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Desmatamento em pequena escala intensifica-se na Amazônia, diz estudo

  • Um estudo recente usou imagens de satélite de alta resolução para analisar eventos de desmatamento na Amazônia, revelando uma mudança na tendência desses eventos de larga para pequena escala. As áreas protegidas também parecem ser atingidas.

  • Os resultados indicam que grandes focos de desmatamento estão surgindo no Peru e na Bolívia, provavelmente por causa da agricultura industrial.

  • Os pesquisadores constataram que 34 por cento dos pontos de desmatamento na Amazônia brasileira eram menores que 6,25 hectares, que é o tamanho mínimo detectável pelo sistema de monitoramento do governo brasileiro.

  • Segundo os pesquisadores, sistemas de monitoramento com maior resolução são necessários para combater a intensificação do desmatamento em pequena escala.

Um novo estudo aponta que o desmatamento em pequena escala da floresta tropical amazônica tem aumentado na última década, com novos focos surgindo na Bolívia e no Peru. A novidade, de certo modo, esmorece o pretenso sucesso do Brasil no combate ao desmatamento, visto que o sistema de monitoramento do país não é capaz de detectar áreas de perda florestal pequenas.

Ao longo da última década, os dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) têm mostrado grandes quedas no desmatamento da Amazônia brasileira. Depois de um pico de aproximadamente 27 mil quilômetros quadrados de perda florestal em 2004, os dados do INPE indicaram que o desmatamento diminuiu drasticamente para menos de 5 mil quilômetros quadrados em 2012. Desde então, os dados mostram que o desmatamento na região permanece relativamente baixo se comparado aos anos anteriores, com especialistas atribuindo a queda, em grande parte, ao fortalecimento da legislação ambiental em meados dos anos 2000.

Porém, a queda do desmatamento no Brasil pode não ser tão acentuada como esses números sugerem. O INPE usa um sistema de monitoramento por satélite chamado PRODES para procurar por perdas de cobertura florestal na Amazônia, um sistema que tem sido aclamado por conservacionistas como a grande força motriz por trás da queda do desmatamento no Brasil. Entretanto, o PRODES só é capaz de detectar clareiras maiores do que 6,25 hectares, o que significa que eventos menores de desmatamento podem passar despercebidos.

A floresta amazônica é o lar de uma variedade enorme de plantas e animais, como este gato-maracajá (Leopardus wiedii).

Com o objetivo de obter um panorama mais abrangente do desmatamento na floresta amazônica, um grupo de pesquisadores do Reino Unido e do Brasil usou uma outra base de dados de monitoramento por satélite, capaz de detectar perdas de cobertura florestal em uma escala muito menor. Desenvolvida pela Universidade de Maryland, nos Estados Unidos, essa base de dados, chamada Global Forest Change (GFC), apresenta uma resolução espacial de 30 metros. Os resultados desse estudo foram recentemente publicados na Nature’s Scientific Reports.

Usando a base de dados GFC, os pesquisadores analisaram os eventos de desmatamento na Amazônia ocorridos entre 2001 e 2014 e constataram que a vasta maioria — 96,4 por cento — era menor do que 6,25 hectares. O Brasil e a Bolívia eram os únicos países amazônicos em que o tamanho médio das clareiras era maior do que 1 hectare. No Brasil, o tamanho médio era de 15,6 hectares, mas o grupo descobriu que esse número vem diminuindo desde 2004. Segundo os pesquisadores, essa redução no tamanho médio das clareiras indica que há uma diminuição dos eventos de desmatamento em larga escala e um aumento dos eventos em pequena escala.

Ao todo, os dados indicam que 34 por cento dos pontos de desmatamento da Amazônia brasileira eram menores que 6,25 hectares. Em outras palavras, verificou-se que mais de um terço dos eventos de desmatamento que aconteceram nas florestas brasileiras entre 2001 e 2014 podem ter sido pequenos demais para ser detectados pelo sistema de monitoramento do PRODES.

O grupo também revelou algumas tendências específicas correntes na Amazônia. Em primeiro lugar, a expansão do famigerado “Arco do Desmatamento” — um enorme cinturão de perda florestal que se estende pela porção central do Brasil — parece estar desacelerando. Os dados mostram que houve menor perda de cobertura florestal nessa região em 2008–2014 do que em 2001–2007.

O estudo também aponta que novos focos de desmatamento estão surgindo na Bolívia, no Peru e, em menor proporção, na Colômbia. Na Bolívia, o foco, que fica nos estados de Santa Cruz e Beni, parece ser o maior e o mais intenso. Com aproximadamente 300 quilômetros quadrados de perda de cobertura florestal em 2001–2007, o desmatamento aumentou rapidamente em 2008–2014, para aproximadamente 9.650 quilômetros quadrados.

Focos de perda florestal na Amazônia com base nos escores z (estatística Getis Ord Gi*) dos dados GFC para dois períodos: 2001–2007 e 2008–2014, usando o ArcGIS 10.4.1. Valores maiores indicam maior acúmulo de pontos de desmatamento. Imagem cortesia de Kalamandeen et al., 2018 (CC BY 4.0)

No Peru, os dados GFC mostram um foco recente de perda florestal na parte central do país, que surgiu somente na segunda metade do estudo. Nesse país, os dados indicam 2.066 quilômetros quadrados de perda florestal entre 2008 e 2014. A Colômbia também apresenta um novo foco de desmatamento próximo à fronteira com o Equador e o Peru.

Segundo os pesquisadores, é provável que o novo foco de desmatamento no Peru seja consequência de um incremento na produção de óleo de palma nas regiões de Ucayali e San Martin. Para a Bolívia, também foi destacada a agricultura industrial — especificamente o cultivo de soja, que foi “empurrado” para o outro lado da fronteira pela Moratória da Soja, um programa brasileiro de proteção ambiental.

Em relação à expressiva elevação do desmatamento em pequena escala no Brasil, os pesquisadores afirmam que os resultados confirmam estudos anteriores que indicam um aumento no desmatamento feito por pequenos produtores. Porém, consideram que isso também pode estar “refletindo parcialmente as tentativas dos grandes produtores de evitarem o monitoramento”.

O estudo encontrou poucas regiões que não seguem essa tendência de desmatamento em pequena escala, com aumentos similares tanto dentro como fora de áreas protegidas.

Densidade de perda florestal (km2 de perda florestal por 100 km2 de superfície terrestre) em áreas protegidas na Amazônia, calculada com os dados do GFC para dois períodos: (a) 2001–2007 e (b) 2008–2014, usando ArcGIS 10.4.1 (www.esri.com). Para facilitar a visualização, não é exibido o desmatamento fora de áreas protegidas. [Fonte dos shapefiles das áreas protegidas: UNEP-WCMC e IUCN (2016), Protected Planet: The World Database on Protected Areas (WDPA), outubro, 2016, Cambridge, UK: UNEP-WCMC e IUCN. Imagem cortesia de Kalamandeen et al., 2018 (CC BY 4.0)

“Essas perdas de cobertura florestal em pequena escala representam um desafio novo e alarmante para os esforços de conservação da Amazônia, já que elas são inerentemente mais difíceis de monitorar e controlar”, publicou o grupo de pesquisadores. “As áreas protegidas são consideradas fundamentais na redução do desmatamento e das emissões de carbono. Nossos resultados sugerem que pode ser preciso rever as estratégias de manejo das áreas protegidas da Amazônia para levar em consideração a ameaça crescente das perdas florestais em pequena escala”.

De acordo com os pesquisadores, a resolução de 6,25 hectares do sistema PRODES não é suficiente e é altamente recomendável que o Brasil implemente uma base de dados de maior resolução, que opere durante o ano todo, para combater o desmatamento.

“De maneira geral, esses resultados promovem a conscientização sobre novas ameaças, que não são representadas nas estatísticas em nível nacional, e apresentam novos desafios para a conservação da floresta amazônica”.

 

Citações:

Kalamandeen, M., Gloor, E., Mitchard, E., Quincey, D., Ziv, G., Spracklen, D., … & Galbraith, D. (2018). Pervasive Rise of Small-scale Deforestation in Amazonia. Scientific Reports, 8(1), 1600.

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