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A fome do Brasil por carne de engorda baseada em soja está causando o desmatamento do Cerrado: relatório

  • O Cerrado, a savana do Brasil, abrange mais de 20% do território nacional, não obstante, percebendo um desmatamento rigoroso. Um relatório recente revelou ligações entre os municípios com os níveis mais elevados de desmatamento e de produção de soja significativa. A soja é a exportação mais importante e rentável do Brasil, mas também é utilizada nacionalmente como alimentos para animais e como uma cultura de energia de biodiesel.

  • Em 2017, o Brasil produziu 16,3 milhões de toneladas de farelo de soja para abastecer seu mercado nacional, e mais de 90% disso tornou – se ração animal, sendo 50% utilizado como ração para galinhas, 25% como ração para porcos e 12% para alimentação de gado de corte e leiteiro.

  • De 2013 a 2016, mais de 75% de toda a expansão direta da cultura da soja alcançada por meio da liberação da vegetação nativa ocorrida nos estados do MATOPIBA (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia). Um terço da safra de soja de 2016 proveniente do MATOPIBA foi utilizado como ração para animal ou biodiesel consumido internamente no Brasil.

  • Mais de 20% de toda a expansão da vegetação nativa ocorrida no Cerrado em 2017 estava localizado em apenas 1387 dos municípios. Quarenta por cento da soja produzida nestes 20 municípios foram para o mercado interno brasileiro, com a soja tratada principalmente pelas multinacionais Bunge, Granol e Cargill.

O Cerrado é assinalado por extensas planícies e planaltos robustos, como demonstrado aqui no estado do Maranhão. Grande parte da vegetação nativa do bioma está sendo convertida em plantação de soja, com grande parte desta soja indo alimentar o setor da produção de gado nacional do Brasil. Imagem cedida gentilmente pela Global Canopy.

Um relatório recente da ONG ambiental Global Canopy Programme considerou que a produção de carne é uma grande ameaça ao bioma Cerrado, um vasto gramado arborizado rico em biodiversidade que cobre mais de 90% do Brasil. Uma nova análise revelou ligações diretas entre os municípios com maiores índices de desmatamento e com uma produção de soja significativa. A soja não é apenas uma das exportações de mercadorias mais importantes rentáveis do Brasil, mas também é muito utilizada altamente como alimentação animal e na qualidade cultural de biodiesel.

Em 2017, o Brasil produziu 16,3 milhões de toneladas de farelo de soja para o mercado interno, e mais de 90% delas vieram a ser alimentação animal. Uma outra análise revelou que metade foi utilizada como ração de galinha, um quarto como ração para porcos e 12% como ração de gado de corte e leiteiro. O cultivo de soja (e seu uso como alimentação animal) estão associados aos impactos ambientais e sociais negativos graves, sobretudo o desmatamento.

“Nos últimos 20 anos, a expansão da soja no Brasil foi correspondente a um território cinco vezes o tamanho da Suíça”, afirmou à Mongabay André Antonio Vasconcelos, pesquisador da América Latina na Global Canopy. “A expansão da soja tem sido responsável pelo desmatamento direto e indireto da vegetação nativa, sobretudo no Cerrado, uma das savanas mais biodiversas do mundo, e em particular, no Matopiba”.

O termo Matopiba foi criado pelo agronegócio e é abreviado devido aos estados do Cerrado que são Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. Segundo o relatório, de 2013 a 2016, mais de 75% de toda a expansão direta da safra da soja alcançada por meio da vegetação nativa surgiu nesses estados. Um terço da colheita de soja em 2016 proveniente do Matopiba utilizada na alimentação animal ou biodiesel foi consumido internamente no Brasil.

Em 2017, o Brasil produziu 16,3 milhões de toneladas de farelo de soja para o mercado interno, e mais de 90% disso vieram a ser alimentação animal. Imagem de Otto Ramos/Greenpeace.

Vasconcelos ressalta que o Matopiba é também o lar de muitas comunidades tradicionais, de habitantes que residiram na região há um século ou mais – pessoas dependentes de florestas naturais e aquíferos para seus diversos meios de subsistência. No entanto, acrescenta, “grande parte da expansão da soja nessa região tem sido realizada por grandes empresas, qual gera muitas disputas e tensões por terra pelas comunidades locais”. Vasconcelos menciona além disso que o plantio de soja não emprega um grande número de pessoas, ou seja, isso significa que os assentamentos tradicionais veem poucos empregos e benefícios econômicos insignificantes provenientes da indústria.

A seguir, uma descrição do uso de soja do Cerrado por compromissos setoriais, de empresa e de desmatamento:

O Cerrado é o segundo maior bioma brasileiro em extensão, superado apenas pela Amazônia. Esta savana é rica em armazenamento de carbono, biodiversidade e cultura tradicional. Todavia, grandes áreas de vegetação nativa foram tomadas por plantações de soja. Imagem de Otto Ramos/Greenpeace.

Perigos de desmatamento ligados ao mercado interno de soja

Mais de 20% de toda a remoção da vegetação nativa ocorrida no cerrado em 2017 estava localizada em apenas 20 dos 1387 municípios. O relatório apontou 40% da soja produzida nesses municípios saíram do mercado interno brasileiro e pelo menos quatro equipamentos de moagem – dois de propriedade da Bunge, um da Granoll e um da Cargill – funcionam em áreas de alto nível de desmatamento.

“Os equipamentos de moagem e outras infraestruturas de soja – tais como silos – modelam e transformam as paisagens circundantes”, esclareceu Vasconcelos. Ele destacou a capacidade de processar e armazenar a soja desenvolvida para os mercados interno e externo catalisa a expansão do plantio de soja (e o elevado desmatamento) nas regiões vizinhas.

“Com o fornecimento dos focos do desmatamento, essas empresas provavelmente comprarão soja cultivada em terras desmatadas e [elas] devem tomar medidas cautelosas para garantir que não contribuam para o desmatamento”, mencionou.

O cotidiano antigo da comunidade do Cerrado, onde os colonos por tempos viveram sem escritura de terras formalizada, ação da agricultura de pequena escala e atividade pecuária. Nos últimos anos, o agronegócio de larga escala tem afetado estas comunidades, reivindicando suas terras para o plantio de soja e gerando conflito. Imagem cedida gentilmente pela Global Canony.

A indústria de soja responde

A Mongabay entrou em contato com todas as principais empresas citadas no relatório da Global Canopy; cinco responderam ao nosso convite para comentar detalhadamente:

Em um comunicado publicado, a Bunge comunicou por escrito que tem compromisso claro de eliminar o desmatamento em suas cadeias de fornecimento: “Estamos avançando na nossa estratégia em três partes de incrementar rastreamento e o monitoramento da cadeia de fornecedores, promover um investimento futuro inteligente através de métodos de apoio à decisão e promover incentivos para os agricultores que conversam a terra”.

Entre os objetivos alcançados, a Bunge afirma ter “alcançado aproximadamente 90% da rastreamento em fazendas direto do nosso fornecimento em áreas de risco de desmatamento; lançado em colaboração com as ONG, agências governamentais e outras empresas; Agroideal.org, uma ferramenta de apoio à decisão social de todos que integra dados econômicos, ambientais e sociais para possibilitar mais uma expansão da agricultura mais sustentável; [e] lançou um programa de US $ 50 milhões, em parceria com a The Nature Conservancy e o Banco Santander, para fornecer financiamento de longo prazo para agricultores que se comprometam a conservar zero o ambiente nativo.

A Bunge concluiu: “Somos também membros do Grupo de Trabalho do Cerrado, um grupo de trabalho de diversas partes interessadas empenhado a definir o enquadramento em concordância para alcançar a produção e o abastecimento do desmatamento zero” no bioma cerrado do Brasil”.

A região que cerca os estados brasileiros Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia – apelidada de Matopiba pelos agricultores de grande porte – é considerada a vitrine do agronegócio brasileiro, com seus elevados rendimentos de soja, milho e algodão. No entanto, este tipo de agricultura tem causado desmatamento grave, o que tem resultado em desmatamento grave, como visto nesta imagem divergente da terra cultivada da vegetação nativa. Imagem de Marizilda Cruppe/Greenpeace.
Durante séculos, comunidades antigas locais têm vivido de forma sustentável – ceifa da vegetação nativa do Cerrado, cultivo de pequenos campos e pastagem de gado sem destruir a paisagem natural. Contudo, a nova expansão do agronegócio tem resultado em intensos conflitos, sobretudo por terra e na água. Imagem de Marizilda Cruppe/Greenpeace.

A JBS informou à Mongabay que produz biodiesel em sua Unidade JBS Biodiesel, construída especificamente para produzir combustível limpo de resíduos orgânicos produzidos pela própria empresa da “cadeia alimentar de proteínas” (ou seja, por exemplo, carne bovina, frango, banha de porco e óleo de fritura reciclado), que representa 85¨% dessa unidade comercial. “O combustível remanescente é obtido utilizando óleo vegetal de algumas das maiores empresas da indústria brasileira, que são signatárias da Moratória da Amazônia”, segundo o porta – voz da JBS.

A JBS não apontou quer seja as empresas das quais compra óleo vegetal produzem sua soja na Amazônia ou no Cerrado. Trata – se de uma distinção importante, dado grande parte da região de crescimento da soja do Matopiba não está localizada dentro da área regulamentada pela Moratória da soja na Amazônia e suas exigências do desmatamento voluntárias.

Nós também gostaríamos de reiterar que a JBS é empenhada em garantir que a cadeia de produção de carne bovina de nenhuma parte do desmatamento obtenha matérias-primas com responsabilidade dos fornecedores brasileiros selecionados estabelecidos com base em vários critérios sociais e ambientais”, finalizou o porta-voz. No entanto, outras investigações têm relacionado a JBS a um desmatamento significativo, e é bem sabido que o governo brasileiro tem apresentado a indústria da carne com falhas contábeis que permitem distanciar -se dos encarregados de fazendas pelo desmatamento significativo, mas que ainda fornece processadores com gado.

Desvalorizado por longo tempo pelos cientistas e ativistas ambientais, os pesquisadores estão percebendo atualmente que o Cerrado é incrivelmente biodiverso. O bioma abriga mais de 10.000 espécies de plantas, mais de 900 de espécies de aves e 300 espécies de mamíferos. Imagem cortesia da Global Canopy.
O Cerrado é considerado o “berço das águas” do Brasil. Apesar da estação seca anual do bioma, no passado ele tinha água de sobra. 8 das 12 grandes bacias hidrográficas brasileiras e três aquíferos – o Guarani, o Bambuí e o Urucuia – todos dependem do Cerrado como uma fonte de grande quantidade de sua água. Mas agora, o agronegócio industrial está exigindo intensamente esse suprimento de água e ameaçando os aquíferos e cursos d’água do Brasil. A produção de soja, de algodão e do milho são alimentos fortes de porcos para engorda de água. Imagem de Fernanda Ligabue/Greenpeace.

Uma confirmação da Amaggi aponta à participação da empresa como membro do Grupo de Trabalho do Cerrado, que está discutindo uma estratégia setorial para alcançar o desmatamento zero, ao mesmo tempo que presta atenção ao problema dos aspectos socioambientais e econômicos.

A Amaggi afirma que tem como compromisso obter uma cadeia de suprimentos não desflorestada em todos os biomas, inclusivo o Cerrado, embora tenha minimizado os prejuízos florestais lá: “No que diz respeito especificamente ao Cerrado, a Amaggi – alinhada junto com outras empresas representadas pela Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (ABIOVE) – entende que a produção de soja não é a principal impulsionadora do desmatamento deste bioma”.

A Amaggi reforça esta afirmação com números dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), afirmando que a soja representa apenas 8,8% do desmatamento no Matopiba e 4% no restante do Cerrado. No entanto, existem inúmeras fontes que visam quais impactos do desmatamento da soja no Cerrado são maiores.

Uma plantação de soja no Cerrado. O desenvolvimento do agronegócio tem levado e um desmatamento em grande quantidade, apropriação de terras e confrontos com as comunidades antigas locais. Imagem de Antonio Stickel/ Greenpeace.
Apesar de ser a savana de maior biodiversidade do mundo, mais da metade da vegetação nativa do Cerrado já foi destruída, por causa da ação agressiva dos modelos dos produtos industriais do agronegócio em toda a região. Imagem de Marizilda Cruppe/Greenpeace.

Não pode haver lugar para o desmatamento da alimentação no futuro, e estamos firmemente empenhados a eliminar de nossas cadeias de fornecimento”, afirmou um porta – voz da Cargill. “Estamos trabalhando para transformar todas nossas cadeias de suprimentos agrícolas a serem livres do desmatamento por meio das políticas das cadeias de suprimento priorizadas e planos de ação com prazos específicos. Temos procedimentos e controles internos para evitar o fornecimento das áreas embargadas e assegurar que a venda dos produtos com origem apenas das propriedades que estejam em conformidade com a legislação brasileira”.

A empresa divulgou também sua participação em grupos empenhados a diminuir o desmatamento do Cerrado: “Para conseguir uma resolução que atenda a realidade da região, a Cargill atua como associada com outras numa busca de soluções mais integradas, tal como a Colizão Brasil: Clima, Florestas e Agricultura, Grupo de Trabalho da Soja (GTS) e o Grupo de trabalho do Cerrado (GTC)”. A Cargill, assim como a Amaggi, Minimizou a participação de que a soja tenha reproduzido recentemente no desmatamento do Cerrado diminuiu nos últimos anos, os analistas temem que as políticas favoráveis ao agronegócio do governo Bolsonaro possam reverter essa tendência.

Um membro antigo da comunidade no estado do Piauí faz uso da Carnaúba – uma palmeira da qual uma cera é extraída para uso em diversas indústrias e para a fabricação de vassouras. O sustento nativo de diversos meios de vida contrapõe bruscamente com o agronegócio industrial. Imagem cortesia da Global Canopy.

O diretor de Desenvolvimento da Caramuru Alimentos, Davi Depiné, contou à Mongabay que as operações de aquisição incluem o cerrado, mas que a empresa não compra nenhuma matéria – prima nas áreas proscritas pelo relatório da Global Canopy. Ele ressaltou que a empresa segue seus próprios Princípios de Sustentabilidade Rigorosos – que incluem Proteção Ambiental, Desenvolvimento e Segurança Social e Desenvolvimento e Controle Econômico.

Ele mencionou que a Caramuru Alimentos só adquire matérias – primas das áreas em situação absolutamente de acordo com a lei e está vocacionada em conformidade com o Código Florestal Brasileiro (Lei nº 12.651/2012) e a outros sistemas, programas e medidas legais estabelecidas pelo governo brasileiro.

“No caso de uma abordagem/agricultor que não estiver em conformidade com quaisquer uma das leis ou sistemas, o fornecedor será bloqueado em nossos sistemas até que o comprovante de emissão seja emitido pelo órgão competente, e nenhuma aquisição será feita até então”, disse Depiné, embora tivesse falhado, quando solicitado, para fornecer o número destes casos.

Cultivo da soja industrializada em uma plantação no Cerrado. Imagem de Otto Ramos/Greenpeace.

Vasconcelos, pesquisador da organização Global Canopy, acredita que todas as empresas devem tomar consciência dos impactos ambientais e sociais associados às suas atividades e ações de maneira significativa para garantir que suas cadeias de fornecimento sejam livres do desmatamento. Isso significa a assumir compromissos na mudança da vegetação nativa zero, e de criar mecanismos no lugar para implementar esses compromissos e apresentar à sociedade, aos governos e a todas as partes interessadas que esses compromissos estão sendo cumpridos.

“Não é necessário desobstruir a vegetação nativa para a expansão agrícola no Cerrado. Quando se trata da soja, há cerca de 18,5 milhões de hectares [71.430 metros quadrados] de terras já desmatadas o que é altamente adequado para a produção da soja no Cerrado”, afirmou Vasconcelos. Se a soja ainda assim continua a expandir- se para as áreas de vegetação nativa, ele comenta, é só graças ao lucro: terras cobertas pela vegetação nativa normalmente são mais econômicas para comprar, deste modo são atraentes para os especuladores.



Nota: A expressão MATOPIBA, também chamada de MAPITOBA, resulta de um acrônimo formando com as iniciais dos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. Inicialmente conhecida por região do MAPITO, passou a englobar o oeste da Bahia, tornando -se, assim, a região do MATOPIBA.

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