Os conservacionistas se tornaram pessimistas demais para o seu próprio bem — e para o bem de suas causas? Cachoeira Tad Lo, em Laos. Foto: Rhett A. Butler.
Eis um desafio: levar um conservacionista para tomar uma bebida e perguntar sobre o seu trabalho. Em nove de dez vezes — ou mais do que isso — você irá embora se sentindo frustrado, desapontado e completamente sem esperanças. Você ouvirá sobre as florestas tropicais sendo derrubadas para fabricação de óleo de palma ou de pauzinhos para comida oriental, ou ainda uma espécie recém-descoberta que foi extinta, ou um governo que é pior do que ambivalente, é corrupto, ou uma misteriosa corporação que está fazendo alguma coisa terrível para o ecossistema e para a população local apenas para fazer feliz os gananciosos acionistas. Se a conversa se estende – e mais bebidas são compradas (é bem provável que você pagará: os conservacionistas não ganham muito) – com certeza você ouvirá sobre o aumento das temperaturas no mundo todo e o derretimento das geleiras; como os oceanos estão quase que vazios e se acidificando; como as principais florestas estão quase todas sumindo; como não cessa o crescimento da população humana e como a maior parte das espécies do mundo está propensa à ser extinta em algumas centenas de anos.
Até hoje, poucos cientistas conservacionistas não estão tentando salvar apenas as espécies da extinção, mas também estão trabalhando para salvar seus habitats – o trabalho de suas vidas – de entrarem em total desespero. Eles argumentam que o tom cada vez mais sombrio dos conservacionistas ameaça minar o recrutamento de futuros cientistas e ignora as muitas histórias positivas que acontecem no solo. O pior de tudo é que o constante pessimismo pode na verdade estar causando a indiferença do público em geral.
“A biologia de conservação tem se tornado, sem sombra de dúvidas, a mais depressiva das ciências”, disse James K. Sheppard, um cientista de conservação do Zoológico de San Diego, ao Mongabay.com.
Em 2010, Sheppard e seu colega, Ron Swaisgood, Diretor Científico Geral, na Estação Biológica Cocha Cashu, no Peru, escreveram um artigo na BioScience sobre como a ciência de conservação precisa de um pouco de esperança. A publicação estimulou várias cartas e, de acordo com Sheppard, provou ser o seu artigo mais popular.
Panda utilizando um colar GPS. As populações de Panda estão se estabilizado em grande medida e podem até estar em crescimento, de acordo com o especialista Ron Swaisgood. Foto da Academia de Ciências da China. |
“Não podemos ignorar as notícias ruins: elas são reais e seria um desserviço esquivar-se delas”, comentou Swaisgood em uma entrevista. “Mas o cérebro humano é programado para esforçar-se apenas quando há uma razão para acreditar que seus esforços farão a diferença. Chame isso do que quiser, mas o rótulo conveniente para esta crença, de que a ação de alguém tornará as coisas melhor, é esperança”.
Swaisgood aponta para a desoladora mensagem transmitida na mudança climática que, ao menos nos Estados Unidos, pode ter representado um papel significante no atraso da ação e incitado o negacionismo, de acordo com vários estudos psicológicos recentes.
“A espada de Dâmocles acima de nossa cabeça não é a imagem que irá envolver as pessoas para ação. Precisamos mobilizar os indivíduos para unirem-se a um movimento que tornarão as coisas melhores. Não melhor do que foram, mas melhor do que seriam se não fizéssemos nada”, afirmou.
A atual visão do profeta da desgraça da conservação também ameaça pressionar os futuros conservacionistas que têm personalidades mais otimistas, segundo Sheppard.
“Uma cultura generalizada de negatividade na conservação atrairá riscos somente às personalidades que são excessivamente pessimistas, em vez de uma mistura saudável de esperança e pragmatismo”, comentou Sheppard. “Estes tipos de pessimismos poderiam conduzir a cultura de conservação ainda mais ao desespero, atraindo cada vez mais pessimistas para o campo em um espiral decrescente de ruína e tristeza.”
Somado a isso, Swaisgood disse que os professores de conservação precisam pensar como tais mensagens desoladoras estão sendo visualizadas pelos jovens e estudantes impressionáveis que querem fazer a diferença no mundo. Muitos desses estudantes podem escolher outros planos de carreira se estiverem sufocados pela negatividade na conservação.
“Enquanto nós, biólogos de conservação, estamos reportando as rápidas taxas de extinção das espécies, os físicos nucleares informam a descoberta excitante de novas partículas quanta”, escreveu a dupla em seu artigo em 2010. “Enquanto tentamos levantar o perfil público da destruição do habitat e alertar sobre uma Terra depauperada pelas mudanças climáticas, os astrônomos transferem imagens de vistas gloriosas de novos mundos prístinos emitidos a partir de sondas intrépidas e telescópios espaciais”.
Não quer dizer que a ciência de conservação não tem tantas maravilhas, mas os conservacionistas usaram seu tempo nos meios de comunicação para explicar o desastre e não compartilharam suas descobertas e êxitos.
Condor da Califórnia com identificações com GPS. Os últimos condores da Califórnia foram retirados da natureza na década de 1980, hoje foram reintroduzidos no meio silvestre na Califórnia, em Arizona e no México. Sem uma ação de conservação intensiva, as espécies estariam, com certeza, quase que extintas hoje. Foto: James Sheppard/Zoológico de San Diego.
“Ao compartilhar nossas histórias de sucesso de conservação proporcionaremos uma prova do conceito de que as ações positivas podem ter resultados positivos; devemos fazer melhor ao compartilhar essas histórias, não apenas nossos medos mais sombrios e as perdas mais desapontantes”, comentou Swaisgood. “Os cientistas de conservação devem liderar este esforço, não devem ficar de fora abanando os dedos com desdém na ingenuidade daqueles que se atrevem a compartilhar uma história de sucesso de conservação imprecisa e cordial que transmita boa sensação”.
Segundo os cientistas, há muitas formas de devolver a esperança na área sem ignorar os grandes desafios.
“Isto pode incluir sessões e oficinas em conferências internacionais e simpósios que descrevem histórias de sucesso de conservação. Os jornais poderiam instruir os autores dos artigos científicos a incluírem uma descrição de como seus trabalhos proporcionarão um resultado de conservação mais esperançoso para seus estudos de espécies ou habitat. Os cursos acadêmicos poderiam inspirar os biólogos de conservação iniciantes com uma visão equilibrada das questões de conservação e estimulá-los a transmitirem uma mensagem mais esperançosa nos meios de comunicação e no envolvimento com o público”, sugeriu Sheppard.
Tanto Sheppard como Swaisgood viram a conservação ter sucesso por experiência própria com os condores da Califórnia, no México, e com os pandas, na China, respectivamente.
“Não ouvimos o suficiente sobre habitats críticos sendo protegidos com êxito pela nova legislação ou espécies sendo levadas de volta à vida pelos esforços heroicos dos conservacionistas”, disse Sheppard. “O resultado é que em vez de inspirar a esperança e a ação estamos promovendo o cinismo e a apatia”.
Imagine-se levando esse conservacionista novamente para tomar uma bebida, mas desta vez, imagine-se ouvindo sobre como o rinoceronte branco saltou de uma população de 50 para 20.000. Imagine-se ouvindo sobre o notável sucesso do Brasil no combate ao desmatamento ou como os lobos estão outra vez uivando pelos EUA e pela Europa. Imagine-se ouvindo sobre a queda brusca dos preços da energia solar e eólica ou como os povos indígenas estão protegendo suas florestas. Imagine-se aprendendo sobre a ambiciosa iniciativa Jaguar Corridor ou a repentina explosão de Áreas Marinhas Protegidas. Imagine-se ouvindo sobre os destemidos heróis da conservação que, dia após dia, ano após ano, lutam para proteger a natureza e, por conseguinte, eles mesmos. Ou ainda, imagine-se apenas ouvindo sobre a maravilha de passar um mês nas florestas nubladas dos Andes, a grandiosidade do mergulho subaquático em um recife de corais ou a beleza de uma mariposa atlas. Com tais histórias em sua cabeça isso poderia ser muito mais fácil do que sempre ouvir sobre os desafios ambientais enfrentados pela humanidade.
UMA ENTREVISTA COM JAMES K. SHEPPARD E RON SWAISGOOD
A longo prazo, a história do rinoceronte branco é um sucesso incrível. As espécies agora perfazem dezenas de milhares, de uma população que girava em torno de apenas 50. Contudo, esse êxito está atualmente ameaçado por uma crise de caça ilegal gigantesca. Foto: Rhett A. Butler.
Mongabay: What do you mean by a “culture of despair” in conservation?
James K. Sheppard: Temos notado um desânimo gradual na cultura da conservação que se manifesta especialmente em conferências de profissionais de conservação e reuniões daqueles de nós que trabalham na linha de frente na preservação e restauração de espécies e habitats. Por exemplo, após uma conferência internacional recente juntei um grupo de cientistas conservacionistas em início de carreira e estudantes de graduação para uma bebida no saguão do hotel. Todos concordaram que o padrão da pesquisa científica nas apresentações da conferência foi excelente. No entanto, todos também se queixaram que a mensagem final da maioria das palestras foi muito desoladora. A biologia de conservação tornou-se, indiscutivelmente, a mais deprimente das ciências!
Meus amigos em outros campos estão registrando novas descobertas emocionantes na pesquisa biomédica que podem melhorar o serviço de saúde ou estão revelando imagens surpreendentes dos mundos exóticos dentro do nosso sistema solar, ao passo que os cientistas de conservação estão descrevendo o destino cruel iminente deste animal gravemente ameaçado de extinção ou a devastação inexorável daquele habitat específico.
Ron Swaisgood: Muitos de nós, na área conservacionista, sentimo-nos cercados por más notícias; vivenciamos isso todos os dias, não apenas nas notícias das manchetes, mas na realidade que enfrentamos. Estamos perigosamente perto da adoção do pessimismo como nossa concepção de mundo. Como os colegas de escritório que se queixam constantemente das coisas ruins que a administração da companhia faz, nós conservacionistas compartilhamos um momento de conversas em comum que se concentram em como as coisas estão ruins, como a humanidade é imprudente e como o futuro parece desolador. Há, naturalmente, uma boa razão para o desespero, mas se nos sentimos mesmo dessa forma, sem esperança, então, estamos trabalhando apenas pelo salário. Precisamos reprojetar nossa concepção de mundo.
Mongabay: Como a mensagem atual dos conservacionistas poderia, de fato, tornar a situação pior?
James K. Sheppard: Foto cortesia de James K. Sheppard.
James K. Sheppard: É esperado um grau de desespero devido à natureza de tentativa do nosso trabalho, que muitas vezes coloca pequenos grupos de conservacionistas dedicados, ainda com recursos insuficientes, contra as forças intratáveis da burocracia, ganância, conflito e ignorância. Isso faz parte da lista de atribuições do cargo com as quais devemos lutar em uma base diária. Contudo, infelizmente, o desespero também está sendo promulgando pela forma com que lidamos com ele — temos uma tendência de relatar em excesso os aspectos negativos dos desafios da conservação, enquanto que quase não divulgamos muitos êxitos positivos. As histórias de conservação que ganham maior cobertura são, em geral, sobre a caça ilegal, branqueamento dos corais ou a extinção de um animal icônico, entre outras. Não ouvimos muito sobre os habitats críticos sendo protegidos com sucesso pela nova legislação ou espécies sendo levadas de volta à vida pelos esforços heroicos dos conservacionistas. O resultado é que em vez de inspirar a esperança e a ação estamos promovendo o cinismo e a apatia.
Ron Swaisgood: Não podemos ignorar as notícias ruins: elas são reais e seria um desserviço esquivar-se delas. Mas o cérebro humano é programado para esforçar-se apenas quando há uma razão para acreditar que seus esforços farão a diferença. Chame isso do que quiser, mas o rótulo conveniente para esta crença, de que a ação de alguém tornará as coisas melhor, é esperança”.
Com muita frequência, os apelos de conservação usam o medo para motivar as massas. Este tipo de transmissão de mensagens negativas pode ser contraprodutivo, fazendo com que as pessoas abandonem a esperança e cultivem uma cultura de desespero. Se toda esperança estiver perdida, poderia também ter se destacado enquanto pôde. A boa notícia é que estamos testemunhando uma transformação profunda em como as organizações de conservação estão formando suas mensagens para o público. Cada vez mais vemos os profissionais se concentrarem no que pode ser feito, com menos atenção para o que já fizemos. A espada de Dâmocles acima de nossa cabeça não é a imagem que irá envolver as pessoas para ação. Precisamos mobilizar os indivíduos para unirem-se a um movimento que tornarão as coisas melhores. Não melhor do elas foram, mas melhor do que seriam se não fizéssemos nada”, afirmou.
Mongabay: O que a psicologia diz aos conservacionistas sobre como aproximar os meios de comunicação e o público?
Um campo de soja encontra o Amazonas. Embora muitas dificuldades permaneçam, o Brasil obteve um imenso sucesso ao frear o desflorestamento ao longo da década passada. Foto: Rhett A. Butler.
Ron Swaisgood: Não sou psicólogo, mas é hora de nós, os conservacionistas, aprendermos algumas lições do corpo crescente de pesquisa empírica que mostra o que motiva as pessoas à ação. A conservação é inerentemente um programa baseado na ação e nossas mensagens devem motivar as pessoas a fazerem mais do que emitirem um cheque para sua ONG de conservação de preferência. Não podemos mentir para o público, nem podemos ignorar as más notícias; não seria sincero. Mas podemos aprender a partir das iniciativas grandiosas em modificar o comportamento nos interesses de saúde pública e segurança, por exemplo.
Para mim, um dos exemplos mais influentes de lições aprendidas da psicologia vem do esforço intenso e, em grande medida, dos esforços frustrados em conseguir que o cidadão dos Estados Unidos comprasse a ideia de mudanças climáticas. Nenhuma outra questão destacou-se mais na transmissão de mensagens de conservação em nossos tempos. Até hoje, a crença de que as mudanças climáticas são verdadeiras está se desgastando e há um pequeno apoio público e político para tomar decisões difíceis e sacrifícios para reduzir os gases de efeito estufa. Por que não conseguimos tão miseravelmente abordar essa questão definidora dos nossos dias? Segundo um prestigioso think tank formado pela Associação Americana de Psicologia, talvez isso possa ser por causa das “Tentativas bem-intencionadas de criar urgência sobre as mudanças climáticas ao apelar para o medo de desastres ou riscos à saúde, muitas vezes resultam exatamente no oposto da resposta desejada: rejeição, paralisia, indiferença ou ações que podem criar riscos maiores do que serem mitigados”(Swim J, Clayton S, Doherty T, Gifford R, Howard G, Reser J, Stern P, Weber E. 2010. Psychology and Global Climate Change: Addressing a Multi-faceted Phenomenon and Set of Challenges. Associação Americana de Psicologia)
As mensagens que apelam para os medos ou abordagens de “faça isto ou aquilo” têm menor probabilidade de terem sucesso do que as mensagens positivas e fortalecedoras. Cultivar expectativas positivas de que as ações de alguém trarão resultados positivos (isto é, esperança) é muito mais persuasivo e bem-sucedido para efetuar a mudança. Considerando esta lição como aprendida para a conservação significa que precisamos nos concentrar em quais ações podem ser adotadas para ocasionar um futuro mais brilhante, não como o nosso fracasso em atuar trará a ruína. Ao compartilhar nossas histórias de sucesso de conservação proporcionaremos uma prova do conceito de que ações positivas podem ter resultados positivos; devemos fazer melhor ao compartilhar essas histórias, não apenas nossos medos mais sombrios e as perdas mais desapontantes. Os cientistas de conservação devem liderar este esforço, não devem ficar de fora abanando os dedos com desdém na ingenuidade daqueles que se atrevem a compartilhar uma história de sucesso de conservação imprecisa e cordial que transmita uma boa sensação.
Mongabay: Em qual proporção os conservacionistas dizem a verdade sobre as questões realmente verdadeiras — e a certa altura depressivas —, mas também estimulam a ação por meio da esperança?
Ron Swaisgood. Foto cortesia de Ron Swaisgood.
James K. Sheppard: Nunca devemos evitar de alertar o público para as questões de conservação urgentes em um momento de declínio da biodiversidade, de extinção de espécies e da fragmentação de habitats que continuam impactando os ecossistemas, colocando em perigo os meios de vida e degradando a função e a beleza do nosso planeta natural. De fato, é um dos nossos deveres principais como cientistas conservacionistas caracterizar as ameaças, dar sinal de alarme e reunir esforços para corresponder efetivamente a esses desafios.
No entanto, uma corrente constante de avisos horrendos e deprimentes vai simplesmente dessensibilizar o público para a gravidade da situação em vez de estimular uma resposta útil. Não é de admirar que as pesquisas de opinião recentes mostram que os problemas ambientais urgentes, como as mudanças climáticas, estão priorizados bem abaixo de outras preocupações, como a dívida nacional ou imigração. Devemos fazer um trabalho melhor para equilibrar os avisos com histórias positivas de como os esforços de conservação produziram com sucesso benefícios duradouros às espécies e aos habitats ameaçados de extinção, além de mostrarem que todos nós podemos, de fato, fazer uma diferença verdadeira e significativa.
Ron Swaisgood: Será um ato de equilíbrio sutil para compartilhar tanto as realidades deprimentes como as perdas significativas e verdadeiras para a natureza, enquanto também compartilha aquelas histórias de esperança e sucesso. É extremamente importante perceber que o objetivo não é, nem deveria ser, convencer as pessoas de que o meio ambiente está melhorando, de que a natureza está bem, mas, de preferência, é para convencer as pessoas de que suas ações podem criar uma opinião mais positiva da natureza do que se não agissem.
Esta versão mais esperançosa da conservação tem uma subcorrente triste que reconhece que são e continuarão sendo significantes, muitas vezes brutal, as perdas na luta para conservar algumas partes pequenas restantes da nossa herança natural.
Mongabay: Como poderia impregnar o pessimismo no impacto de conservação ao recrutar futuros conservacionistas, especialmente em um grupo diverso?
O Órix-da-arábia é a única espécie até hoje que foi de extinto na natureza a vulnerável na Lista Vermelha da IUCN – União Internacional para a Conservação da Natureza. Foto em Domínio Público. |
James K. Sheppard: Se desenharmos um paralelo com o mundo natural, vemos que as populações de animais com personalidades diversas tendem a ter capacidade de sobrevivência e flexibilidade comportamental aprimoradas em comparação com grupos mais uniformes. Por exemplo, uma mistura de indivíduos corajosos e tímidos dentro de uma população pode ser a resposta ideal a uma oportunidade de recurso de comida (os animais corajosos) ou uma ameaça do predador (os animais tímidos), mais provavelmente. Esta regra pode extrapolar-se à tomada de decisão em grupos humanos. Um dos atributos de definição que contribuíram para o êxito da presidência de Franklin Roosevelt foi a diversidade sem paralelo do seu escritório cuidadosamente escolhido. Uma personalidade moderada com um grau de pessimismo poderia ser capaz de lidar com os imperativos políticos da conservação melhor do que uma Poliana irrealista. No entanto, uma cultura generalizada de negatividade na conservação atrairá riscos somente às personalidades que são excessivamente pessimistas, em vez de uma mistura saudável de esperança e pragmatismo. Esses tipos de pessimismos poderiam conduzir a cultura de conservação ainda mais ao desespero, atraindo cada vez mais pessimistas para o campo em um espiral decrescente de ruína e tristeza. A conservação precisa de uma dose reforçada de esperança e boas notícias para atrair um equilíbrio de personalidades que podem aturar as coisas desagradáveis que acontecem nos desafios de conservação enquanto desenvolvem e implementam estratégias de conservação eficazes.
Ron Swaisgood: Eu pediria que cada pessoa que contempla os impactos do pessimismo da conservação reservasse um momento para se colocar no lugar de um estudante universitário de vinte e poucos anos escolhendo uma trajetória de carreira. Pegue uma estudante que gosta de se esforçar ao máximo, ser parte de uma causa maior do que ela mesma e (ingenuamente ela pode sustentar) não queira nada mais do que ajudar a fazer o mundo um lugar melhor. Ela pode ver as realidades frias e duras de um mundo em uma má situação, mas não deseja nada mais do que fazer uma diferença. Agora, coloque essa pessoa em uma cultura do desespero, rodeada de profissionais que constantemente se queixam de como as coisas são difíceis e como nada pode ser feito além da redução dramática da população humana. A dissonância cognitiva entre sua compreensão do mundo e a compreensão do mundo prevalecente desta comunidade de conservação pode colocá-la no grande risco de fiançar, procurando outro caminho onde a sua indústria aplicada pode fazer uma diferença — a luta contra o câncer talvez ou o resgate de animais de estimação para uma sociedade humana.
Agora, considere a comunidade de conservação que ela deixou para trás, empobrecida pela sua ausência e muitos gostam dela, que somente poderia acreditar na sua causa o bastante para fazer de fato uma história de sucesso de conservação dela própria. Os conservacionistas parecem os mais habilitados para o suporte seguro de envelhecer ateístas brancos. Uma abordagem diferente poderia resultar em um grupo mais diverso de sustentadores? O êxito da conservação precisará de todos os tipos.
Mongabay: O que é esperança estruturada? Como isto pode ajudar os conservacionistas a modificarem sua perspectiva e sua transmissão de mensagens?
Precisam de um símbolo de sobrevivência? O solenodon sobreviveu ao cometa que destruiu os dinossauros, a divisão de continentes, a chegada dos seres humanos famintos, a clareira de florestas, a invasão da espécie alheia como ratos e cães, a chegada de europeus cruéis e ao surgimento do mundo moderno. Hoje, duas espécies sobrevivem, uma na República Dominicana (e possivelmente no Haiti) e outra em Cuba. Foto: Jeremy Hance.
James K. Sheppard: Recentemente houve certa discussão promissora da necessidade de mais esperança na conservação dentro da literatura científica e geral. Contudo, acreditamos que para esta conversa gerar uma verdadeira modificação longe do pessimismo devemos desenvolver e promover uma transformação de paradigma em direção à esperança estruturada. Tornar-se esperançoso, assim como ficar feliz, requer prática.
A esperança estruturada refere-se às práticas, rituais e ferramentas que nos estimulam a desenvolver e conservar um ponto de vista mais esperançoso da conservação, enquanto o pragmático restante sobre a conservação desafia. Isto pode incluir sessões e oficinas em conferências internacionais e simpósios que descrevem histórias de sucesso de conservação. Os jornais poderiam instruir os autores dos artigos científicos a incluírem uma descrição de como seus trabalhos proporcionarão um resultado de conservação mais esperançoso para seus estudos de espécies ou habitat. Os cursos acadêmicos poderiam inspirar os biólogos de conservação iniciantes com uma visão equilibrada das questões de conservação e estimulá-los a transmitir uma mensagem mais esperançosa nos meios de comunicação e no envolvimento com o público. Os conservacionistas precisam ser constantemente lembrados para terem esperança.
Ron Swaisgood: A esperança, como felicidade, não vem sempre fácil. Pesquisas no campo da “psicologia positiva” indicam que as pessoas que ativamente cultivam rituais e hábitos que as fazem sentirem-se felizes desenvolvem níveis mais altos de felicidade. Na ideia da esperança estruturada, estamos propondo que para atuar com mais esperança, devemos nos tornar mais esperançosos e para fazer isso será necessário que nos esforcemos com consciência para nos sentirmos esperançosos e para compartilharmos experiências que resultam em opiniões mais positivas no futuro. Estamos propondo que os profissionais de conservação (sim, até mesmo os acadêmicos) institucionalizem rituais que são um antídoto para o desespero. A suposição é que isso necessitará do esforço consciente até que com o tempo o hábito se torne uma segunda natureza.
Mongabay: Como o fato de passar mais tempo na natureza poderia ajudar tanto os conservacionistas como o público como um todo?
Ron Swaisgood: O tempo na natureza pode ser um antídoto ao pessimismo por causa dos efeitos bem documentados da natureza na saúde mental. Esse efeito deveria ser expressado em especial nos conservacionistas, que aparentemente vieram a este campo devido a um amor profundo pela natureza e em quase toda ocorrência esse amor pela natureza originou-se do tempo passado nela. O tempo significativo na natureza é um produto desaparecido, à medida que a sociedade se afasta da natureza na Era da Informação ou na Era do Vídeo. Ou, no caso dos conservacionistas, talvez a Idade do Registro de Dados (digital ou em árvores mortas processadas).
O tempo na natureza pode ter resultados restaurativos potentes e se sabe muito bem sua capacidade de aumentar a energia. O público em geral pode se beneficiar de uma melhor saúde física e mental, a conservação pode se beneficiar do recrutamento de mais pessoas à sua causa e as conservações profissionais podem lembrar-se porque se envolveram no movimento em primeiro lugar, fornecendo uma motivação poderosa para manter o esforço e, possivelmente, cultivar um pouco mais de esperança neles mesmos.
Encontre mais informações sobre este tópico nestes blogs:
- Swaisgood 2013. Conservation exhaustion and the children and nature movement.Children and Nature Network.
- Swaisgood, RR. 2010. From the neighborhood creek to the Institute for Conservation Research: transformational experiences in nature. San Diego Zoo’s Conservation Blog.
- Swaisgood, RR. 2010. The gift of nature, shared: how we launched our family nature club. Children and Nature Network.
Mongabay: Vamos terminar isto com uma nota feliz. Onde você vê a esperança na conservação hoje? ?
Graças aos conservacionistas, o condor da Califórnia está de volta aos céus novamente. Foto: James Sheppard/Zoológico de San Diego.
James K. Sheppard: A coisa realmente animadora sobre a esperança na conservação hoje é que, na verdade, está tudo ao nosso redor — você muitas vezes só tem que cavar um pouco para encontrá-la. Por exemplo, o Zoológico Global de San Diego onde trabalhamos tem muitas histórias de sucesso de conservação locais, nacionais e internacionais para estar orgulhoso e estas proporcionam exemplos muito necessários de como os grupos engajados de cientistas, veterinários, agências de gestão, interesses do setor privado e o público engajado podem se juntar e coordenar programas de conservação surpreendentemente eficazes.
Somente há alguns anos os céus do México privaram-se dos condores da Califórnia. Agora, com a ajuda dos nossos colegas mexicanos, há mais de 30 destes pássaros magníficos voando sobre a Baja do Norte, inclusive os primeiros filhotes gerados com sucesso em estado natural desde que a espécie foi extirpada na década de 1940. A esperança existe, só precisamos fazer um trabalho muito melhor para propagá-la.
Ron Swaisgood: Os conservacionistas na linha de frente estão vencendo batalhas com a esperança, todos os dias. Às vezes precisam lembrar eles mesmos deste fato, mas estão realmente fazendo progresso em muitas questões de conservação importantes atuais. A ciência da conservação amadureceu e floresceu e temos um depósito vasto de conhecimento para guiar a ação de conservação. Sem dúvida, muitos desafios estão adiante, mas a verdadeira esperança está nas ações dos administradores incansáveis da natureza.
Pessoalmente, tenho grande esperança nas circunstâncias modificadas do panda gigante, uma espécie com a qual trabalhei durante 19 anos. Quando comecei o trabalho com esta espécie icônica, a perspectiva foi desoladora, daí o título do trabalho original de George Schaller, “The Last Panda” (O Último Panda, em tradução livre). Ao longo dos anos o progresso foi notavelmente constante, apesar das contrariedades e desenvolvimentos tormentosos. Pode-se encontrar uma grande esperança na determinação do governo chinês, que reservou mais de 60 áreas protegidas de pandas (e os seus coocupantes), proibiu o corte de árvores e instigou um programa de reflorestamento grandioso. A cobertura de florestas aumentou, de fato, na China. Ao lado destes esforços, os cientistas trabalharam para ganhar uma compreensão mais profunda das exigências ecológicas dos pandas, estratégias de gestão da conservação melhoradas e reverteram o programa de luta pela pecuária de conservação, uma vez notório pelos seus fracassos. Como resultado, a população selvagem está estabilizada e pode estar aumentando. Sinto-me privilegiado por ter sido uma parte destes esforços e traz-me a esperança a um nível pessoal.
Referências:
- Swaisgood, Ronald R., and James K. Sheppard. “The culture of conservation biologists: Show me the hope!.” BioScience 60, no. 8 (2010): 626-630.