Espécies nativas estão em risco de ficar em vias de extinção, ou mesmo de se tornarem extintas, como consequência da caça excessiva, devido ao predomínio do consumo da carne de caça em / nas fronteiras internas da Amazónia brasileira.
Estudos efetuados demonstram que muitas das espécies selvagens em florestas tropicais continuam a diminuir devido à caça, e que os habitantes, normalmente, incluem essas espécies na sua dieta.
A pobreza nas áreas urbanas da Amazónia brasileira é vasta, o que pode explicar o consumo regular de fauna nativa.
Quando vemos imagens de satélite das florestas tropicais do Brasil aparentemente verdejantes e densas, ficamos com a impressão de que aquelas árvores estão cheias de fauna e flora. E se o que estamos a ver é, de facto, uma floresta vazia?
De acordo com um estudo recente publicado na revista Conservation Letters, esta possibilidade está já a tornar-se uma realidade nas fronteiras internas da Amazónia no Brasil — consideradas municípios com mais de 90 por cento da cobertura original da floresta ainda intacta.
Para onde vão os animais? Muitos estão a ser comidos pelos habitantes.
Espécies nativas estão em risco de ficar em vias de extinção, ou mesmo de se tornarem extintas, como consequência da caça em excesso, devido ao predomínio do consumo da carne de caça em / nas? fronteiras externas à Amazónia brasileira, declaram investigadores. “O rápido crescimento de áreas urbanas e os recursos inadequados para impedir o consumo ilegal nesta selva urbana”, é o cerne da questão.
“Um inquérito representativo de duas cidades externas à fronteira indicou que praticamente todas as famílias urbanas consomem fauna selvagem, incluindo peixe (99%), carne de caça (mamíferos e aves; 79%), quelónios (48%), e caimões (28%) — o que constitui uma prova alarmante de caça de animais selvagens acima do esperado”, declara o investigador britânico Luke Parry, e os investigadores brasileiros, Jos Barlow e Heloisa Pereira.
O artigo propõe várias soluções para contornar o problema: “A governação ambiental inovadora poderia limitar o consumo de fauna selvagem apenas a espécies com uma taxa de população elevada”, com responsáveis pela tomada de decisões implementando políticas e estratégias “para promover a luta contra a pobreza e oferecer aos habitantes desfavorecidas alternativas económicas ao consumo de fauna”.
As florestas tropicais apresentam altos níveis de biodiversidade e contêm múltiplas espécies em vias de extinção. Na medida em que a urbanização da Amazónia brasileira aumentou ao longo do tempo, muitos ambientalistas assumiram que a caça em excesso iria diminuir. Contudo, estudos demonstram que muitas espécies selvagens da floresta tropical continuam a diminuir devido à caça, e que os habitantes incorporam regularmente estas espécies nas suas dietas.
Uma das razões para tal é a pobreza: Em todo o mundo, o consumo de carne de caça está ligado à falta de dinheiro, porque caçar é um modo mais barato e mais rápido de obter comida do que manter gado ou peixe em cativeiro, o que é difícil de fazer em áreas urbanas. A pobreza está espalhada nas áreas urbanas da Amazónia brasileira, o que pode explicar o consumo contínuo de fauna selvagem nativa.
Parry e a sua equipa tentaram saber mais sobre os hábitos alimentares urbanos no que diz respeito à carne de caça, lançando um inquérito a duas cidades no Estado do Amazonas: Borba e Novo Aripuana. Distribuíram questionários a 153 domicílios que incluíam questões acerca de fatores socioeconómicos, bem como consumo de fauna selvagem no ano anterior. Também incentivaram os domicílios a participar em atividades para mostrar claramente as suas preferências alimentares.
Os resultados revelaram que o consumo de carne de caça não está, definitivamente, a diminuir. De acordo com o estudo, cerca de metade dos domicílios urbanos nas duas cidades comem carne de caça pelo menos uma vez por mês, e aproximadamente 80% dos domicílios urbanos comeram carne de caça no último ano.
Isto não quer dizer que todas as espécies da floresta tropical estejam ameaçadas igualmente pela caça. O estudo mostrou que as práticas de consumo variaram bastante entre diferentes animais, e dependem em grande parte em termos de preferência de gosto. Enquanto 99% dos domicílios consumiram peixe no último ano, apenas 28% comeram caimão, por exemplo.
“O tapir e a queixada, ambos ungulados de grande porte, são extensamente consumidos em cidades e são talvez preferidos por caçadores devido ao seu tamanho (muita carne), e por consumidores pelo seu sabor… [enquanto que] a procura urbana pelo consumo de macacos é relativamente limitada”, relatou Parry à Mongabay.
Havia também uma grande disparidade nos tipos de famílias de consumo. Parry e a sua equipa descobriram que o consumo de fauna selvagem está ligado à situação económica, com famílias desfavorecidas a recorrer significativamente mais à pesca e à caça do que as famílias mais favorecidas.
Agora que a escala do problema foi determinada, Parry e a sua equipa têm soluções propostas. Uma das mais importantes é a necessidade de regulações e aplicações ambientais deverem ser controladas para limitar o consumo às espécies com taxa de população elevada. Isto iria proteger as espécies ameaçadas. Além disso, é preciso oferecer aos habitantes mais pobres alternativas alimentares económicas à carne de caça, e proporcionar oportunidades concretas para a luta contra a pobreza.
Embora a redução do consumo de fauna selvagem seja um grande compromisso, é crucial manter a biodiversidade na região, de acordo com Parry. “Desenvolver soluções conducentes à remoção total de fauna é essencial para impedir extinções, manter a integridade de ecossistemas e, igualmente importante também, é manter o sustento dos exploradores de recursos e o bem-estar e a segurança alimentar dos consumidores”.
Citações:
Parry, L. Barlow, J. Pereira, H. (2014) Wildlife Harvest and Consumption in Amazonia’s Urbanized Wilderness. Conservation Letters, 7(6): 565-574
Revisão: Fernando Ferreira Alves, Diretor de curso Línguas Aplicadas, Universidade do Minho.