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Uma entrevista com Amasina, uma shaman na floresta tropical Amazônica

Uma entrevista com Amasina, uma shaman na floresta tropical Amazônica

Uma entrevista com Amasina, uma shaman na floresta tropical Amazônica
Rhett A. Butler, mongabay.com

Traduzido por Rafael Perecin Foltram
6 de Agosto, 2008





Mergulhado na floresta tropical do Suriname, um grupo de conservação inovador está trabalhando com tribos indígenas para proteger a floresta da onde vieram e sua cultura usando o conhecimento tradicional combinado com tecnologia de ponta.

O Amazon Conservation Team (ACT) fez uma parceria com o Trio, um grupo de índios americanos que vivem na isolada área de fronteira do Suriname com o Brasil na América do Sul, para desenvolver programas para proteger sua floresta de mineradores de ouro ilegais e invasores, melhorou a vida do vilarejo e reforçou os laços culturais entre os indígenas jovens e os velhos em um tempo onde tais culturas estão desaparecendo mais rapidamente do que as florestas tropicais.


Guardas florestais indígenas em Kwamalasamutu.

O ACT está fornecendo para o Trio equipamentos e treinamento para que os “guardas florestais indígenas” possam mapear — e assim um dia ganhar o título da área — suas terras natais. O Trio agora usa GPS para documentar as características geográficas e a localização dos locais de caça, lugares de importância espiritual, e locais ricos em plantas medicinais e outros recursos importantes. A chave para o processo é fazer uma ponte entre as gerações indígenas mais velhas e os jovens mapeadores: os shamans proporcionam aos jovens informações culturais e históricas necessárias para adicionar detalhes críticos para os mapas. Além de mapear, os guardas do parque indígenas patrulham as áreas florestais procurando por atividades ilegais, incluindo mineração e coleta de animais selvagens para a comercialização dos mesmos.

O ACT também está promovendo a transferência de conhecimento étnico-botânico para as crianças do Trio através do “Programa de Shaman’s Aprendizes” onde as crianças em idade escolar aprendem os usos tradicionais de plantas medicinais. O programa é combinado com uma clínica de saúde indígena que opera com técnicas convencionais de saúde. Ambos oferecem os serviços gratuitamente para os moradores do vilarejo.


Jonathan, chefe do programa de guardas florestais indígenas de Kwamalasamutu em patrulha na floresta tropical Amazônica.rainforest.

Uma parte crítica desses programas são os shamans do vilarejo, homens e mulheres que são como reservatórios de um imenso conhecimento biológico de um povo que sobreviveu na floresta tropical Amazônica por gerações. Ninguém entende os segredos dessas plantas melhor do que os shamans indígenas, mas como a floresta em si, esse conhecimento floral incalculável está desaparecendo em rápida velocidade devido ao desmatamento e uma profunda transformação cultural nas gerações mais novas. A perda desse conhecimento e o desflorestamento sem volta diminuem muito a diversidade cultural e biológica do mundo.

Em junho de 2008, mongabay.com visitou a comunidade de Kwamalasamutu no Suriname para ver os programas do ACT em ação. Durante a visita, Amasina, uma shaman Trio que trabalha com o ACT, respondeu algumas questões sobre seu papel como uma “curandeira” tradicional do vilarejo. Ele também notou, inesperadamente, acontecimentos estranhos com o clima, sugerindo que ou a mudança climática ou o desmatamento da região está afetando as condições locais.

A entrevista foi conduzida com a ajuda de um tradutor, então as respostas de Amasina estão abreviadas.

Mongabay: Como você aprendeu sobre plantas medicinais?

Amasina: Com minha mãe e meu pai.

Mongabay: Você está passando seu conhecimento para a próxima geração?


Amasina

Amasina: Sim, através do programa de shamans aprendizes do Amazon Conservation Team. Eu ensino as crianças como preparar remédios e usar plantas curadoras.

Mongabay: Como você escolhe os aprendizes?

Amasina: Isso é baseado na confiança. Eu olho para o relacionamento entre a pessoa e seus pais e se eles se dão bem com a comunidade. Eu tenho dois aprendizes no programa e eu estou também ensinando meu filho. Eu também trabalho na clínica por cerca de cinco horas diárias e outros alunos aprendem de mim lá também.

Mongabay: Você vê doenças diferentes entre os locais e os estrangeiros?

Amasina: Os locais normalmente precisam de tratamento para gripe, doenças cutâneas, ferimentos e diabetes. Estrangeiros necessitam mais de tratamento para as muitaas mazelas que não são curáveis pela medicina ocidental, como estresse e insônia.

Mongabay: O que você achou do encontro entre os shamans “médicos” da Colômbia, Brasil, Suriname e de outras partes do mundo? Você aprendeu de suas técnicas?

Amasina: Foi interessante conhecer shamans de outros lugares. Apesar de não falarmos a mesma língua, eu aprendi um tratamento com folhas para curar doenças de uma pessoa. E eu ensinei a eles um pouco da minha medicina também.

Mongabay: Você já usou plantas para ajudar você a “ver” como tratar uma pessoa?


Amasina

Amasina: Meu pai e eu usamos uma “planta de visão” muito tempo atrás, mas agora eu dependo primariamente nos olhos. Eu olho nos olhos de uma pessoa para ver sua doença e eu também uso o tato.

Mangabay: É evidente que houveram muitas enchentes aqui recentemente. Isso é normal?

Amasina: Enchentes acontecem de tempos em tempos, mas me parece que as águas estão subindo mais alto agora do que no passado. As chuvas sempre foram muito previsíveis, mas agora o sistema está bagunçado. Nós temos chuvas caindo durante o tempo errado do ano. Essas chuvas recentes causaram muitos danos na colheita de mandioca. O clima parece estar mudando e está nos afetando.

O Trio

O Trio (ou Tirivó) é um grupo indígena de língua caribenha que vive na floresta no sul do Suriname e nas áreas de fronteira com o Brasil.





Kwamalasamutu (“Kwamala”)

Encorajados por missionários cristãos e pelo governo a estabelecer em vilarejos nos anos 1960, o Trio hoje se encontra em pequenos a médios vilarejos, chefiados por um “cacique” ou chefe. Por causa de não haverem muitas estradas nas remotas áreas em que a maioria dos Trio vivem, o transporte aéreo é o único acesso do mundo exterior, mas apenas alguns Trio já estiveram em um avião — eles normalmente viajam de canoas.

O Trio baseia-se no cultiva em baixa escala de mandioca como sua principal fonte de alimentos. Esse alimento basicamente de amido é complementado com peixe e animais caçados nas florestas e rios da região. A floresta fornece a eles outros importantes recursos, além de plantas medicinais, materiais de construção, tintas e resinas.

Enquanto os missionários inicialmente baniram muitas práticas tradicionais incluindo o uso dos shamans das plantas, alguns Trio descobriram o uso de plantas medicinais e os shamans estão cada vez mais sendo vistos como provedores dos tratamentos de muitas mazelas.





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