Notícias ambientais

O plano do Brasil para salvar a Floresta Amazônia



Responsável por metade do desflorestamento tropical entre 2000 e 2005, o Brasil é o fornecedor mais importante quando se trata do desenvolvimento de uma estrutura climática que inclui as emissões reduzidas advindas do desflorestamento e degradação das florestas (REDD). Mas a posição do Brasil sobre o REDD contrasta com as propostas colocadas por outros países tropicais, incluindo a Coalition for Rainforest Nations, um bloco de negociação de 15 países. Ao invés de defender uma abordagem de Mercado para o REDD, onde os créditos gerados a partir da conservação florestal seriam tratados entre os países, o Brasil está pedindo um gigante fundo de financiamento com doações das nações industrializadas. Os que contribuíssem não estariam elegíveis para os créditos de carbono que poderiam ser usados para atender a os obrigações de redução de emissões sob o tratado climático vigente.




O conceito de REDD é simples: as florestas tropicais armazenam cerca de 25 por cento do carbono terrestre do planeta, mais de 300 bilhões de toneladas. Quando as florestas são cortadas—sua vegetação é queimada e sua Madeira convertida em produtos—muito do seu carbono é liberado na atmosfera como dióxido de carbono. O desmatamento de 50.000 milhas quadradas de floresta tropical anualmente é responsável por aproximadamente 20 por cento das emissões globais advindas das atividades humanas—uma parcela maior que a de todos os aviões, navios, carros e caminhões do planeta juntos. Em outras palavras, apesar da atenção dada á auto-suficiência de combustível dos carros e o numero de vôos que as celebridades pegam, estacionando todos os jets e carros do mundo ainda não seriam suficientes para compensar as emissões anuais do desflorestamento global.


Mas reduzir o desflorestamento não é um esforço simples. As florestas estão sendo destruídas como uma conseqüência das forças da economia global—a demanda por madeira, polpa, carne, soja e palmeira de óleo—bem como a agricultura de subsistência. Reduzir ou eliminar o desflorestamento significa identificar esses condutores ao tornar as florestas valiosas como entidades vivas, ao invés de valer somente pelo que pode ser produzido quando elas são desmatadas. E a questão vai muito além da economia. Boa governança, incluindo reforço da lei, reconhecimento do direito ás terras, e justa distribuição dos benefícios, é a questão que exaltará ou prejudicará o REDD.

A atual postura do Brasil é compreensível—o país é hesitante em assinar um acordo que iria potencialmente comprometer seu crescimento para se tornar uma super economia global. Além do mais, como outras economias emergentes, o Brasil sente que por causa da mudança climática ser um problema criado pelos países ricos, o resultado de 150 anos de emissões, a responsabilidade é em maior parte deles, de identificar o problema. Em outras palavras, o Brasil não está desejoso de deixar os maiores poluidores da história—os Estados Unidos e Europa—fora do contexto sem reduzir suas próprias emissões.



“O Brasil não está interessado em dar aos países industrializados créditos de carbono baratos advindos da proteção da Amazônia se eles não vão parar de construir usinas de carvão,” disse William Boyd, professor de direito da Universidade de Colorado que tem trabalhado extensivamente nas questões políticas do REDD.



No entanto o Brasil está bem consciente dos impactos projetados da mudança climática. Os cientistas esperam que a mudança climática aumente o nível de chuvas no coração da Amazônia, agravando o risco de enchentes. Paradoxalmente, o sul irá sofrer com aumentada incidência da seca, que poderia devastar sua agricultura, e minar sua auto-suficiência em energia (bicombustíveis e poder hidrelétrico), e tornar vastas áreas de floresta tropical e savana em um barril de pólvora. O Brasil já provou o gostinho deste futuro. Uma severa seca em 2005—provocada por temperaturas acima do normal no Atlântico Tropical—causou muitos incêndios, reduzido fornecimento de eletricidade das usinas hidrelétricas, e transformaram rios em lagoas lamacentas, isolando comunidades e paralisando o comercio sediado nos rios. Enquanto isso, mês passado, os registros das enchentes mataram centenas e deixaram mais de 500 mil sem abrigo.



Reconhecendo essas ameaças á sua economia e antecipando algumas formas de acordos climáticos nos anos por vir, o Brasil anunciou ano passado um plano para reduzir o desflorestamento em 70 por cento baseado em 1996-2005, um movimento que cortaria emissões do desflorestamento—fonte de quase 80 por cento das emissões do país—em 4.8 bilhões de toneladas entre 2006 e 2017, uma quantidade maior que as emissões anuais do Canadá e da União Européia juntos. Para pagar o programa, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva criou o Fundo Amazônico, que ele quer financiar em torno de $21 bilhões através de doações dos países industrializados, individuais e empresas privadas. Mas sob o esquema atual, o esquema seria algo semelhante á ajuda ao desenvolvimento ao invés de um Mercado com compensações de carbono.





Alvos propostos do Brasil para reduzir o desflorestamento:
  • 2006-2009 11,400 sq. km por ano (2006-2008 média 12,500)
  • 2010-2013, 7,980 sq. km por ano
  • 2014-2017, 5,586 sq. km por ano



Mas os detalhes de como o Fundo Amazônico irá de fato reduzir o desflorestamento é algo abstrato, o governo da Noruega já concordou em doar até $1 bilhão—dependendo do sucesso do Brasil na redução do desflorestamento. Mas até então nenhum outro país colocou dinheiro no Fundo.



Brenda Brito, diretora executiva da Imazon, um Instituto de Pesquisa brasileiro, que está esboçando uma resolução para o Fórum da Amazônia Sustentável para apresentar nas próximas negociações climáticas, sugere que as doações podem não estar próximas, porque os países estão esperando para ver o que acontece nas próximas negociações climáticas das Nações Unidas em Copenhagen no mês de Dezembro.



“Eu acho que o fundo é uma boa iniciativa para demonstrar que é possível ter um mecanismo nacional de controle para concentrar recursos internacionais para o REDD, mas ao mesmo tempo não está claro se o fundo será compatível com um possível regime do REDD a ser criado em Copenhagen,” disse ela a mongabay.com. “Por exemplo, se houver uma decisão para criar um fundo internacional para o REDD, os outros países ainda iriam fazer doações para o Fundo Amazônico? Eu acho que tal incerteza pode estar afetando outras possíveis doações para o fundo e que as decisões em Dezembro serão fundamentais para determinar o futuro do Fundo Amazônico quanto ao “desejo dos países de se fazer doações.”


pastagem de gado e floresta úmida na Amazonia Brasileira




Na ultima década mais de 10 milhões de hectares – uma área do tamanho da Islândia – foi desmatada para pastagens de gado conforme o Brasil se tornou o maior exportador de carne do mundo. Agora o governo visa dobrar suas exportações no Mercado da carne para 60% até 2018 através de empréstimos com baixas parcelas, expansão da infra-estrutura, e outros incentivos para os produtores. A maior parte desta expansão é esperada ocorrer na Amazônia onde a terra é barata e disponível. 70 por cento da expansão do gado no país entre 2002 e 2006 ocorreram na região.

Outros são céticos de que uma abordagem baseada num fundo irá gerar dinheiro suficiente (estimado em $15-40 bilhões por ano) para prover incentivos para efetivamente reduzir o desflorestamento em uma escala global. Depois de tudo, os retornos da conservação de carbono terão que competir com os condutores do desflorestamento incluindo a criação de gado, agricultura industrial, atividade madeireira e plantações florestais.



Sergio Abranches, um jornalista ambiental brasileiro e comentador de radio, sugere uma terceira possibilidade para a falta de apoio: preocupações sobre a responsabilidade e governança. Há questões sobre se um esquema para reduzir o desflorestamento pode ser implantado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento do Brasil, BNDES, que é conhecido por financiar projetos que tem levado ao desmatamento florestal do que pela proteção ambiental. Alguns observadores questionam se o Brasil pode realmente controlar o desflorestamento, notando que o recente desflorestamento na Amazônia brasileira reflete muito mais nas tendências econômicas do que o reforço do governo.



Há também preocupações com o fato de se o Brasil usará o Fundo Amazônico para bloquear outras, mais eficientes, propostas de conservação ambiental.



“O fundo também será usado pelo Governo Brasileiro para se opor a propostas melhores estruturadas do REDD,” Abranches disse a mongabay.com. “Não há modelo algum por trás dele, ele está sendo estruturado no ar. Não há políticas claras quanto ao uso do dinheiro que ele arrecadaria.”



“Eu tenho medo de que isso beneficiará empresas e projetos que pouco estão relacionados á conservação florestal e uso sustentável, em detrimento de comunidades locais e investimento em ciência e tecnologia para desenvolver um novo e avançado modelo econômico para a Amazônia. Poderia, por exemplo, financiar criadores e exportadores de gado (os mesmo que aparecem em Análise recente do Greenpeace sobre criação de gado e desflorestamento) a melhorar suas atividades, ao invés de financiar empreendimento econômicos alternativos que poderiam se tornar uma alternativa á criação de gado na Amazônia.”



“Se o governo Brasileiro continuar a se opor á inclusão de florestas/REDD ao acordo climático é muito provável que as mais importantes organizações ambientais, representantes corporativos engajados e diversas autoridades da Amazônia venham publicamente se opor á posição do governo.”



Contudo o comprometimento do Brasil em reduzir o desflorestamento é monumental com credibilidade nacional e somas substanciais de dinheiro ligadas ao projeto.



A Indústria é agora a maior condutora do desflorestamento, maior do que as atividades de subsistência.

Stephan Schwartzman, co-diretor do Programa Internacional do Fundo de Defesa Ambiental que ajudou o conceito pioneiro das bases nacionais (essencialmente emissões) para o REDD sob uma estrutura climática, diz que é importante colocar em contexto os desafios do Brasil.



“A razão pela qual Lula estava disposto a ficar de pé em frente á comunidade internacional e se comprometer a reduzir o desmatamento nacional do Brasil em 70 por cento na próxima década é que ele acredita mesmo que o Brasil pode reduzir sua taxa de desflorestamento. Ele e o Ministro do Meio Ambiente Carlos Minc têm motivos reais para crer nisso. O governo criou uma área de novas áreas protegidas do tamanho da França em cinco anos, entre 2003 e 2008, bem no meio da fronteira de expansão agrícola—não nas regiões de fim do mundo onde ninguém se importa com a terra.”



“O Fundo Amazônico é um passo importante e inovador. É a primeira vez que um grande país tropical estabelece esse tipo de mecanismo para tentar criar meios para compensar uma rede toda de atores que terão de beneficiar o mecanismo se um programa de nível nacional para reduzir o desflorestamento for estabelecido. Eu acho que podemos esperar um projeto onde não haverá falhas. Se você olhar para a situação de uma perspectiva histórica – tem havido muitas fronteiras agrícolas no curso da história deste planeta. Todo o Oeste Europeu foi um dia uma floresta. Todo o leste dos Estados Unidos foi floresta nativa um dia. Nunca houve um exemplo de iniciativa de uma nação para regular e controlar os efeitos ecológicos e ambientais da expansão da fronteira. Este é um território novo—não tem receita pronta para isto. As pessoas que estão preocupadas com o Fundo Amazônico precisam ajudá-lo a cumprir o que ele promete.”



Desde 2003 o Brasil estabeleceu 523.592 quilômetros quadrados de áreas protegidas, sendo responsável por 74 por cento do total de terra protegida do mundo durante o período.

Ainda assim, dentro do Brasil não há nenhum debate em vigor sobre a proposta, especialmente entre o governo federal e os governos dos estados. O estado do Amazonas—abrigo para mais de 1.57 milhões de quilômetros quadrados de floresta úmida, uma área maior que a Mongólia ou estado do Alaska—está bem á frente do resto do Brasil quando se trata do desenvolvimento de projetos de carbono e o estado quer ser pago diretamente, via mecanismos de mercado, por seu esforço. O estado do Amazonas teme que o dinheiro dirigido ao governo central em Brasília seja desviado pela burocracia, reduzindo a viabilidade dos programas inovadores de financiamento de carbono. Estes projetos estão consagrados no Projeto da Reserva Juma de Desenvolvimento Sustentável e pagamentos da Bolsa Floresta para os serviços da iniciativa do ecossistema, que compensam as populações rurais para usar a sustentabilidade das florestas. Juma, o primeiro projeto de carbono florestal no mundo a se ater ao Padrão Ouro da Aliança do Clima, Comunidade e Biodiversidade (um padrão de certificação) para sua salvaguarda, está pagando a 6.000 famílias que voluntariamente concordam a limitar o desmatamento da floresta. O projeto elevou a renda per capita em 30 por cento entre os membros e é esperado reduzir emissões numa área florestal, que poderia de outra forma ser desflorestada em 190 milhões de toneladas de dióxido de carbono até 2050.



Floresta Úmida e soja na Amazônia Brasileira

Virgilio Viana, Secretário de Meio Ambiente do Amazonas que ajudou a projetar e implementar o programa Bolsa Floresta, argumenta que as abordagens em nível de projeto ou sub-nacional são atualmente mais apropriadas para a compensação do mercado direto do que um fundo nacional. Por exemplo, a Bolsa Floresta e Juma tem recebidos financiamento do setor privado: Bradesco, um banco Brasileiro; a cadeia de hotéis Marriott, que solicita contribuições dos hóspedes; e outras empresas. Viana acredita que diferentemente dos outros estados, os projetos do Estado do Amazonas estão prontos para os mecanismos do Mercado agora.



Essas preocupações em nível de projeto versus nível nacional são compartilhadas entre comunidades indígenas que estão explorando as possibilidades do REDD. Os grupos indígenas estão também preocupados que devido ao fato de eles terem historicamente servido como guardiões das florestas—as taxas de desflorestamento nos territórios indígenas são mais baixas do que nos parques e áreas não protegidas—eles não sejam qualificados para os pagamentos do REDD, que recompensam as atividades que reduzem o relativo desmatamento florestal á uma base do desflorestamento passado.



“O REDD deveria chegar ao reconhecimento de que os povos indígenas tem mantido o estado de suas florestas, e não penalizá-los por esta administração,” disse Vasco van Roosmalen, diretor da Equipe Brasil de Conservação da Amazônia, uma ONG que tem ajudado a tribo a desenvolver um projeto de carbono no estado do Acre.



As taxas de desflorestamento tropical de 2000-2005, elencadas em ordem descendente pela mais alta quantidade de perda anual florestal para 25 países baseados nas informações da Organização de Alimentos e Agricultura das Nações Unidas (FAO). Clique para aumentar

Os direitos á terra são uma questão. Enquanto vastas áreas têm sido demarcadas para uso indígena, esses grupos não têm titulo legal da terra, que ainda pertence ao governo. Mas uma recente analise da lei Brasileira e precedente legal por Baker McKenzie concluiu que os povos indígenas tem direitos aos pagamentos do carbono florestal em seus territórios, abrindo as portas para os projetos indígenas de carbono. Alguns temem que o prospecto dos pagamentos de carbono aumentará a especulação de terra, levando a maiores conflitos na floresta.



Paulo Moutinho, um especialista em política florestal do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), uma ONG Brasileira, diz que estruturar o Fundo da Amazônia sob os corretos princípios que garantem a igual distribuição de benefícios entre os mais importantes acionistas será a chave para identificar algumas dessas preocupações e tornar o Fundo um meio efetivo para a redução do desflorestamento.



“Ha muitos desafios envolvendo o Fundo, mas ele foi construído com uma grande participação da sociedade Brasileira,” Moutinho contou a mongabay. “Cada setor desta sociedade agora está representada pelo comitê organizacional do Fundo.”



Moutinho ainda acredita que o Fundo precisará estar aberto para algumas formas de Mercado de carbono para ser efetivo.



Consensus building


O estado do Amazonas parece estar se acostumando com a idéia de que precisam deixar de lado as diferenças para formar um consenso sobre como implementar e financiar atividades para reduzir o desflorestamento. Em Abril, governadores dos maiores estados da Amazônia assinaram a Declaração Cuiabá, que os compromete com a formação de um consenso até a conferência climática em Copenhagen. Os estados têm uma posição de força—juntos eles são responsáveis por mais de um terço do desflorestamento tropical.



Mas enquanto o Brasil apresentará uma frente unificada em Copenhagen, é improvável que sua insistência em um mecanismo somente baseado em financiamento seja estabelecido sobre o nada. O país esta bem consciente de que um sistema baseado no Mercado pode ser a forma mais lucrativa para ele capitalizar o valor potencial de seus vastos recursos naturais incluindo carbono florestal, água e biodiversidade. Consultancy McKinsey & Co. estima que sob um cenário relativamente conservador o Brasil pode angariar 30 bilhões por ano em pagamentos por serviços do ecossistema até 2030 tornando-se a “Arábia Saudita dos serviços de ecossistemas.”


Exit mobile version