Pesquisadores lançaram o que eles consideram “a avaliação mais abrangente até o momento sobre armazenamento de carbono” em áreas florestais ocupadas por povos indígenas e comunidades locais em 64 países tropicais. Uma das principais descobertas da pesquisa é o fato de os povos indígenas administrarem a terra com muito mais competência que os governos de seus países.
Segundo o estudo, liderado pela Iniciativa para Direitos e Recursos (em inglês, Rights and Resources International, ou RRI), os povos indígenas gerenciam quase 300 bilhões de toneladas métricas de carbono armazenadas abaixo e acima do solo em suas terras. O estudo descobriu que esse carbono sequestrado equivale a 33 anos de emissões mundiais tendo como referência o ano de 2017.
O lançamento do estudo foi programado para coincidir com a abertura da Cúpula Global de Ação Climática no dia 12 de setembro. O evento de três dias aconteceu em São Francisco e foi organizado pelo governador da Califórnia, Jerry Brown, e pelo ex-prefeito de Nova York Michael Bloomberg. A relação entre direitos indígenas e proteção ambiental prometeu ser um dos pontos altos da cúpula.
À medida que o aquecimento global continua sobrepujando a morna resposta internacional, vários ambientalistas estão se unindo com o objetivo de exigir plenos direitos e reconhecimento para aqueles que há muito estão associados à administração da terra ligada à mitigação das alterações climáticas: os povos indígenas.
No dia 10 de setembro, pesquisadores lançaram o que eles consideram “a avaliação mais abrangente até o momento sobre armazenamento de carbono” em áreas florestais ocupadas por povos indígenas e comunidades locais em 64 países tropicais. Uma das principais descobertas da pesquisa é o fato de os povos indígenas administrarem a terra com muito mais competência que os governos de seus países.
As comunidades indígenas muitas vezes se esforçam para manter as florestas intactas, o que resulta no aprisionamento do carbono nas árvores, vegetação, raízes e solo em vez da sua liberação na atmosfera por meio do desflorestamento e da perturbação do solo devida a práticas de agropecuária, mineração ou extração de madeira.
Na verdade, segundo o estudo liderado pela Iniciativa para Direitos e Recursos (em inglês, Rights and Resources International, ou RRI), os povos indígenas administram quase 300 bilhões de toneladas métricas de carbono armazenadas abaixo e acima do solo em suas terras. O estudo descobriu que esse carbono sequestrado equivale a 33 anos de emissões mundiais tendo como referência o ano de 2017.
Os resultados foram revelados no mesmo dia em que o secretário-geral das Nações Unidas, Antonio Guterres, censurou a paralisia das lideranças globais em relação às ações climáticas enquanto os impactos – condições climáticas extremas, elevação do nível do mar, incêndios florestais, degradação dos oceanos, desflorestamento – continuam avançando. Na semana passada, após negociações mornas em Bangkok, na Tailândia, ele fez um apelo a todas as nações para que intensifiquem seus esforços.
O estudo liderado pela RRI teve como objetivo destacar o papel que os povos indígenas desempenham em seus próprios países quando se trata de ação climática por meio do melhoramento da proteção e da administração de terras e florestas. Os autores observam que os índices de desflorestamento são significativamente mais baixos nas terras ocupadas por populações nativas, mas os governos muitas vezes não reconhecem os direitos legais desses povos, ameaçando assim sua capacidade de administrá-las. Essa situação também pode prejudicar os compromissos firmados por esses países no Acordo de Paris de 2015 no que diz respeito à redução da emissão de carbono e do desflorestamento.
“Indicadores da última década mostram que os governos dos países em desenvolvimento e a comunidade internacional não estão agindo com a rapidez suficiente para reconhecer e consolidar os direitos dos povos das florestas”, declarou Alain Frechette, autor da análise de carbono e diretor de análise estratégica e envolvimento global da RRI. “No mínimo um terço do carbono administrado por comunidades em países tropicais e subtropicais está situado nas florestas, onde os principais guardiões carecem de títulos, fato que os coloca em grande risco juntamente com as florestas e o carbono que elas armazenam.”
Da floresta para os holofotes
O lançamento do estudo foi programado para coincidir com a abertura da Cúpula Global de Ação Climática no dia 12 de setembro. O evento de três dias aconteceu em São Francisco e foi organizado pelo governador da Califórnia, Jerry Brown, e pelo ex-prefeito de Nova York Michael Bloomberg.
Eles são co-fundadores da coligação We Are Still In (ainda estamos participando, em tradução livre), um conjunto de estados, cidades, universidades e empresas que prometeram assegurar que os EUA honrem os compromissos firmados no Acordo de Paris para redução de emissões, ainda que o governo Trump tenha interrompido as ações climáticas em nível federal.
O progresso internacional, planos e obstáculos dessas entidades – conhecidas como subnacionais – para a ação climática seria o foco da cúpula de São Francisco. A relação entre direitos indígenas e proteção ambiental prometeu ser um dos pontos altos da cúpula.
Em 11 de setembro, por exemplo, governadores de 38 jurisdições em 5 continentes se reuniram com líderes indígenas para dar início a uma parceria visando à redução dos índices de desflorestamento e à preservação dos direitos das terras nativas. A expectativa era de que importantes fundações norte-americanas, como a Fundação Ford de 13 bilhões de dólares, reforçassem o time pela primeira vez, direcionando milhões de dólares ao financiamento de projetos de proteção de florestas e ação climática.
O cenário demanda ações urgentes, pois o ano de 2017:
• Foi o segundo ano mais quente desde o início das medições em 1880.
• Foi um ano em que as emissões de gases de efeito estufa alcançaram um nível recorde.
• Foi classificado como o segundo pior ano da história em termos de desflorestamento, com uma área desmatada de tamanho equivalente à Grécia.
• Testemunhou o assassinato de 207 defensores ambientais em 22 países, mortos ao tentarem interromper atividades ilegais em suas terras, como mineração, extração de madeira, caça e perfuração de poços.
É por esse motivo que os defensores afirmam que o estudo de gestão de terras indígenas liderado pela RRI é ao mesmo tempo oportuno e indispensável.
Peter Veit, diretor da iniciativa Land and Resource Rights (Direitos à terra e a recursos naturais, em tradução livre) do Instituto de Recursos Mundiais, disse à Mongabay que “as análises econômicas deixam claro que as terras de povos indígenas que são protegidas e tituladas, principalmente na América Latina, onde os dados são mais abundantes, têm índices de desflorestamento três ou quatro vezes menores que áreas semelhantes que não são ocupadas por povos indígenas. Obter o título da terra é fundamental.”
Peter contribuiu para o estudo fazendo parte de um grupo de pesquisa chamado LandMark. O estudo também contou com contribuições de pesquisas do Environmental Defense Fund, Woods Hole Research Center e três organizações indígenas. O estudo de mapas e demarcações revelou que somente 15% das terras indígenas são tituladas aos habitantes das florestas dos países avaliados.
Sem garantia de proteção
John Knox, professor de direito da Universidade Wake Forest, completou recentemente seis anos de atuação como relator especial sobre direitos humanos e meio ambiente da ONU. Segundo ele, a titulação de terras a povos indígenas – geralmente terras que já pertenceram a eles – não é garantia de proteção ou conservação permanente e nem deveria ser.
John acrescenta que “povos indígenas têm o direito de controlar o território que ocupavam tradicionalmente com base em seus direitos legais. Não é algo que deva ser concedido simplesmente porque achamos que serão bons guardiões ambientais. Eles têm direitos implícitos baseados em seus direitos humanos. Assim como acontece com outros proprietários de terras, eles podem decidir utilizar a terra de determinadas maneiras.”
Alguns exemplos podem ser vistos no Brasil, onde seis comunidades nativas foram multadas pelo governo recentemente por realizarem práticas agrícolas proibidas em reservas. Enquanto isso, na Amazônia peruana, uma tribo indígena na região de Madre de Dios está limpando grandes faixas de terra usadas para mineração. A tribo coopera com os ambientalistas para ajudar a reflorestar suas terras depois que a mineração for transferida para outra região.
Segundo John, esses exemplos não são nem surpreendentes nem comuns. Ele diz que, na qualidade de proprietários de terras tituladas, os povos indígenas devem estar sujeitos às normas e restrições governamentais.
“Minha experiência com povos indígenas mostra que eles não estão desesperados para derrubar árvores e estabelecer uma indústria pesada”, acrescentou John. “Eles são melhores administradores da terra porque vivem lá e valorizam mais a sustentabilidade da terra em longo prazo do que as pessoas que vêm de fora e veem a terra principalmente como fonte de recursos naturais que podem ser explorados.”
No Woods Hole Research Center, um centro de pesquisas nos EUA, o ecologista e especialista em sensoriamento remoto Wayne Walker contribui para o estudo com modelagem computadorizada. Ele afirmou que as conclusões que apontam para a necessidade de um controle indígena legalizado das florestas que esses povos ocupam são “moleza” para os governos federais dispostos a combater a mudança climática.
Com isso, Wayne reconhece que nações em desenvolvimento, geralmente assoladas por corrupção governamental, lutam para equilibrar a conservação do meio ambiente com a pressão para monetizar seus recursos naturais.
“O que podemos fazer no momento é esclarecer da melhor forma possível, em termos quantitativos, o papel que os povos indígenas representam para a mitigação do clima”, disse Wayne à Mongabay. “Não haverá nenhum momento decisivo em que todos os países do mundo vão aderir a essas questões ao mesmo tempo. Mas com sorte, aos poucos, antes do esperado, a mudança começará a acontecer.”
Justin Catanoso é professor de jornalismo na Universidade Wake Forest e colaborador regular da Mongabay. Siga-o no Twitter @jcatanoso.