Um grupo de cientistas do Reino Unido e do Brasil usaram um total de 132 câmeras escondidas para tirar mais de 60 mil fotos em cerca de 47 plantações na região amazônica.
Eles também fizeram 157 entrevistas com fazendeiros locais questionando sobre os animais que mais frequentam suas áreas de cultivo.
Os pesquisadores descobriram que os animais mais prejudiciais aos plantios eram também os que mais foram flagrados pelas câmeras fotográficas.
Fotografias de animais atacando plantações foram tiradas com câmeras escondidas e conversas com fazendeiros na região amazônica indicam que é possível proteger a diversidade da vida da maior floresta tropical do mundo, ao mesmo tempo em que se garante que as pessoas tenham o suficiente para se alimentarem.
“As comunidades rurais da Amazônia são algumas das mais pobres do mundo, mas vivem em meio a maior biodiversidade do planeta”, afirma Mark Abrahams, agora trabalhando como ecologista na Sociedade Zoológica de Bristol, Reino Unido, e autor principal da pesquisa, em uma declaração. “Queríamos descobrir como as comunidades locais são impactadas quando animais selvagens devoram suas plantações”.
Abrahams e seus colegas, Carlos Peres, da Universidade de East Anglia (antigo local de trabalho de Abrahams) e Hugo Costa, da Universidade Estadual de Santa Cruz, no Brasil, publicaram sua pesquisa em 26 de fevereiro no Journal of Wildlife Management. Eles afirmam que invasores de plantações consomem, em média, 8% da mandioca cultivada pelos fazendeiros a cada ano no Médio-Juruá, região oeste da Amazônia. Os fazendeiros afirmam que se eles não se preocupassem em proteger suas plantações, as perdas poderiam ser de 10% ou mais.
Eles costumam plantar mandioca do tipo “amargo”. Mesmo que uma quantidade maior de cianeto faça com que cultivar esses tubérculos, ricos em amidos, seja mais trabalhoso, animais invasores tendem a procurar menos esse tipo do que sua variedade “doce”.
A equipe de pesquisadores instalou as câmeras escondidas próximas às fazendas e descobriram que os animais que mais destruíam as plantações eram aqueles que foram mais vezes flagrados pelas câmeras.
Entre 2013 e 2015, as 132 câmeras escondidas da equipe capturaram mais de 60 mil fotos em cerca de 47 fazendas. Os pesquisadores também fizeram 157 entrevistas com fazendeiros locais. Essas duas linhas complementares de investigação indicaram cinco espécies que são mais prejudiciais às plantações, incluindo o veado-mateiro (Mazama americana) e o caititu (Pecari tajacu), e vários roedores, dentre eles as pacas (Cuniculus paca) e as cutias (Dasyprocta fuliginosa).
Esses animais também estão entre os mais caçados pelos membros das comunidades. Embora a União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) não tenha informações suficientes sobre o veado-mateiro, nenhuma dessas espécies é considerada ameaçada. Abrahams afirma que “caçá-los para a subsistência não ameaça a biodiversidade, desde que medidas conservacionistas, como áreas protegidas e o manejo adequado de recursos naturais, sejam adotadas”.
“Esse estudo demonstra que a invasão de plantações feita por animais na Amazônia não precisa se tornar um conflito de humanos contra a vida selvagem”, afirma Abrahams, “conservacionistas podem trabalhar com comunidades locais para auxiliar no manejo de recursos naturais”.
Atualmente, fazendeiros utilizam a caça e armadilhas para limitar os danos causados às plantações, enquanto isolam seus campos com redes e usam espantalhos.
As descobertas destacam que os conservacionistas precisam reconhecer os desafios que as comunidades enfrentam para prover alimentos para suas famílias.
“A coexistência junto à vida selvagem geralmente incorre em custos para a sobrevivência dos fazendeiros nas florestas tropicais, que exportam uma diversidade de serviços ambientais destinados a melhorar a vida de milhões de pessoas que vivem muito longe dali”, disse Peres em uma declaração.
Esse estudo apresenta uma oportunidade que nem sempre existe na relação entre a proteção da biodiversidade e o incentivo ao desenvolvimento econômico, uma combinação que “às vezes é tida como incompatível”, afirma Abrahams.
“A invasão a uma plantação pode prejudicar meios de subsistência e fazer com que as comunidades sejam contrárias à conservação”, acrescenta ele. “Na área em que desenvolvemos nossa pesquisa, no entanto, parece que as invasões às plantações não são barreiras intransponíveis para a conservação”.
Foto dos caititus: Mark Abrahams/Universidade de East Anglia.
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Referência
Abrahams, M. I., Peres, C. A., & Costa, H. C. M. (2018). Manioc losses by terrestrial vertebrates in western Brazilian Amazonia. The Journal of Wildlife Management.