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Compensação de 1 bilhão de dólares prometida aos prejudicados pela represa de Belo Monte não foi paga por completo?

  • O Consórcio Norte Energia, em um acordo vinculativo feito em 2011 com o governo federal brasileiro, concordou em pagar um bilhão de dólares aos moradores de Altamira, incluindo 9 grupos indígenas, como compensação pelos danos causados pela represa de Belo Monte. O Instituto Socioambiental (ISA), uma ONG de vigilância ambiental, relata que pouco foi pago até a data prometida, enquanto o consórcio responde que está cumprindo com as exigências.

  • A represa de Belo Monte teve um impacto significante no meio ambiente da região, exigindo o desvio de 20km do rio Xingu, reduzindo o fluxo fluvial em 80% em um trecho de 100km e deslocando povos locais. Oito mil famílias tiverem de se deslocar devido à construção da represa.

  • Segundo os críticos, apenas 15% da compensação necessária para proteger terras indígenas foi gasta. A Norte Energia não fortaleceu a segurança dos pontos de entrada para as terras indígenas, desrespeitando o acordo previamente feito. Uma falha que facilitou a entrada de madeireiros ilegais que cortaram quantidades significativas de madeira das terras nativas.

  • A infraestrutura que foi prometida para a coleta de lixo ainda não foi construída. Embora sistemas de esgoto subterrâneo e distribuição de água tenham sido concluídos pelo consórcio, nenhuma casa local tem acesso a essas conexões de água e esgoto. O consórcio alega que isso é responsabilidade da cidade.

The Arara Indians were among the groups who were supposed to receive compensation for the building of the Belo Monte dam. Photo courtesy of CIMI
Os Índios Arara estão entre os grupos que deveriam receber a compensação pela construção da represa Belo Monte. Foto cedida pelo grupo CIMI

No começo deste ano, o consórcio Norte Energia terminou a construção da gigantesca hidrelétrica Belo Monte – a terceira maior no mundo – localizada no município de Altimara, no estado do Pará, no coração da Amazônia.

Embora essa represa bastante polêmica esteja operante no momento, os críticos afirmam que o consórcio Norte Energia ainda tem de cumprir a compensação obrigatória de um bilhão de dólares prometida aos moradores de Altamira, incluindo nove grupos indígenas, que foi determinada pelo governo federal do Brasil em 2011 como condição para que o projeto fosse adjudicado.

O projeto causou um grande impacto na região e seus residentes, pois um desvio do Rio Xingu foi necessário, o que reduziu o seu fluxo natural em 80% ao longo de um trecho de 100 km do seu canal original. O projeto também obrigou que parte da população de Altamira, incluindo povos indígenas, fosse realocada.

De acordo com a ONG Instituto Socioambiental (ISA), apenas 15% da compensação necessária para proteger a terra das tribos indígenas foi gasta até agora.

O ISA tem acompanhado a degradação ambiental dessa região desde 2011, por meio de análises de imagens de satélite, vigilância sobre voos e trabalhos de campo. Essas observações apontam que a Norte Energia não protegeu adequadamente as terras indígenas em 21 pontos de entrada, proteção essa prometida originalmente. Foram criadas até a presente data apenas sete pontos de segurança, cuja eficácia é, entretanto, questionável. De acordo com o ISA, madeireiros ilegais têm invadido áreas indígenas demarcadas, e o desmatamento aumentou na área em torno do rio Xingu – atividades que continuaram mesmo após a conclusão da represa de Belo Monte.

Só em 2014, mais de 100 milhões de dólares em madeira foram roubados de Cachoeira Seca, terra indígena do povo Arara. De acordo com a ISA, os troncos são exportados para os mercados do Sul e Sudeste do Brasil. A ONG acredita que as toras de madeira também foram vendidas para atender às demandas da indústria da construção em expansão em Altamira, cidade cuja população cresceu 50% após o início da construção de Belo Monte. Hoje a cidade possui 150.000 habitantes.

The Belo Monte dam under construction. In a 2011 binding agreement with Brazil, the Norte Energia Consortium agreed to pay US$1 billion to Altamira residents, including 9 indigenous groups, in compensation for one of the world's largest hydroelectric projects. Photo courtesy of Agencia Brasil
A represa de Belo Monte em construção. Em um acordo com o governo brasileiro em 2001, o consórcio Norte Energia concordou em pagar aos moradores de Altamira, incluindo nove grupos indígenas, o valor de 1 bilhão de dólares em compensação por um dos maiores projetos hidrelétricos do mundo. Foto cedida pela Agência Brasil

“Essas Terras Indígenas e Unidades de Conservação, incluindo grandes bolsões de floresta, ricos em biodiversidade, estão sofrendo imensa pressão de Belo Monte. As medidas de segurança para esses territórios deveriam ter sido preventivas e executadas antes do início dos impactos previstos”, afirma o advogado do ISA, Bivany Rojas. “Esperar até que a represa fosse concluída para aplicar medidas de proteção e vigilância territorial no local como algo pensado a posteriori é irresponsável e ineficaz”, acrescentou.

Segundo o ISA, promessas importantes que foram feitas a outros cidadãos de Altamira não foram cumpridas pelo consórcio Norte Energia. A ONG ainda informa que 8.000 famílias – cerca de 40.000 pessoas – foram removidas de suas casas para a construção da hidrelétrica.

Os sistemas de coleta de lixo e saneamento básico prometidos ainda não foram implementados. E, embora um sistema subterrâneo de esgoto e de distribuição de água tenha sido construído pelo consórcio, nenhuma casa foi conectada ao sistema ainda. Os críticos declaram que esta falta de infraestrutura de água e saneamento poderá representar uma séria ameaça de crise de saúde pública.

“Saneamento básico, distribuição de água encanada, esgoto … Tudo isso deveria ter sido feito antes da represa estar cheia e em operação. Essas foram as pré-condições determinadas pelo governo”, afirma Luiz Claudio Pereira, secretário de Planejamento de Altamira em uma entrevista para o site Colabora.

A Norte Energia respondeu dizendo que a conexão de residências à rede de esgoto é de responsabilidade da cidade. A empresa acrescenta que toda a infraestrutura está funcionando nos cinco CUR (Coletivos Urbanos de Reassentamento), bairros criados pela Norte Energia para a realocação das famílias removidas. A empresa também afirma que todas as famílias deslocadas “obtiveram compensação, aluguel social ou novas casas”.

A Norte Energia é conhecida por ter cumprido a obrigação de construir 378 salas de aula em escolas locais. Mas muitas dessas escolas permanecem fechadas e sem professores em partes rurais de Altamira, enquanto a demanda por escolas aumenta em grande parte devido ao afluxo da população para construir a represa. Em 2012, a cidade contava com 24.791 crianças e adolescentes matriculados. Em 2015, esse número subiu para 27.486 em escolas superlotadas. A empresa diz que cumpriu a sua obrigação de construir as instalações necessárias, e que agora é tarefa do governo direcionar as crianças às escolas e custear as salas de aula e professores. A empresa observa que não tem nenhum programa ou política especial para incentivar as crianças a assistirem as aulas.

Conforme afirmam os críticos, superlotação, pouca infraestrutura, serviços públicos inadequados e o pagamento insuficiente dos funcionários públicos têm resultado em um declínio na qualidade de vida em Altamira. A conclusão da represa no início deste ano também gerou aumento acentuado do desemprego.

Uma medida do declínio nos padrões de vida durante os anos da construção de Belo Monte pode ser encontrada nas estatísticas criminais. O número de adolescentes detidos pela polícia de Altamira aumentou dramaticamente: houve apenas 27 prisões em 2010, o ano anterior ao início da construção. Segundo um cálculo mais recente, o índice subiu para 66 detenções em 2011, 175 em 2012, 189 em 2013 e 182 em 2014. Isso é um aumento de quase sete vezes em prisões de adolescentes em apenas quatro anos, com todas as outras formas de crime também em ascensão durante este período.

Agora, com a conclusão da represa, algumas pessoas se mudaram de Altamira em busca de outros empregos. Mas é provável que a polêmica e o debate em Altamira sobre se a Norte Energia cumpriu ou não as várias compensações prometidas continuem por muitos anos.

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