Garimpos na Amazônia venezuelana ameaçam a biodiversidade e grupos indígenas
Garimpos na Amazônia venezuelana ameaçam a biodiversidade e grupos
indígenas
Rhett Butler, mongabay.com
29/2/2008
Garimpeiros na bacia do rio Caroni |
Problemas estão acumulando numa das mais belas paisagens da terra. No
fundo da Amazônia venezuelana, entre montanhas tipo topo de mesa com florestas
antigas conhecidas como tepuis, rios cristalinos, cachoeiras deslumbrantes,
garimpeiros de ouro ilegais estão ameaçando um dos maiores blocos
restantes de natureza intata do mundo, que é o lar de povos indígenas
e de níveis extremamente altos de diversidade biológica. Como
a situação está piorando – uma série de ataques
têm feito vítimas em ambos os lados, garimpeiros e povos indígenas
– uma organização científica de liderança tem chamado
o governo venezuelano para tomar as devidas providências.
O drama está acontecendo no estado de Bolívar no sul da Venezuela,
perto da fronteira com Brasil e a Guiana, na bacia hidrográfica dos Rios
Caroni e Caura. O rio mais para o sul, o Caura, é o segundo maior rio
drenando o escudo da Guiana, planalto que separa as bacias do rio Amazonas e
Orinoco. Caraterizada por várzea tropical, a bacia do rio Caura tem níveis
impressionantes de diversidade biológica — 2600 espécies de plantas
vasculares, 168 espécies de mamíferos, 475 espécies de
aves, 34 espécies anfíbios, 53 espécies de répteis
e 441 espécies de peixes, foram identificadas até a data de hoje
— e armazena cerca de 700 milhões de toneladas de carbono, ou aproximadamente
o montante liberado por 162 milhões de automóveis em um ano.
A região também é lar de tribos indígenas – incluindo
as Ye’kwana, Sanema e Hoti -, que dependem totalmente de água potável,
alimentos e transporte dos rios locais. Sendo essa uma das partes mais isoladas
da Amazônia, estes índios vivem na maioria em formas tradicionais.
Um problema Dourado
Um acidente de geografia pôs essa biodiversidade e as populações
indígenas em risco. O escudo da Guiana é incrivelmente velho,
com rochas expostas da época precambriana, cerca de 600 milhões
de anos atrás. Essa geologia, como a de partes da África Ocidental,
Austrália Ocidental, e os escudos brasileiros, produz ricas jazidas de
ouro, diamantes, ferro e bauxita. Enquanto as primeiras tenham sido exploradas
a muito tempo, a última região tem sofrido, desde o início
dos anos 90, uma corrida comparável às de ouro do século
19, nos Estados Unidos, Austrália, Canadá, Nova Zelândia
e África do Sul. Grande parte desta corrida ocorreu no estado brasileiro
de Roraima, mas, nos últimos anos, garimpeiros informais passaram todas
as fronteiras, apenas ligeiramente patrulhadas, para os países vizinhos
do norte da América do Sul.
Garimpos: antes e depois
A bacia do rio Caura, ainda prístino.
A bacia do rio Caroni, após dos garimpos. |
Dr. David Hammond, o responsável pela NWFS Consultoria, está
estudando as consequências ambientais e socioeconômicas da utilização
de terras na região há mais de 15 anos. Ele diz que a mudança
é motivada por duas mudanças significativas, uma é a repressão
da mineração ilegal no Brasil e a outra é um surto global
de preços de ouro.
"Duas coisas importantes aconteceram, uma no Brasil e outra na cena mundial,
que mudaram a dinâmica regional de ouro", explicou Hammond. "Com
a eleição de Lula da Silva, um declínio notório
da mineração em garimpos, ou artesanal, tem ocorrido com o aumento
do controle da integridade de reservas de índios e execução
das leis nacionais de uso da terra. Consequentemente, esses garimpeiros agora
se mudaram através da fronteira do norte do Brasil, extremamente porosa
e praticamente sem controles, para Venezuela, Guiana, Suriname e Guiana francesa."
"Ao mesmo tempo, o preço internacional do ouro está aumentoando
continuadamente. Isto torna a mineração de ouro, de depósitos
de baixa concentração, económica. A região possui
recursos significativos de ouro, mas a maioria dos depósitos inexplorados
é de baixa conbcentração. Os acontecimentos na Bacia hidrográfica
do Caura é o exemplo mais recente de uma dinâmica em curso na maior
parte das áreas florestais no nordeste da América do Sul",
disse Hammond.
Preocupações ambientais
Rio acima da área do garimpo |
Apesar do fato que na Venezuela e Suriname grande parte da área está
protegida nominalmente no papel, na realidade os parques nacionais estão
se tornando salpicados com colonias ilegais, pistas clandestinas de pouso, de
vez em quando utilizadas pelo tráfico de drogas e outros contrabandos,
e garimpos de pequena escala. Nas proximidades do rio Caroni e em outras áreas,
este setor de mineiração informal tem um impacto significativo
para o meio ambiente. Isso provavelmente deve se repetir na bacia do rio Caura
que em Setembro foi invadida por mais de 600 garimpeiros.
Miners rely heavily on hydraulic mining techniques, blasting away at river
banks with high-powered water cannons and clearing forests to expose potential
gold-yielding gravel deposits. Gold is usually extracted from this gravel using
a sluice box to separate heavier sediment and mercury used to amalgamate the
precious metal. While most of the mercury is removed for reuse or burned off,
some invariably ends up in rivers.
Garimpeiros dependem fortemente de técnicas hidráulicas de mineração,
removendo as beiradas dos rios com canhões de água de alta prssão
e desmatando florestas para expor o cascalho com possiveis depósitos
de ouro. Ouro normalmente é extraído deste cascalho usando caixas
com comportas para separar sedimentos mais pesados e mercúrio para amalgamar
o metal precioso. Embora a maior parte do mercúrio é queimado
ou removido para reutilização, uma certa quantidade de mercúrio
invariavelmente acaba indo para os rios.
"O principal problema com este tipo de mineração de ouro
é que ele é quase inteiramente sem gerenciamento em todos os aspectos,"
explicou Hammond. "As vendas de mercúrio estão mal regulamentadas
e sua utilização é generalizada. Na maioria dos casos a
recuperação do mercúrio, através da utilização
de retortas, não é usado. Como resultado, os operários
inalam vapor de mercúrio, vapor de mercúrio é depositado
sobre muitas áreas e o mercúrio líquido faz seu caminho
para o ambiente aquático. Uma vez lá, é metilado, absorvido
por alimentadores bentônicos, que depois são comidos por peixes
predadores, e, em seguida, entram na cadeia alimentar.
Rio abaixo da zona mineira informal. Nota significativamente os níveis
|
Hammond diz que a bioacumulação de mercúrio no peixe representa
ameaças à saúde das pessoas que vivem rio abaixo.
"Peixes representam a maior parte da proteína na dieta dos moradores
locais, criando uma acumulação bem documentada, especialmente
nas crianças", disse "Os impactos do mercúrio em seres
humanos são bem conhecidos". Acumulação de mercúrio
em seres humanos foi vinculado a lesões neurológicas e malformações
de crianças no parto.
"Além disso", acrescentou Hammond ", sitios de mineração
mal geridos criam condições ideais para procriação
de mosquitos, tornando acampamentos de garimpeiros o lugar principal de transmissão
de doenças suportadas por vetores. Estas doenças [malária,
dengue] são, em seguida, espalhadas ainda não tratadas quando
os garimpeiros retornam a suas comunidades e famílias."
Hammond diz que estes efeitos são de longa duração.
"Para deixar isso bem claro: até hoje existem lagos nas montanhas
da Sierra Nevada na Califórnia que permanecem proibudos para pesca e
natação devido ao uso descontrolado de mercúrio durante
a corrida de ouro na Califórnia mais de 120 anos atrás. Esses
lugares continuam com bioacumulação tóxica de mercúrio,
e acordo com estudos realizados pelo Geological Survey dos Estados Unidos (USGS)."
Ambos, resíduos sólidos e líquidos, contaminarm áreas |
Os garimpos podem também trazer outras formas de destruição.
Sedimentos dissolvidos e agitados por atividades garimpeiras causam efeitos
perniciosos sobre flora e fauna aquática, enquanto interferindo com navegação
fluvial e representando riscos para operações hidrelétricas,
como a barragem de Guri, a segunda maior represa hidrelétrica do mundo,
situada na Bacia hidrográfica do rio Caroni. Em terra, a recuperação
da floresta após o desmatamento pode ser impedida pelo solo danificado
e áreas florestadas anteriormente podem ser transformadas em cerrado
– propenso ao fogo quando árvores falham de se recolonizar uma vez gramíneas
duras tomam conta do terreno. Jaqueline Farías, Ministra do Meio Ambiente
da Venezuela, disse no mês passado que vai demorar 300 anos para reflorestar
as áreas desmatadas na região e 70 anos para descontaminar áreas
poluídas pelos garimpeiros.
Cada vez mais sangrento
Além do impacto ambiental, os garimpos estão provocando uma agitação
social na Bacia do rio Caura. Nos últimos meses centenas de garimpeiros
dos estados brasileiros Pará, Amapá e Mato Grosso, mas também
da Venezuela, Guiana e Colômbia entraram nas florestas venezuelanas –
esta situação é repetida no sul da Guiana, Suriname ocidental,
e Guiana Francesa (onde garimpeiros estão implicados no assassínio
de dois guias de ecoturismo na Reserva Natural de Nouragues). Após dos
garimpeiros ter lançados uma campanha de intimidação contra
grupos indígenas, que envolveu incêndio premeditado, ameaças
de morte, e destruição de aldeias, o governo venezuelano enviou
militares. Mal supervisionados, soldados atiraram e mataram seis garimpeiros
e possivelmente participaram no afogamento de quatro outros. Enquanto todos
estes soldados foram detidos, esta calamidade foi um retrocesso para os esforços
de despejo. Os garimpeiros simplesmente mudaram-se para a cidade aguardando
a saída das tropas, esperada para acompanhar as eleições
nacionais em 3 de Dezembro.
"Embora nos apoiamos as ações do governo com o exército
para expulsar garimpeiros da bacia hidrográfica do rio Caura, não
apoiamos o assassinato de garimpeiros como ocorreu na bacia hidrográfica
do rio Paragua", disse o Dr. Judith Rosales, uma bióloga da Universidade
Nacional Experimental de Guayana. "Evidentemente os soldados ficaram fora
de controle e agora eles estão sob custódia. Mesmo assim não
podemos deixar este acontecimento nos distrair da mineração ilegal
em áreas protegidas e de ataques a aldeias indígenas e ambientalistas."
Organização científica exige uma ação
Considerando estes últimos desenvolvimentos, a Associação
de Biologia Tropical e Conservação (ATBC), a maior organização
científica do mundo dedicada ao estudo e à proteção
dos ecossistemas tropicais, com membros em mais de 70 países, aprovou
uma resolução apelando ao governo da Venezuela a tomar medidas
contra mineração ilegal na Bacia do rio Caura. ATBC espera que,
destacando incursões ilegais na Venezuela, pode trazer a atenção
para desenvolvimentos semelhantes em toda a região do escudo da Guiana.
Mineração hidráulica em garimpo.
|
A resolução da ATBC insiste que o governo venezuelano aplique
as leis atuais que o obrigam a proteger os ecossistemas florestais e a biodiversidade,
bem como defender os direitos dos grupos indígenas atualmente ameaçados
por garimpeiros.
"Noventa e cinco por cento do território da bacia do rio Caura
é classificado em diferentes categorias do ABRAE [um sistema de áreas
protegidas na Venezuela], incluindo a Reserva Florestal e de uma quantidade
grande de estrita conservação", disse Rosales. "Em conformidade
com a lei venezuelana, o governo é obrigado a proteger essas áreas
de terras e envolver comunidades indígenas e locais na gestão
da biodiversidade e do uso sustentável da floresta. As recentes invasões
de garimpeiros de ouro na bacia hidrográfica do rio Caura estão
diretamente violando o direito venezuelano".
Além disso, em consonância com estas disposições,
a resolução ATBC pede ao governo para promover o desenvolvimento
sustentável na região com projetos de fornecer oportunidades de
emprego para a população local, sem danificar o meio ambiente.
– O governo, rico de petróleo, já patrocinou projetos semelhantes
de bem-estar social em outras partes do país.
A resolução apela também para um controle e regulamento
mais rigoroso na bacia, talvez envolvendo as populações indígenas
locais no esforço. Reservas indígenas como Tumucumaque no Suriname
se mostraram de ser melhor do que reservas florestais vizinhos. A presença
de índios territoriais armados com rifles e setas venenosas é
acreditada de ser um fator limitante para incursões de garimpeiros.
ATBC says that it is critical to act now to evict illegal miners from the Caura
river basin before it ends up like Caroni: degraded, deforested, and violent.
“Illegal gold mining is such an insidious threat to rainforests and their native
peoples,” said ATBC president William F. Laurance. “It’s a tragedy to see one
of the last pristine jewels of the neotropics being subjected to this growing
menace.”
ATBC diz que é importantissimo de agir agora para expulsar os garimpeiros
da bacia hidrográfica do Caura, antes de tudo acabar como no rio Caroni:
degradado, desmatado, e violento.
"Ouro Ilegal é uma ameaça muito insidiosa para florestas
tropicais e os seus povos", disse o presidente ATBC William F. Laurance.
"É uma tragédia de ver uma das últimas jóias
intocadas dos neotrópicos ser submetido a este perigo crescente."