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Cientistas pedem reformulação mundial de parques para proteger a biodiversidade

  • Uma equipe de cientistas afirma que a relevância de áreas protegidas deve ser avaliada não somente com base na área marinha ou terrestre que ocupam, mas também nos resultados obtidos em termos de biodiversidade.

  • Em um artigo publicado em 11 de abril na revista Science, eles descrevem as limitações da Meta de Aichi para a Biodiversidade número 11, que estabelece metas de proteção de 17% da área terrestre e 10% da área marinha do planeta até o ano de 2020.

  • Eles propõem o monitoramento das áreas protegidas, avaliando sua relevância por meio da mensuração de alterações na biodiversidade e da comparação dos resultados com níveis de “referência” já estabelecidos.

Segundo um grupo de cientistas, quando os países delimitam áreas para criação de parques e reservas com o intuito de minimizar a perda de biodiversidade, o foco deveria ser nos resultados, e não nas ações.

Na Convenção sobre Diversidade Biológica realizada pelas Nações Unidas em 2010 na província de Aichi, no Japão, mais de 190 países se comprometeram a proteger 17% da área terrestre e 10% da área marinha do planeta até o ano de 2020, em meio a outras 19 metas destinadas a reduzir a perda mundial de biodiversidade.

No entanto, os pesquisadores afirmam que a Meta de Aichi para a Biodiversidade número 11 – a diretriz atual para ampliar a área protegida do planeta – enfatiza demais as metas percentuais. Segundo Piero Visconti, autor principal do artigo e ecologista do Instituto Internacional para a Análise de Sistemas Aplicados em Viena, esse enfoque leva à conservação de áreas menos críticas, além de outros “resultados nefastos”.

Gorilas-da-montanha no Parque Nacional de Virunga, República Democrática do Congo. Imagem por John C. Cannon/Mongabay.

“Todos estão comemorando o fato de termos alcançado quase 17% de terras formalmente protegidas”, diz Piero. “Só que a biodiversidade continua diminuindo dentro e fora dessas áreas.”

Piero e seus colegas publicaram seu artigo em 11 de abril na revista Science.

Eles reconhecem que as Metas de Aichi para a Biodiversidade estabelecidas no encontro provavelmente viabilizaram aumentos de áreas terrestres e marinhas protegidas desde 2010. Porém, no artigo eles afirmam que a meta número 11 levou os países a se concentraram em percentuais, e não na criação de áreas protegidas (APs) que oferecem melhor proteção a espécies ameaçadas.

“É fácil propor metas percentuais porque as pessoas conseguem visualizá-las, além de serem mais fáceis de documentar e monitorar”, diz Piero.

Impalas no Parque Nacional Akagera, em Ruanda. Imagem por John C. Cannon/Mongabay.

Em alguns casos, o resultado foi “muitas APs sendo criadas em locais desproporcionalmente sem importância em termos de biodiversidade”, dizem os autores. Segundo um estudo publicado em 2014, a criação de parques e reservas em áreas onde habitam espécies ameaçadas e pouco representadas incluiria 30 vezes mais espécies vegetais e animais ameaçadas de extinção dentro das delimitações das áreas protegidas.

Em outros locais, alguns parques e reservas são protegidos somente no papel, sem dispor, por exemplo, de recursos adequados para impedir a ação de caçadores ou frear a crescente conversão de habitat em terras cultiváveis. Ainda assim, cada hectare desses “parques no papel” conta tanto para o cumprimento das metas percentuais quanto um hectare de uma reserva na qual as autoridades investiram em pessoal e ferramentas necessárias para a proteção da biodiversidade. Contudo, mesmo nesse caso, a relevância dos parques é avaliada em termos de insumos, e não do impacto da área protegida sobre a biodiversidade.

Besouro-tartaruga no Parque Nacional Amacayacu, na Colômbia. Imagem por Rhett A. Butler/Mongabay.

Nas últimas seis décadas, as áreas protegidas delimitadas desempenharam um papel mais importante na proteção de áreas locais e globais de comunidades vegetais e animais chamadas de “ecorregiões”. No entanto, os autores argumentam que, segundo estudos recentes, uma perspectiva abrangente não protege necessariamente níveis comparáveis de diversidade de espécies. Eles afirmam que a vinculação das metas a esses detalhes estimulará a sobrevivência não somente das espécies em si, mas também da variabilidade genética e das funções ecológicas desempenhadas por essas comunidades biológicas diversificadas.

Por último, definir as responsabilidades de cada um sobre o cumprimento de uma meta internacional como a meta número 11 de Aichi não é uma tarefa fácil, e os compromissos das nações com as áreas protegidas não atenderam às exigências estabelecidas na meta.

“Precisamos que todas as nações sejam honestas quando contabilizarem a fração de terras e água reservada para a conservação da biodiversidade”, declarou James Watson, ecologista da Universidade de Queensland, na Austrália, e da Sociedade de Conservação da Vida Selvagem.

Peixe-palhaço em um recife de corais próximo ao Parque Nacional de Komodo, na Indonésia. Imagem por Rhett A. Butler/Mongabay.

Segundo os autores, para proteger a biodiversidade, as metas precisam ser escalonáveis; ou seja, a parcela de responsabilidade sobre a meta precisa ser mensurável, e o somatório de todas as responsabilidades nacionais deve alcançar a meta global.

Para solucionar essa questão, eles propõem o monitoramento de áreas protegidas, avaliando sua relevância por meio da mensuração de alterações na biodiversidade e comparação dos resultados com níveis de “referência” já estabelecidos.

Além disso, os pesquisadores afirmam que se deve priorizar a proteção das zonas mais importantes com base em um padrão universal. Em 2016, a UICN publicou diretrizes para a definição dessas “principais áreas de biodiversidade” que levam em conta variáveis como a possibilidade de uma espécie ameaçada ser insubstituível em uma determinada área e se essa espécie existe em outras partes do mundo.

“Sabemos que áreas protegidas funcionam”, diz James. “Com financiamento, administração e localização adequados, elas são extremamente eficazes para deter ameaças que provocam perda de biodiversidade e [garantir] o retorno de espécies que estavam à beira da extinção.”

“O desafio consiste em melhorar a administração das áreas protegidas que são mais valiosas para a conservação da natureza, para garantir que sejam preservadas”, ele afirma.

Lagarto-do-nilo no Parque Nacional Kruger, na África do Sul. Imagem por Rhett A. Butler/Mongabay.

Agora os conservacionistas estão estudando os próximos passos para a proteção da biodiversidade após o ano de 2020. Segundo Piero, o que realmente fará diferença para reverter o processo de desaparecimento de espécies é a concentração de esforços para que as metas sejam atingidas com base nos resultados positivos para a biodiversidade, e não na proteção de determinada porção de terra ou oceano.

“Se os governos estiverem dispostos a levar a proteção da biodiversidade a sério, não há outro caminho”, diz ele.

Imagem do banner: tartaruga marinha nas Ilhas Maldivas, por Jayne Jenkins/Coral Reef Image Bank

John Cannon mora no Oriente Médio e escreve artigos para a Mongabay. Siga-o no Twitter: @johnccannon

Citações

Butchart, S. H., Clarke, M., Smith, R. J., Sykes, R. E., Scharlemann, J. P., Harfoot, M., … & Brooks, T. M. (2015). Shortfalls and solutions for meeting national and global conservation area targets. Conservation Letters8(5), 329-337. doi:10.1111/conl.12158

IUCN. (2016). A global standard for the identification of Key Biodiversity Areas, version 1.0.

Venter, O., Fuller, R. A., Segan, D. B., Carwardine, J., Brooks, T., Butchart, S. H., … & Possingham, H. P. (2014). Targeting global protected area expansion for imperiled biodiversity. PLoS biology12(6), e1001891. doi:10.1371/journal.pbio.1001891

Visconti, P., Butchart, S. H. M., Brooks, T. M., Langhammer, P. F., Marnewick, D., Vergara, S., … Watson, J. E. M. (2019). Protected area targets post-2020. Science, 364(6436), 12-14. doi:10.1126/science.aav6886

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Artigo original: https://news.mongabay.com/2019/04/scientists-urge-overhaul-of-the-worlds-parks-to-protect-biodiversity/

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