cidade, praticamente desapareceram. Dos cerca de 400 que ali viviam na década de 1980, estima-se que apenas 30 sobrevivam.
Plantador de manguezais
E, no entanto, a Guanabara resiste, um testemunho vivo da resiliência e capacidade de renovação da natureza. Um pilar central dessa resistência têm sido os esforços dedicados e destemidos da sociedade civil, incluindo movimentos populares, acadêmicos e defensores de políticas públicas. E incluindo, também, Mario Moscatelli.
Ainda adolescente, Moscatelli estabeleceu uma relação especial com a natureza, passando o tempo mergulhando e pescando perto de Angra dos Reis, destino turístico a algumas horas do Rio. Nascido e criado em Copacabana, ainda sem estudar biologia, ele entendeu a importância de manter intacto o manguezal. “Quando eu via algum trecho do litoral da Ilha Grande sendo ocupado, sabia que era um trecho a menos onde eu poderia pescar.”
Após a formatura, o biólogo iniciante conseguiu um emprego na prefeitura de Angra fazendo fiscalizações ambientais. Conseguiu financiamento da Alemanha para iniciar um projeto de reflorestamento, plantando manguezais em áreas degradadas. Mas seu trabalho de conservação o colocou em desacordo com aqueles que queriam lucrar com o desenvolvimento de um litoral protegido. Primeiro vieram as intimidações, depois as ameaças de morte. “Só podia ir para Angra com proteção policial. Minha vida literalmente virou um inferno.”
Forçado a fugir para defender a natureza, Moscatelli esperou um ano e meio na Alemanha para voltar a Copacabana em 1989. Lá viu a oportunidade de reviver a Lagoa Rodrigo de Freitas, que, apesar de existir em um dos bairros mais nobres da cidade, havia sido abandonada pelas autoridades locais. Quando menino, seu pai o levava lá nos fins de semana para um parque de diversões local, mas desde então se tornou um depósito de lixo.
Por meio de pesquisas, ele descobriu que a lagoa tinha um mangue nativo havia cerca de 150 anos. Com a experiência adquirida em Angra, Moscatelli transformou o apartamento dos pais em viveiro. Enchendo a mala do carro pequeno de seu pai com mudas de mangue, ele as levou até a lagoa, pisou na lama e começou a plantar. “As pessoas diziam que eu era louco.”
Simultaneamente, o biólogo começou a investigar o que estava por trás da poluição e descobriu que a Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro, a Cedae, jogava esgoto sem tratamento direto na Lagoa Rodrigo de Freitas. “Comecei a brigar com a grande estatal, que era paga para fazer saneamento naquela região, mas não fazia direito.”
Antes da era das redes sociais, Moscatelli ia às emissoras de TV, jornais e rádios para divulgar o que estava acontecendo com a lagoa. Em 2000, na ocasião de uma grande mortandade de peixes, ele entregou toda a diretoria da estatal à Polícia Federal. “Na época, eu era assessor do secretário estadual de Meio Ambiente. Claro, perdi o emprego.” Com ajuda do Ministério Público, o biólogo conseguiu por fim obrigar a Cedae a substituir sua infraestrutura de tratamento de esgoto, havia anos sem receber manutenção.
Graças a esses esforços de limpeza e aos manguezais replantados, a vida voltou à lagoa. Caminhando ao longo da lagoa, hoje é possível ver capivaras, aves aquáticas e pequenos peixes compartilhando um ambiente limpo e saudável, muito longe do esgoto a céu aberto onde Moscatelli começou a plantar há mais de trinta anos. O projeto tem sido uma rara história de sucesso, mas a esperança é que este seja o começo de uma iniciativa mais ampla.
Atualmente, Moscatelli administra diversos projetos de reflorestamento nas lagoas cariocas e às margens da Baía de Guanabara, além de realizar monitoramentos aéreos regulares e palestras com escolas locais para conscientizar as novas gerações sobre a importância de um manguezal saudável. “A Lagoa Rodrigo de Freitas é um exemplo, um microcosmo do que pode ser feito nas lagoas da Tijuca e na Baía de Guanabara. É apenas uma questão de escala.”
Pescadores transformados em catadores
Em outra frente na batalha pela revitalização da Baía de Guanabara, trabalha Sergio Ricardo Potiguara. Nascido no sertão potiguar e vivendo no Rio de Janeiro desde os 18 anos, o ecologista começou cedo sua luta: logo após a conferência ECO-92, ele ajudou a reviver o movimento popular Baía Viva, que teve suas origens no ativismo ambiental e democrático durante a ditadura militar.
Em 1984, o Baía Viva foi fundamental na luta para obter o status de proteção para o manguezal original remanescente na Baía de Guanabara, a Área de Proteção Ambiental de Guapimirim, com 13.926 hectares, no extremo nordeste da baía. É aqui que os últimos botos-cinzas buscam refúgio.
Como líder do Baía Viva, Potiguara faz campanhas públicas há décadas pela justiça ambiental e pelos direitos das comunidades que sofrem as piores consequências de sua destruição. Local de alimentação e reprodução de peixes e crustáceos, um manguezal saudável como o que antes existia na Guanabara foi o responsável por sustentar inúmeras gerações de pescadores artesanais, desde os primeiros habitantes da região, os indígenas do povo Tupinambá.
Hoje, nem os Tupinambá do Guanabara existem mais e nem os peixes que antes lhes servia de alimento. Em tempos econômicos difíceis, como a recessão de 2014-2018, a pandemia de covid-19 e agora o atual período de estagflação, famílias mais pobres do Rio poderiam fazer da pesca uma fonte de renda. No entanto, numa trágica ironia, até aqueles que antes eram pescadores hoje são obrigados a catar latas e garrafas do litoral poluído da baía para sobreviver. Muitos sofrem de efeitos na saúde associados ao contato prolongado com água tóxica, como erupções cutâneas, disenteria e câncer.
Potiguara cita um estudo recente que estima que o custo econômico anual provocado pela poluição da baía, para o estado, é de pelo menos R$ 31 bilhões por ano devido à perda da pesca, somando o peso no sistema de saúde e desvalorização imobiliária.
“Em uma região metropolitana com pobreza muito alta, como a situação das comunidades de pescadores, dois em cada três jovens não trabalham nem estudam”, diz Sérgio, “A recuperação ambiental da Baía de Guanabara é importante não só do ponto de vista ecológico, mas também para a saúde pública e para a economia do Rio de Janeiro.”
Mesmo enfrentando ameaças e intimidações por seus esforços, o movimento Baía Viva continua apoiando as comunidades pesqueiras na organização da resistência, como a luta pela reparação do desastre do derramamento de óleo da Petrobras em 2000. Décadas depois, os pescadores ainda encontram óleo em suas redes.
Águas privatizadas
Potiguara atribui a maior culpa ao governo do estado do Rio de Janeiro, que prometeu limpar a baía primeiro em 1995. Desde então, a situação só piorou. “Na época, era roubo generalizado. Fizemos um relatório e uma denúncia à Assembleia Legislativa. Uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) foi instalada e concluiu que mais de 300 milhões de reais foram desperdiçados em obras superfaturadas, ou seja, roubadas. Exatamente o que faltava para concluir as obras de saneamento básico.”
Depois vieram as Olimpíadas do Rio, em 2016. “Naquela época, o Baía Viva falava sozinho na mídia. Ninguém se importava com a gente. Por que? Porque o Rio de Janeiro estava recebendo um investimento de cerca de 60 bilhões de reais,” diz ele, relembrando os dias inebriantes de otimismo. “Havia obras por toda parte, muito dinheiro entrando, empregos, cooptação da classe política”.
Uma das promessas do megaevento era a proposta de despoluição do Guanabara e a desativação do lixão do Jardim Gramacho, outrora o maior da América Latina (agora ao lado de um dos projetos de reflorestamento de Moscatelli). “Eles usaram dinheiro público para financiar grandes empresas privadas a construir novos aterros sanitários, em vez de implementar a coleta seletiva ou o tratamento do chorume”, diz o ecologista.
A ressaca olímpica da farra de gastos públicos e os consequentes escândalos de corrupção foram seguidos pela pior recessão em décadas, junto com a queda do preço do petróleo, combustível principal do motor econômico do Rio. O estado estava falido, incapaz de pagar professores, médicos ou policiais. Para evitar o colapso social, o governo procurou algo para pagar suas dívidas.
“Na década de 90, o estado do Rio de Janeiro já havia privatizado todos os seus serviços”, lembra Potiguara. “Privatizaram as balsas, o trem, o metrô.” Tudo menos a joia da coroa, a Cedae. Inicialmente, houve resistência dos sindicatos e da sociedade civil, preocupada com a venda massiva de empregos e ativos públicos para o capital estrangeiro. Mas, em meio à pandemia de covid-19, foi aprovada a revisão da lei federal do Marco Legal do Saneamento, permitindo a privatização dos serviços de tratamento de esgoto no Rio de Janeiro.
Em junho de 2021, após décadas de promessas quebradas de limpar a Guanabara, o governo do Rio vendeu um de seus ativos mais lucrativos. A Cedae foi dividida em quatro blocos e vendida por um total de 22,6 bilhões de reais, pouco mais da metade do valor esperado, por um prazo de 35 anos. O próprio leilão foi financiado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) com recursos públicos, levantando dúvidas sobre sua legalidade. “Isso aconteceu nos primeiros seis meses da pandemia e ninguém podia protestar, ninguém podia reclamar”, lamenta o ecologista. “Foi vendido a preço de banana.”
A estatal continua no controle da captação de água e tratamento de água potável, mas as partes mais lucrativas da empresa, a distribuição e tratamento de esgoto, agora estão em mãos privadas. Uma das concessionárias, a Iguá Saneamento, empresa privada de serviços de água e esgoto, pertence a fundos de pensão canadenses, que recentemente foram alvo de críticas públicas naquele país por investimentos antiéticos.
A Cedae era alvo de críticas à sua ineficiência, disfunção e corrupção há muito tempo. Vários projetos de infraestrutura financiados pelos contribuintes caíram em desuso ou foram completamente abandonados. As novas concessões privadas com fins lucrativos afirmam que sua responsabilidade com os acionistas e suas obrigações contratuais com o estado os obrigará a cumprir, o que é conhecido no jargão empresarial, seus “compromissos ESG” (Ambientais, Sociais e de Governança).
A reorganização corporativa e o influxo de capital estrangeiro já mostrou resultados: em 2022, pela primeira vez em décadas, a Baía de Botafogo, vizinha ao Pão de Açúcar, se tornou segura para banho graças a uma rede de esgoto reformada. Outras melhorias nas estações de tratamento e linhas coletoras estão em andamento em toda a região metropolitana do Rio.
Mas enquanto as concessionárias prometem tratar 90% de todas as águas residuais até 2033 e investir um total de 30 bilhões de reais ao longo de trinta anos para melhorar o saneamento, menos de 6% desses fundos são reservados para as cerca de mil favelas cariocas. Somando 1,5 milhão de pessoas, cerca de um quarto da população da cidade vive em comunidades com pouco acesso a serviços públicos como água e saneamento.
A Águas do Rio, uma das concessionárias que venceu dois dos quatro blocos decorrentes da venda da Cedae, informou após seu primeiro ano de operação que seus investimentos evitaram “o lançamento diário de 1 milhão de litros de esgoto bruto em rios, canais e na Baía de Guanabara”. Com base nas estimativas mais recentes de 2014, isso equivale a apenas 0,06% do total.
O biólogo Moscatelli continua cautelosamente otimista. Seus projetos estão se expandindo e evoluindo. Ele garantiu financiamento e parceria com duas das concessionárias, Águas do Rio e Iguá Saneamento, como parte de seus compromissos ESG. A primeira patrocina as obras de manutenção da Lagoa Rodrigo de Freitas e a outra financia um projeto-piloto de revitalização da Lagoa do Camorim, na Barra da Tijuca.
Uma terceira parceria com a Gás Verde, produtora de biocombustíveis que assumiu o aterro sanitário desativado de Gramacho, na Baixada Fluminense, apoia os esforços de Moscatelli para recuperar manguezais em uma área fortemente industrializada e com alguns dos piores níveis de poluição de toda a Baía de Guanabara. Trabalhadores caminham pela lama até os joelhos para plantar sementes ao lado de uma área controlada por traficantes armados e depósitos de lixo clandestinos invadindo a floresta, tudo à vista de um enorme complexo petroquímico.
“É uma gota no mar do que precisa ser feito”, admite Moscatelli, acrescentando que o trabalho tem prejudicado sua saúde. Ele lutou recentemente contra um linfoma, mas já se recuperou. Ele culpa o estresse de seu trabalho. “É um chamado, apesar dos perigos, apesar dos desafios. Eu escolho insistir”, diz ele sobre seu compromisso. “Algumas pessoas ouvem e não respondem, outras ouvem e respondem. A intensidade dessa resposta varia de pessoa para pessoa. A minha resposta está aqui.”
Seus olhos cansados contemplam a primeira árvore que ele plantou há mais de trinta anos na beira da lagoa onde seu pai o trouxe pela primeira vez quando era menino. Ele já faleceu, mas a árvore à beira da Rodrigo de Freitas agora está alta e saudável. Um casal de aves aquáticas desliza serenamente na superfície da água límpida. “Quando estou deprimido, venho aqui e converso com eles. Eles dizem ‘pô, Moscatelli, calma, calma. Vamos lá, vamos continuar. Estamos aqui.’”
https://brasil-mongabay-com.mongabay.com/2022/08/sul-do-brasil-ve-o-retorno-dos-peixes-apos-proibicao-da-pesca-de-arrasto/
Imagem do banner: Colônia de pescadores Z-11, em Ramos, um dos pontos mais poluídos da Baía de Guanabara. Foto: Andrew Johnson.