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Barragem de mineradora canadense afeta a vida de milhares de pessoas no Maranhão

A vila de Aurizona em primeiro plano e a barragem da Equinox ao fundo. Foto: GEDMMA.

  • Uma barragem da mineradora canadense Equinox Gold transbordou em março, contaminando os rios e prejudicando a vida de milhares de pessoas no Maranhão, que ficaram por dias sem acesso a água potável.

  • Os problemas do projeto, uma das maiores áreas de extração de ouro do Brasil, vêm de longe. Em 2018, um deslizamento isolou a comunidade.

  • Explosões constantes dentro da mina afetam as casas próximas com rachaduras que comprometem a estrutura. Mineradora nega que seja responsável.

  • A barragem de rejeitos principal da Equinox também preocupa os moradores, que temem desastres como os de Mariana e Brumadinho.

No dia 25 de março, um talude de uma barragem da mineradora canadense Equinox Gold se rompeu em Godofredo Viana, no Maranhão. O vazamento afetou diretamente a vida de 4 mil pessoas que vivem na comunidade ao lado da mina, comprometendo o abastecimento de água, contaminando a área e aumentando o medo de que a barragem principal da operação possa se romper, a exemplo do que aconteceu em Mariana e Brumadinho, em Minas Gerais.

A Equinox é uma das maiores mineradoras de ouro do mundo. A mina de Aurizona tem capacidade para produzir até 130 mil onças de ouro por ano, em uma época em que a cotação do metal bate recorde. É uma das maiores operações do Brasil.

A Agência Nacional de Mineração e a Secretaria de Meio Ambiente do Maranhão foram obrigadas a agir. O Conselho Nacional dos Direitos Humanos pediu esclarecimentos sobre a situação.

Um mês após o rompimento, a Polícia Militar chegou a prender duas manifestantes do Movimento dos Atingidos Por Barragens (MAB) que pediam a normalização do abastecimento de água na cidade. O MAB denuncia que a água fornecida está contaminada e tem causado problemas de saúde na população.

Em resposta à reportagem, a Equinox afirmou que “a água foi fornecida desde o dia 26 de março por meio de carros-pipa e da doação de água mineral” e que o abastecimento já foi totalmente restabelecido. Moradores, no entanto, alegam falta de água nas torneiras ou água apresentando mau cheiro, oleosidade e coloração avermelhada.

Moradores ouvidos pela reportagem relatam que os problemas causados pela Equinox são muitos e se arrastam desde o início da operação, em 2010. Eles incluem casas rachadas e com a estrutura comprometida em função das explosões constantes dentro da mina, poluição do ar com os resíduos da mineração que geram problemas respiratórios, poluição sonora e contaminação dos recursos hídricos da região. O medo é constante, diz Daiane Souza, moradora da vila de Aurizona.

“Desde que a mineradora chegou aqui, ela vem humilhando a comunidade. Não dormimos direito. Nossas casas não foram projetadas para aguentar o impacto das bombas dia e noite. Os prejuízos para os moradores são muitos”, relata Daiane.

Além do problema registrado na barragem da Lagoa do Pirocáua, que é uma estrutura auxiliar, o receio é sobre a grande barragem de rejeitos da Equinox na cidade, embora a sua construção seja por linha de centro, mais segura que o método usado em Mariana e Brumadinho. Mas os moradores seguem inquietos com o problema.

“Essa é a maior preocupação. Se essa barragem romper, vai matar todo mundo. Quando chove, mal conseguimos dormir”, relata Daiane Souza. A causa do rompimento do talude e do transbordamento atual, alega a Equinox, é uma chuva desproporcional que atingiu a região, um fenômeno raro, segundo a mineradora.

Jonias Pinheiro, outro morador de Aurizona que chegou a trabalhar por alguns anos na Equinox, reforça os relatos de Daiane e me disse que a mineradora tem causado enormes prejuízos socioambientais para a comunidade. “A empresa traz mais malefícios do que benefícios. São vários os absurdos que acontecem aqui e a mineradora precisa responder por isso”, defende.

Enchente decorrente do vazamento do talude da Equinox. Foto: comunidade de Aurizona.

Problemas crônicos e parceria com o governo do Maranhão

Em 2018, rejeitos de uma pilha de estéril – que é uma montanha de material descartável gerado pela exploração – da Equinox deslizaram, isolando a comunidade. Para Tadzio Coelho, professor da Universidade Federal de Viçosa (MG) que estuda a mineração de ouro em Godofredo Viana, o monitoramento e o licenciamento da Barragem do Vené, a principal da Equinox, possuem problemas graves.

O Plano de Ações Emergenciais, por exemplo, sequer reconhece que há milhares de moradores nas imediações. Simulações de rompimento, necessárias para que a comunidade saiba o que fazer em uma emergência real, nunca foram realizadas.

Para Coelho, os problemas da operação da Equinox não surpreendem, considerando o histórico ruim de falta de transparência e danos causados. “Tem que ser feito um novo licenciamento no projeto como um todo e principalmente na barragem do Vené”, defende. O volume atual do reservatório é de 11,6 milhões de metros cúbicos de rejeitos, similar à barragem da Vale que se rompeu em Brumadinho (MG) em 2019.

De acordo com a Equinox, a barragem “está com toda a documentação e atestado de estabilidade em dia”, tendo sido inspecionada em 31 de março por uma equipe da Agência Nacional de Mineração. Sobre as explosões e os danos causados, a Equinox afirmou que “realiza detonações controladas para desmonte em suas instalações, dentro dos parâmetros legais e tecnicamente permitidos”. Em 2019, uma empresa de engenharia independente contratada concluiu “não haver relação entre as detonações e as queixas dos moradores”.

A Secretaria de Meio Ambiente do Maranhão afirmou, em nota, que tem “adotado medidas de fiscalização, controle e monitoramento para amenizar os danos ambientais e sociais ocasionados pelo rompimento do talude”. Na nota, a Sema acrescenta que tem “reanalisado todas as autorizações ambientais emitidas e monitorado todos os processos de licenciamento da empresa”, além de ter aplicado multa preliminar de R$ 10 milhões à Equinox.

No fim de 2019, no entanto, o vice-governador do Maranhão, Carlos Brandão (PRB), participou da inauguração do complexo da Equinox em Godofredo Viana, que passou por uma grande obra, representando Flávio Dino (PCdoB), governador do estado.

Na época, Brandão destacou “a grande relevância do empreendimento para o desenvolvimento social e econômico da região em harmonia com a preservação do meio ambiente”. Segundo o vice-governador, o governo do Maranhão “garantiu segurança jurídica e política para expansão desse empreendimento”, que representaria “mais desenvolvimento e qualidade de vida para as pessoas”.

O poder público maranhense participou diretamente do empreendimento da Equinox, firmando uma parceria que garantiu a expansão das atividades da mineradora. Na ocasião, Christian Milau, diretor executivo da Equinox Gold, disse que a empresa estava “muito feliz” com o relacionamento com a comunidade local. “O nosso compromisso é colaborar com o crescimento do lugar onde estamos, apoiando iniciativas que tragam benefícios às pessoas, sendo uma mineradora responsável com o meio ambiente”, reforçou.

Imagem do banner: A vila de Aurizona em primeiro plano e a barragem da Equinox ao fundo. Foto: GEDMMA.

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