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Código Florestal falha em proteger os peixes da Amazônia

  • Um grupo de cientistas afirma que o Código Florestal Brasileiro não considera os grandes impactos que a agricultura pode causar no habitat dos peixes, como os rios e afluentes da floresta tropical.

  • O estudo catalogou mais de 130 espécies de peixes, algumas delas consideradas inéditas para a ciência, no leste da Amazônia brasileira.

  • Os autores defendem medidas de proteção que englobem bacias inteiras e as complexas redes de drenagem que, em conjunto, formam a força vital da floresta amazônica.

Um novo estudo demonstra que a vastidão de espécies de peixes encontradas nos rios e afluentes da Amazônia não recebe muita proteção contra os efeitos da agricultura na legislação atual, a exemplo do Código Florestal Brasileiro.

As proteções legais existentes geralmente são voltadas à vegetação das florestas, e quase sempre compreendem áreas nas imediações de cursos d’água, bem como a vida existente em sua superfície.

“Quando pensamos sobre a biodiversidade da Amazônia, costumamos imaginar pássaros coloridos, mamíferos, insetos e anfíbios”, afirma Cecília Gontijo Leal, ecologista do Museu Emílio Goeldi, do Brasil, em uma declaração. “Mas os pequenos rios da Amazônia, e seus adjacentes, apresentam uma biodiversidade incrível também”.

Um rio amazônico. Foto: Cecília G. Leal/ Museu Emílio Goeldi.

Praticamente uma em cada dez espécies de peixes do planeta vivem na Amazônia. Cecília e seus colegas acreditam que a agricultura esteja danificando o habitat de muitos desses peixes, já que os rios correm tanto em áreas protegidas como em áreas privadas, e o Código Florestal geralmente exige proteção apenas para as imediações próximas aos rios. O grupo observou os prováveis impactos em 83 rios do leste da Amazônia brasileira nos anos de 2010 e 2011, e catalogou 24.420 peixes que pertencem a mais de 130 espécies.

“Em apenas um trecho de um dos rios (150 metros ou 492 pés) encontramos mais espécies de peixes do que as que existem em países como a Suécia ou a Dinamarca”, afirma Cecília. “Algumas delas eram inéditas para a ciência, e outras foram encontradas em alguns rios em particular”.

“Muitas dessas espécies podem estar em risco por conta de crescentes mudanças que estão longe do alcance dos esforços de conservação”, ela acrescenta.

Os pesquisadores descobriram que a quantidade de peixes que eles encontraram fora atingida por mais do que apenas as possíveis mudanças no ambiente ribeirinho ou nas medições de cobertura florestal, abrangidas pela legislação brasileira. O que causou um impacto maior na fartura de peixes foram as mudanças no habitat aquático, tais como na qualidade da água, na quantidade de sombra e no subsolo dos rios. Formas de mitigar esses impactos humanos indiretos não são abordadas pelo conjunto de proteções legais no Brasil. Os resultados foram publicados online em 12 de novembro na revista Journal of Applied Ecology.

Os autores defendem que os esforços de conservação devem compreender bacias inteiras e as complexas redes de drenagem que, juntas, formam a força vital da floresta amazônica.

Um tetra puxa-puxa (Inpaichthys kerri), peixe encontrado na Bacia Amazônica. Foto: harum.koh [CC BY-SA 2.0 ], via Wikimedia Commons

“A saúde de pequenos rios amazônicos depende da saúde das áreas de drenagem dos quais eles fazem parte”, afirma Toby Gardner, um dos autores do estudo e ecologista do Instituto Ambiental de Estocolmo. “Florestas distantes das margens também são importantes, assim como outros fatores que são negligenciados pela legislação, como estradas de terra e a crescente intensificação da agricultura”.

Os cientistas reconhecem a grandeza do desafio, mas também sabem que as implicações em proteger essas espécies de peixes vão além dos limites das maiores florestas tropicais do mundo.

“Nossos resultados destacam os complexos desafios de conservação dos rios das florestas tropicais” afirma o coautor Paulo Pompeu, ecologista da Universidade Federal de Lavras. “Proteger a biodiversidade é importante, não somente para a Amazônia, mas também para o mundo”.

REFERÊNCIA

Leal, C. G., Barlow, J., Gardner, T. A., Hughes, R. M., Leitão, R. P., Mac Nally, R., … & Ferreira, J. (2017). Is environmental legislation conserving tropical stream faunas? A large‐scale assessment of local, riparian and catchment‐scale influences on Amazonian fish. Journal of Applied Ecology, 1–15. http://doi.org/10.1111/1365-2664.13028

Foto do tetra puxa-puxa por: harum.koh.

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