No Parque Indígena do Xingu, rios e lagos são artérias naturais que sustentam a vida de animais e povos originários, servindo como base para alimentação, banho, interações sociais e refúgio em tempos de seca.
As águas do Xingu, porém, encontram-se ameaçadas pelas lavouras de monocultura do entorno do parque, que secam as nascentes e poluem os rios com agrotóxicos; mudanças climáticas vêm agravando os períodos de estiagem.
Neste ensaio fotográfico, o fotógrafo Ricardo Teles mostra a relação que os povos do Xingu têm com as águas que banham seu território.
Ainda antes do nascer do sol, ao longo das praias dos rios e lagos do Xingu, surge no horizonte uma sequência de fogueiras para aquecer os corpos nus recém saídos da água. À medida que a luz clareia o dia, levanta-se uma bruma que dilui o movimento de vultos num vai e vem que irá durar o dia inteiro.
No Parque Indígena do Xingu, rios e lagos são o jardim de infância das crianças. Grupos de mulheres carregam as crianças menores para várias sessões de banhos, iniciando-as desde pequenas nas artes de ser peixe. Treinos de futebol acontecem na praia. Jovens e velhos banham-se ao longo do dia e é sempre um momento propício para encontros e troca de ideias. Ao cair da tarde, barcos de pescadores saem em busca do alimento.
Os rios que cortam o parque, como o próprio Xingu e seus afluentes, são verdadeiras artérias naturais que sustentam a vida de inúmeras espécies animais, incluindo a espécie humana. As lagoas também desempenham um papel crucial: servem como pontos de encontro e oferecem oportunidades para alimentação, descanso e interação social. Além disso, as lagoas são essenciais para o fornecimento de água em épocas de seca, agindo como refúgios para a fauna silvestre e os indígenas durante os períodos mais áridos do ano.
Essa riqueza, porém, está em risco. Segundo o cacique Tapi Yawalapiti, uma das principais lideranças do território do Xingu, há um desmatamento criminoso e desenfreado ocorrendo no entorno do parque, bem onde se encontram as nascentes dos rios. Os três últimos anos têm sido particularmente graves: muitas vezes, a fumaça das queimadas fazia os dias virarem noite nas aldeias, causado mal-estar nos indígenas.
As mesmas lavouras que causam o desmatamento também fazem uso indiscriminado de agrotóxicos, terminando por envenenar rios e animais. Além disso, segundo Tapi, as mudanças climáticas têm causado a diminuição do volume de água em diversos rios, fazendo com que alguns deixem de existir no período de estiagem, entre maio e setembro. A falta de água vem ameaçando inclusive mais importante ritual do Xingu, o Quarup.
A preservação das águas desse território é essencial não apenas para o bem-estar das espécies locais, mas também para o equilíbrio do clima e a manutenção do ciclo hidrológico. O Parque Indígena do Xingu desempenha um papel crítico na retenção da água, atuando como uma esponja natural que armazena e libera lentamente o recurso natural para as regiões circundantes, evitando enchentes e secas extremas.
No ensaio fotográfico a seguir, Ricardo Teles mostra um pouco dessa relação íntima que os povos do Xingu desenvolveram com águas que banham seu território.
Leia também: Crise climática ameaça o Quarup, ritual ancestral dos indígenas do Xingu