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Florestas preservadas que são cruciais para a resiliência ao ecossistema, clima estável

  • Três estudos sul-americanos recentes enfatizam a importância de florestas preservadas quanto a um habitat saudável e um clima estável – tanto da região quanto de regiões mais distantes.

  • O primeiro estudo concluiu que a integridade da floresta é crucial para a estabilidade e resiliência ao habitat. A degradação torna difícil para a Caatinga brasileira recuperar-se da seca intensa devido a mudança climática. Florestas protegidas são mais flexíveis em relação a seca.

  • Outro estudo mostrou que grandes mudanças no uso do solo no Brasil central e ao norte da Argentina resultou no aumento do calor durante a época de seca em toda a América do Sul, com alterações na produtividade de plantas na Amazônia à 500 km da área afetada.

  • O exemplar de um terceiro estudo concluiu que grandes desmatamentos futuros em qualquer lugar da Amazônia irão, drasticamente, reduzir a precipitação no sudoeste da Amazônia – contabilização de aproximadamente 25 por cento do reservatório amazonense – e o reservatório de La Plata.

Caatinga após a chuva. A Caatinga é uma floresta de habitat seco que pode ser encontrada no nordeste do Brasil. Adaptada a épocas de seca, a vegetação responde ao retorno da chuva. Um novo estudo mostra que a resiliência à seca da floresta da Caatinga é firmemente influenciada por sua condição e por seu status de protegida. Imagem: A. Duarte via flickr, licença CC BY-AS 2.0.

Três novos estudos sul-americanos apresentaram a importância de florestas preservadas, saudáveis, em relação à resiliência aos ecossistemas locais, à estabilidade do clima local, e ainda, ao crescimento saudável de centenas de milhas de florestas.

A nova pesquisa ajuda a limitar a grande quantidade de conexões interligadas entre árvores e o ambiente em sua volta: florestas ajudam a criar microclimas locais, gerar tempestades e, também, aumentar o nível de carbono e oxigênio globais. O desmatamento pode alterar e degradar o ambiente.

Aumento de resiliência a secas em florestas

O primeiro estudo, publicado na Biotropica, analisa um habitat específico localizado no nordeste do Brasil. A floresta da Caatinga é um habitat semiárido caracterizado por conter árvores espinhosas e arbustos, e plantas suculentas; por exemplo, o cacto, que são ambientados à seca contínua. Geralmente, quando a chuva retorna após a seca, a vegetação volta à vida..

Entretanto, pesquisadores preocupam-se que a Caatinga está muito vulnerável quanto às crescentes secas intensas que atingem a região, e alcançando os limites da recuperação. Secas extremas estão previstas para se tornarem mais comuns devido à mudança climática, portanto, a sobrevivência de um longo período da Caatinga dependerá da resposta do ecossistema sobre a mudança da situação.

Para investigar a resiliência à seca da Caatinga – ou seja, quão rápido a floresta responde à disponibilidade de água ao término da seca – pesquisadores de instituições brasileiras e bolivianas utilizaram imagens por satélites acopladas com dados de estações meteorológicas para analisar como a situação da vegetação da Caatinga mudou ao longo do tempo. Foram analisadas, especificamente, as diferenças na produtividade da vegetação (uma medida para crescimento vegetal) em resposta à seca e à chuva entre áreas que foram, ou não, desmatadas anteriormente, também em áreas sob extrema proteção, ou que foram designadas ao uso sustentável.

Arara-azul-de-lear (Anodorhynchus leari), uma espécie ameaçada endêmica da Caatinga. A floresta da Caatinga degradada e desprotegida foi menos resiliente à seca do que florestas intactas e áreas extremamente protegidas. Pesquisadores afirmam que uma proteção mais intensa é necessária para a conservação do bioma. Imagem: João Quental via flickr sob licença da CC BY 2.0.

Eles concluíram que a produtividade da vegetação sempre aumentou em resposta à chuva, mas a maneira em que aumentou foi altamente influenciada pelo status e condição de protegida.

Uma vez que a disponibilidade de água aumentou, áreas que foram anteriormente desmatadas tiveram a produtividade menor do que áreas intactas. Da mesma forma, a produtividade em áreas extremamente protegidas foi recuperada mais rapidamente que em áreas desprotegidas e de uso sustentável. Ainda mais, áreas extremamente protegidas tiveram uma produtividade ainda maior durante a pior das secas.

O que isso mostra, de acordo com os pesquisadores, é que a integridade da floresta é crucial para a estabilidade do habitat e resiliência a tal. A degradação torna difícil recuperar a Caatinga dos efeitos da mudança climática. Áreas extremamente protegidas não apenas resguardam a biodiversidade que há nelas, também agem como Guarda-Costas contra os impactos da mudança climática em todo o ecossistema.

O bioma da Caatinga é habitat para várias espécies endêmicas e ameaçadas: por exemplo, trinta por cento das 1200 espécies de plantas na região não são encontradas em outro lugar. A endêmica Arara-azul-de-lear (Anodorhynchus leari) é classificada como espécie ameaçada pela IUCN (União Internacional para Conservação da Natureza), e o Tatu-bola-da-caatinga (Tolypeutes tricinctus), que é encontrado primordialmente no habitat da Caatinga, é classificado como espécie vulnerável. Apesar de sua importância para a biodiversidade, apenas uma pequena fração de toda a Caatinga é, atualmente, área protegida, e é altamente ameaçada devido à perda e fragmentação do habitat.

Aumentar a rede de áreas protegidas, e defender as reservas existentes da evolução do status de proteção contra degradação que tem se espalhado por todo o Brasil sob o governo de Rousseff e Temer, afirmam os pesquisadores. Sem proteção suficiente, pode-se perder a Caatinga para a seca e desertificação.

Floresta Amazônica e pasto. Um estudo recente mostra que o desmatamento e o uso do solo e suas alterações ao sul da Amazônia influenciam o clima local e remoto. Imagem: Rhett A. Butler/Mongabay.

Identificação do clima de longa distância/Interligação entre as florestas

Um outro estudo encontrou que a degradação do habitat não é apenas importante localmente, mas também tem impacto em outros lugares. A pesquisa, que abrange toda a América do Sul, concluiu que alterações no solo já ocupado não apenas atinge o clima local diretamente, como também afeta a dinâmica do clima e vegetação em florestas distantes e inalteradas.

O estudo, publicado na Environmental Research Letters, utilizou simulações computadorizadas para explorar o impacto que alterações em solo usado e ocupado podem ter em relação ao clima e a produtividade. A equipe de pesquisa, liderada por especialistas da Universidade de Lund, na Suécia, focou nos impactos de alteração e uso intensos do solo em duas áreas – a região sul da área de florestas tropicais desmatadas na Amazônia no Brasil central, e os pastos amenos do norte da Argentina – ambos localmente, e por toda a bacia Amazônica.

Quanto às simulações, os pesquisadores usaram um modelo que incluía uma variedade de dados relacionados a tipos de vegetação, níveis de umidade do solo e a atmosfera acima e abaixo do abrigo. Dados climáticos e vegetativos foram associados para que alterações em um tivessem ligação com o outro.

Para medir o impacto da ocupação e uso e alteração do solo, a equipe, liderada por Minchao Wu, efetuou simulações no período de 1996-2005 com e sem os dados em uso e alteração do solo. Isso mostra como o clima e a vegetação seriam se o solo ainda estivesse em um estado mais natural, comparado com as consequências do desmatamento e degradação de habitats locais.

Para medir o impacto da ocupação e uso e alteração do solo, a equipe, liderada por Minchao Wu, efetuou simulações no período de 1996-2005 com e sem os dados em uso e alteração do solo. Isso mostra como o clima e a vegetação seriam se o solo ainda estivesse em um estado mais natural, comparado com as consequências do desmatamento e degradação de habitats locais.

Porém, a consequência mais surpreendente foi vista 500 Km de onde o uso e alteração do solo ocorreram: a produtividade das plantas amazonenses mudou como um resultado direto do desatamento que houve ao extremo sul.

Ainda mais, houve um contraste na resposta das florestas: o norte da Amazônia aumentou em produtividade durante o período de seca, enquanto a produtividade do sul da Amazônia diminuiu. Em ambos os casos a alteração foi em torno de 10 por cento.

Uma tempestade sob uma paisagem agrícola na Amazônia. A Amazônia produz aproximadamente metade de sua própria precipitação, e o desmatamento influencia no jeito que em que a água é reaproveitada pela atmosfera. Os três estudos apresentados neste artigo sugeriram que a alteração climática intensificará localmente os impactos de desmatamento, pela bacia amazonense e também pelo continente Sul Americano. Imagem: Rhett A. Butler/Mongabay

O uso e alteração do solo, afirmam os pesquisadores, causam um conjunto de mudanças interligadas às conexões entre a terra e o ar. Área aberta sem ser florestada é mais quente do que áreas cobertas por florestas, o que cria uma temperatura gradiente, ambas verticalmente – do solo ao céu – e horizontalmente – entre áreas abertas e florestadas. A temperatura gradiente leva a correntes de convecção, e isso, junto com mudanças na taxa de evapotranspiração – a circulação da umidade iniciada do solo, passando pelas plantas e caindo na atmosfera – influencia a extensão e o local da camada de nuvens.

O motivo das mudanças divergentes na produtividade? A camada de nuvens, ou a falta dela, afeta a quantidade de luz solar que atinge a copa das árvore alterando a quantidade de fotossíntese.

Alterações na distribuição de nuvens como resultado do aquecimento foram previstas em pesquisas parecidas, afirmou Jaya Khanna, uma especialista atmosférica da Universidade do Texas, em Austin, que não estava envolvida nesta pesquisa. A pesquisa de Wu avança mostrando como isso pode levar a uma produtividade reduzida pela região do sul da Amazônia, uma área “já identificada como uma região com risco de alterações climáticas”, afirmou Khanna. Ainda continuou dizendo que o futuro do intacto norte amazonense ainda é discutido, “pois essa região não possui água o suficiente e não é suscetível a aumento de temperatura devido ao uso do solo. Portanto, as consequências de um pequeno aumento na [produtividade] nessa região úmida devido a efeitos improváveis precisa de mais investigação”.

As implicações de alterações na produtividade são possivelmente abrangentes, explicou Wu. “Alterações na [produtividade] podem ter alguma relação à habilidade do ecossistema de absorver carbono”, disse ele. Alterar a disponibilidade de alimento para os herbívoros que vivem na Amazônia pode afetar “a cadeia alimentar do ecossistema”.

Como o desmatamento pode afetar padrões pluviométricos futuros

Um terceiro estudo, publicado na Geophysical Research Letters, focou no ciclo da água e no desmatamento ocorrente dentro da bacia amazônica.

Essa pesquisa, liderada por Clara Zemp, da Universidade de Göttingen, na Alemanha, observou onde a água estava entrando na atmosfera, por meio da evapotranspiração, e onde retornava à floresta como chuva. Assim como a pesquisa de Wu, foi concluído que o sul amazonense é especialmente vulnerável aos efeitos do desmatamento remoto.

Umidade evaporando das margens amazonenses. Alteração no uso do solo fora da região amazônica afeta o manto de nuvens sob as florestas intocadas na Amazônia a milhares de milhas de distância, resultando assim em aumentos e reduções na produtividade das plantas. Imagem: Charles Peterson via flickr sob licença da CC BY-NC 2.0.

Zemp utilizou uma combinação de imagens por satélite e simulações retratando vários cenários de futuros desmatamentos na Amazônia para analisar como padrões pluviométricos futuros possam ocorrer, e quais consequências podem surgir em relação à resiliência dos ecossistemas das florestas.

Entretanto, os métodos de Zemp, para focar no papel da evapotranspiração em si, não explicam os outros fatores influentes resultados do desmatamento; tais como as alterações em padrões de circulação atmosférica em que Wu focava. Além disso, Zemp ainda encontrou que as chuvas em períodos de seca podem diminuir de 2 à 8 por cento em torno de toda a bacia amazônica, e até 20 por cento localmente, até 2050. O cenário usado foi de desmatamento habitual, com o resultado exato dependendo do ajuste do modelo.

As regiões mais afetadas, de acordo com o estudo, serão o sudoeste amazonense – incluindo partes do Peru e da Bolívia, e os estados brasileiros Rondônia e Mato Grosso – e a bacia de La Plata que inclui partes no norte da Argentina, Uruguai Paraguai, Bolívia e Brasil. Para o sudoeste da Amazônia – em torno de 25 por cento da bacia inteira – o desmatamento presente em qualquer lugar na região é particularmente notícia ruim.

“Fiquei surpresa em ver isso, independentemente de qual parte da Amazônia é desmatada, é sempre a mesma região [sudoeste] que sofre mais em termos de impactos ecológicos”, concluiu Zemp. “Foi totalmente inesperado”.

Dois fatores podem explicar a vulnerabilidade nessa área, explicou Zemp: “Um, essa região está sob uma considerável influência climática em comparação como resto da floresta Amazônica, sendo que uma grande proporção dessa chuva é originada da transpiração e árvores localizadas por toda a bacia amazônica. Dois, a região é, atualmente, muito vulnerável à seca devido aos longos períodos de seca. Portanto, uma pequena redução da chuva devido ao desmatamento causa drásticos impactos ecológicos.

Operação de deflorestação ilegal na Amazônia. Os três estudos mostram a sútil, porém, potente influência da alteração de uso do solo em florestas adaptáveis, e mudança climática local, regional e em todo o continente Sul-americano. As descobertas surgiram em uma época em que o Brasil estava diminuindo suas proteções ambientais e avançando com projetos relacionados a gado, soja e outras expansões agrícolas em grande escala, mineração e as recentes propostas para construção de represas, rodovias, ferrovias e vias industriais, que podem ter algum efeito sob as florestas da Amazônia. Imagem: Sue Branford para Mongabay.

Impactos mais intensos devido à mudança climática

O que essas ligações climáticas e ecológicas de longa distância significam a longo prazo, considerando que as temperaturas globais, a intensidade da seca e os níveis de CO2 aumentam ao passar dos anos? Ambos Wu e Zemp concordam que essas influências progressivas tornarão as consequências do desmatamento mais acentuadas.

Mas, como exatamente isso vai acontecer pela Amazônia e pela América do Sul depende de onde a alteração do uso do solo ocorrerá, se a força do ventos alísios do Atlântico mudarem e da natureza exata dos períodos de seca futuros, explicou Wu. “A seca extrema ou períodos de seca muito longos sob a área desmatada potencializam a divergência termal pelas áreas amazonenses, e pode assim fortalecer a correlação entre fenômenos meteorológicos e ambientais”.

Embora esses três estudos possuem focos, previsões e conclusões diferentes, todos compartilham um mensagem fundamental: florestas intactas são necessárias para ecossistemas saudáveis e resistentes, perto ou longe, principalmente com a intensificação da mudança climática e de secas extremas.

“As regiões que identificamos como pontos de concentração de calor, onde o desmatamento teria o impacto ecológico mais intenso das florestas amazônicas, coincidem com regiões mais prováveis de serem degradadas ou desmatadas em um futuro próximo, de acordo com previsões recentes”, concluiu Zemp.

“Isso significa que a redução do desmatamento e degradação de florestas é urgente, para que consequências ecológicas dramáticas por toda a Amazônia possam ser evitadas, e especialmente na parte sudoeste que já indicou uma recuperação difícil após recentes secas extremas”.

Citações:

Acosta Salvatierra, L. H., Ladle, R. J., Barbosa, H., Correia, R. A., and Malhado, A. C. M. (2017) Protected areas buffer the Brazilian semi-arid biome from climate change. Biotropica doi:10.1111/btp.12459

Wu, M., Schurgers, G., Ahlström, A., Rummukainen, M., Miller, P. A., and May, W. (2017) Impacts of land use on climate and ecosystem productivity over the Amazon and the South American continent. Environ. Res. Lett. 12: 054016

Zemp, D. C., Schleussner, C.-F., Barbosa, H. M. J., and Rammig, A. (2017) Deforestation effects on Amazon forest resilience. Geophysical Research Letters 44: doi:10.1002/2017GL072955

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